Inaldo da Paixão
Enquanto penso na escrita, observo a área verde que circunda o Tribunal de Contas do Estado da Bahia (TCE/BA), um santuário que resiste à força da grana que destrói coisas belas. Ali, entre o Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (INEMA) e a Companhia Baiana de Produção Mineral (CBPM), a natureza insiste em resistir e nos lembrar que, mesmo cercada de concreto, ainda pulsa a vida. Recordo-me da frase “verde que te quero verde”, que é a abertura de um famoso poema do poeta espanhol García Lorca, popularizada no Brasil na canção “Verde”, gravada por Fagner.
Gosto dessa mata. Sinto-me responsável por ela. Tão perto e, ao mesmo tempo, tão longe. Diante dessa paisagem, brota a reflexão que me guia neste momento: tudo tem um porquê e tudo está em nossas mãos.
Essas duas ideias são o alicerce do Projeto Sala Verde TCE/BA, que une propósito, conhecimento e atitude em favor da sustentabilidade e da educação ambiental. “Tudo tem um porquê” porque nada acontece por acaso. Cada gesto humano, por menor que pareça, repercute no equilíbrio do planeta. É o que nos ensina a “Teoria do Efeito Borboleta”: um pequeno movimento aqui pode desencadear transformações imensas em outro lugar.
Economizar água, evitar o desperdício, plantar uma árvore, separar resíduos ou influenciar uma política pública — tudo são gestos que constroem o amanhã. Pequenas ações multiplicadas se tornam correntes de mudança. Assim, o enfrentamento dos desafios ambientais nos torna mais atentos, solidários e conscientes do nosso papel coletivo: garantir um futuro sustentável para as gerações presentes e futuras.
Esse dever é mais que moral: é constitucional. O artigo 225 da Constituição Federal de 1988 é um marco civilizatório ao proclamar que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e que o poder público e a coletividade devem defendê-lo e preservá-lo. É nesse espírito que o TCE/BA concebeu sua Sala Verde — como um espaço de educação e inspiração, onde servidores e colaboradores possam repensar práticas, rever hábitos e aprender a cuidar do planeta, começando pelo próprio ambiente de trabalho.
Mas compreender o “porquê” não basta. É preciso agir. Por isso a segunda afirmação — tudo está em nossas mãos — ganha força e sentido. Inspirada no vídeo “Da Terra que Gesta à Terra que Pede Cuidado”, essa ideia representa a passagem de um planeta que generosamente nos ofereceu vida para um planeta que clama por proteção. O tempo da indiferença acabou.
Está em nossas mãos o poder de decidir, transformar rotinas, inspirar colegas e tornar o serviço público um exemplo de responsabilidade socioambiental. Está na mão de quem assina uma resolução ou desliga uma luz; de quem planeja uma ação educativa ou entrega uma pilha para descarte correto. São gestos simples, mas potentes, que traduzem o compromisso do TCE/BA com uma nova cultura institucional.
A Sala Verde TCE/BA faz parte do Programa Nacional de Educação Ambiental – Salas Verdes, restituído pela Portaria GM/MMA nº 524, de 15/6/2023, que reconhece esses espaços como núcleos de formação, diálogo e mobilização social. Criado em 2000, o Projeto Salas Verdes atende instituições que buscam o apoio do Ministério do Meio Ambiente (MMA), e incluindo publicações para subsidiar ações educativas.
Hoje, as Salas Verdes se consolidam como instrumentos de cidadania ambiental. São laboratórios vivos de boas práticas, pontes entre o conhecimento técnico e o engajamento comunitário. O TCE/BA é o segundo Tribunal de Contas do país a ser certificado pelo MMA, sucedendo o TCE/RN — um reconhecimento que reforça a dimensão pedagógica e exemplar do controle externo.
A Sala Verde do TCE/BA, inaugurada em 16/10/2025, nasce com a vocação de ser mais do que uma estrutura física. Ela é um símbolo de compromisso, um lugar de encontro e de esperança. No dia de sua inauguração, a doação de mudas e o bota-fora de eletroeletrônicos — em parceria com a COOPERBARI, cooperativa de recicladores do Ogunjá — mostraram que é possível unir consciência ambiental, inclusão social e cidadania.
Cada muda plantada naquele dia carregava um gesto de fé no futuro. Cada aparelho recolhido simbolizava o desapego a velhas práticas e a adesão a um novo modo de agir. Brotas, o bairro da cooperativa, nome que evoca para mim águas e raízes, pareceu ressoar como uma metáfora do que a Sala Verde representa: um espaço de semeadura e renascimento.
O projeto ecoa também o que preceitua a Política Nacional de Educação Ambiental (Lei nº 9.795/1999), cujo art. 13 determina que o Poder Público deve incentivar a difusão de campanhas educativas e de informações ambientais. Ao criar sua Sala Verde, o TCE/BA cumpre esse dever e amplia seu papel educativo, reafirmando que fiscalizar é também educar e inspirar.
Segundo dados do MMA, até 2025 o Brasil conta com 283 Salas Verdes certificadas, sendo 91 no Nordeste e oito na Bahia — um sinal de que o movimento se expande e a consciência ambiental ganha corpo. Essa rede nacional é feita de instituições que acreditam na transformação pelo exemplo, no poder das pequenas atitudes e na força das mãos coletivas.
O Projeto Sala Verde TCE/BA é, assim, uma ponte entre o pensar e o fazer. Ele nos convida a olhar o futuro com esperança, mas também com a consciência de que pensar no futuro é agir no presente. Da Terra que gesta à Terra que pede cuidado, a jornada é feita por mãos que pensam, sentem e transformam. Que essa Sala inspire “verdejantes tempos”. Frase que tomo por empréstimo da canção “Verde”, de autoria de Eduardo Gudin e J.C. Costa Netto, lançada por Leila Pinheiro no Festival dos Festivais da Rede Globo, em 1985.
Cada assinatura, cada resolução, cada gesto cotidiano reflete o poder que temos de fazer a diferença. Que nossas mãos — firmes e solidárias — continuem a cultivar o presente com a serenidade de quem planta árvores sem a pretensão de nas suas sombras se abrigar um dia, mas na esperança de poder transformar o futuro. Esse é o verdadeiro sentido do servir público: construir, passo a passo, um amanhã mais sustentável, justo e humano.
Porque tudo tem um porquê. E tudo, sem dúvida, está em nossas mãos.
Inaldo da Paixão é conselheiro do TCE-BA e presidente eleito do Instituto Rui Barbosa (IRB)