IV CATC: Painel Debate Transição Energética e Exploração de Petróleo na Amazônia

O segundo painel desta sexta-feira (24), último dia do IV Congresso Ambiental dos Tribunais de Contas (CATC), foi palco de um debate central sobre o futuro energético e ambiental do país. Com o tema “Transição Energética e Exploração de Petróleo e Gás Natural na Região Amazônica”, o painel teve moderação do vice-presidente do Tribunal de Contas de Roraima (TCE-RR) e coordenador do evento, Bismarck Dias, que abriu o painel definindo a importância estratégica da discussão.

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Azevedo destacou que o debate não era casual, mas um momento decisivo com possível repercussão global. “A solução que eventualmente o Brasil encontrar vai servir de paradigma e referência para todo mundo (…) É um ecossistema, tão sensível e tão importante. Se o Brasil (…) encontrar aquele meio termo de se chegar à sustentabilidade (…) o resto é muito mais fácil”, afirmou o moderador.

Foi nesse cenário de alta complexidade, definido pelo conselheiro como uma busca pelo “motor central” do congresso — a sustentabilidade —, que o painel se desenvolveu.

A Visão Crítica da Governança

Ruy Marcelo Alencar Mendonça, procurador do Ministério Público de Contas junto ao Tribunal de Contas do Estado do Amazonas (MPC-AM), começou destacando a gravidade e a oportunidade do debate.

Para o procurador, o desafio principal está no “trilema” do setor: a dificuldade em equilibrar segurança energética, sustentabilidade socioambiental e climática, e acesso justo à energia. “Ou seja, três tipos de valores que precisam ser equilibrados […] na formulação e implementação da política pública energética e de transição energética”.

Ruy Mendonça lembrou a fala do Professor Carlos Nobre no dia anterior, que alertou para a gravidade da situação atual. Nobre afirmou que “o planeta vive uma sepse, uma infecção generalizada, porque dezenas de grandes ecossistemas estão dando sinais claros de ponto de não retorno, de colapso”. O procurador reforçou a urgência em encontrar um caminho sustentável.

No entanto, Mendonça apontou falhas graves que atualmente impedem esse equilíbrio, baseando-se em uma recente auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) (Acórdão 2470/2024), que, segundo ele, apontou uma “baixa maturidade” e “governança deficiente” na política de transição energética brasileira. “Não temos formalizado um plano nacional de transição energética”, criticou.

Ele mencionou problemas como a falta de consulta prévia, livre e informada aos povos indígenas e comunidades tradicionais afetadas pela exploração na Foz do Amazonas (Bloco 59). Essa consulta é exigida pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Apontou também a sobrecarga e pressão sobre órgãos licenciadores como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), resultado da falta de uma política energética nacional clara. Mendonça citou ainda problemas no licenciamento do Bloco 59, como fragilidades no plano de emergência e falta de análise adequada dos impactos climáticos e riscos do projeto

Ao final, Mendonça propôs soluções para construir a sustentabilidade de forma legítima: “Fortalecimento do planejamento, da governança, a criação de uma autoridade central para essa política” e a ativação de um “fórum nacional que é para discutir transição energética”, garantindo a participação social na busca por esse consenso.

Adição Energética

Em seguida, a diretora executiva de Exploração e Produção Ambiental da Petrobras, Sylvia dos Anjos, defendeu a estratégia da empresa. Ela contestou o termo “transição”, preferindo “adição energética”. “Eu não acredito em transição energética. Eu acredito em adição energética. Porque o mundo precisa de energia”, declarou.

Buscando consenso por meio da tecnologia, ela argumentou que a Petrobras já produz “o petróleo de menor emissão de carbono do mundo”. Definiu o “duplo desafio” da estatal: “produzir o óleo e gás que o país precisa, de forma sustentável”, e, ao mesmo tempo, “investir em novas energias”. “Nós não vamos deixar de produzir óleo e gás para produzir energia renovável”, afirmou.

A diretora detalhou a recente operação de licenciamento e início da perfuração do poço Morpho, na Margem Equatorial. O poço está localizado a 175 km da costa do Amapá e a 500 km da foz do Rio Amazonas. Ela explicou a complexidade geológica, os desafios da perfuração e as medidas rigorosas de segurança e resposta a emergências implementadas, que foram além das exigências comuns. Essas medidas incluíram sonda de 7ª geração, mais de 200 análises de risco, monitoramento contínuo, 12 embarcações de prontidão e dois centros de atendimento de fauna (Oiapoque/AP e Belém/PA), exigidos pelo IBAMA.

Sylvia dos Anjos enfatizou que a experiência da indústria de petróleo é essencial para o futuro sustentável. Argumentou que o conhecimento técnico para “zerar as emissões” com captura de carbono (CCUS – sigla em inglês para Captura, Utilização e Armazenamento de Carbono) ou para explorar novas fontes (hidrogênio natural, geotermia) pertence, em grande parte, à indústria de óleo e gás. “A indústria de óleo e gás é a que tem maior experiência” para isso, disse.

O Potencial Geológico de Roraima

Encerrando as apresentações, o geólogo Vladimir de Souza, doutor em geociências e professor da Universidade Federal de Roraima (UFRR), focou no potencial da Bacia do Tacutu, em Roraima, e na dependência da sociedade moderna pelo petróleo.

Ele iniciou “destruindo castelos” sobre o hidrocarboneto (componente do petróleo e gás) , lembrando sua presença em produtos como adubos, plásticos e batons. “Hoje o mundo não vive sem petróleo”, afirmou.

O professor detalhou a geologia da Bacia do Tacutu, localizada sob Boa Vista. Explicou sua formação há mais de 150 milhões de anos por rifteamento (separação continental) e sua conexão com bacias vizinhas na Guiana e Suriname, que possuem reservas bilionárias.

Souza revelou que pesquisas da UFRR, mesmo com poucos recursos, identificaram rochas geradoras (folhelhos negros) com teor de carbono orgânico (TOC) “extremamente alto”, quase 14%. A média brasileira é de 1,5% a 2,5%. Ele mencionou a colaboração da Petrobras na revisão da carta estratigráfica (mapa das camadas de rocha) da bacia.

O professor também criticou a falta de investimento em pesquisa no Brasil, especialmente no Norte. Defendeu o Projeto de Lei (PL) nº 5066/2023, proposto na UFRR, para destinar parte dos lucros do petróleo a fundos de pesquisa regionais. “O que falta é pesquisa”, concluiu.

Ao final, respondendo a uma pergunta sobre Terras Raras, Souza confirmou o alto potencial de Roraima. Já foram identificados 11 elementos em alta concentração, além de minerais estratégicos relacionados, como cromo e vanádio.

IV CATC

O IV CATC aconteceu de 22 a 24 de outubro no Centro Amazônico de Fronteiras da Universidade Federal de Roraima (CAF/UFRR), em Boa Vista (RR). A edição deste ano teve como tema “Governança Climática e Justiça Socioambiental: o papel do Setor Público e dos Tribunais de Contas na construção da sustentabilidade”.

O evento foi realizado pela Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon), Tribunal de Contas de Roraima (TCE-RR) e Instituto Rui Barbosa (IRB), em parceria com o Governo do Estado de Roraima e com a Universidade Federal de Roraima (UFRR) e teve patrocínio da Eneva e apoio institucional do Conselho Nacional de Presidentes dos Tribunais de Contas, da Associação Brasileira dos Tribunais de Contas dos Municípios (Abracom), da Associação Nacional dos Ministros e Conselheiros Substitutos dos Tribunais de Contas (Audicon), do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), da Defensoria Pública do Estado de Roraima (DPE-RR), do Ministério Público de Contas de Roraima (MPC-RR), do Ministério Público do Estado de Roraima (MPRR) e da Assembleia Legislativa do Estado de Roraima (ALE-RR). Esta quarta edição do congresso teve como mídia parceira a Fundação Rede Amazônica e a CBN Amazônia, e contou com o apoio da Econorte e da BRS.

Texto: Penélope Buffi (MPC/RR)
Foto: Marcelo Mora (TCE-RR)
Edição: Vinicius Appel (Atricon)