USP e TCM-SP: Manual propõe uma postura proativa para os TCs diante das mudanças climáticas

Com o lançamento do manual “Mudanças Climáticas e o Papel dos Tribunais de Contas: Desafios e Oportunidades”, produzido pelo Instituto de Estudos Avançados (IEA) da Universidade de São Paulo (USP) em parceria com o Tribunal de Contas do Município de São Paulo (TCM-SP), a Universidade inicia o diálogo com técnicos dos tribunais de contas (TCs) do Brasil e com a sociedade em geral sobre a importância adicional que esses órgãos de fiscalização dos gastos públicos adquiriram diante da necessidade de adaptação às mudanças climáticas.

O trabalho é baseado nas exposições e debates ocorridos no seminário “Mudanças Climáticas e o Papel dos Tribunais de Contas”, realização do IEA e do TCMSP, com apoio da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon) e do Instituto Rui Barbosa (IRB). Além de versão digital disponível gratuitamente a todos os interessados no site do IEA, há também uma edição impressa (mil exemplares) de distribuição dirigida.

O manual apresenta de forma acessível o que são as mudanças climáticas, seus efeitos sobre as cidades e como os TCs podem atuar de maneira preventiva, proativa e inovadora para garantir que os recursos públicos sejam aplicados de forma eficiente e eficaz diante do desafio climático global.

A discussão realizada no seminário e agora sumarizada no manual trouxe à tona a necessidade de uma visão proativa dos TCs, levando-os a participar inclusive do dimensionamento dos orçamentos públicos ainda no planejamento, de forma a alinhar as ações de governo, do ponto de vista orçamentário, ao que vem acontecendo no clima do planeta, afirmam em texto introdutório a professora Roseli de Deus Lopes e o professor Marcos Buckeridge, diretora e vice-diretor do IEA, respectivamente.

Controle Proativo

O presidente do TCM-SP, conselheiro Domingos Dissei, ressalta em sua nota introdutória que o enfrentamento dos desafios climáticos exige articulação, conhecimento especializado e ação coordenada: “Auditorias ambientais, definição de metas, capacitação de gestores e parcerias com universidades são recomendações práticas, reforçando o papel dos TCs como agentes de transformação”.

O manual explica que os custos econômicos das mudanças climáticas podem ser divididos em custos diretos e indiretos. Os diretos incluem reconstrução de estradas, pontes, prédios públicos e redes (elétricas e hidráulicas) danificadas por enchentes, deslizamentos e ventanias. Os indiretos englobam queda na produtividade econômica, prejuízos ao turismo, aumento de doenças respiratórias e infecciosas, elevação dos preços, deslocamentos forçados e perda de arrecadação.

“Esses impactos afetam diretamente os orçamentos municipais e estaduais, comprometendo outras áreas, como saúde e educação”, alerta o manual. Levantamento de 2024 da Confederação Nacional dos Municípios indicou que secas, estiagens e excessos de chuva causaram um prejuízo de R$ 401,3 bilhões às cidades brasileiras ao longo de 12 anos, registra o trabalho.

Situações de emergência exigem liberações orçamentárias rápidas, obras e contratações emergenciais. “Tudo isso precisa ser fiscalizado para evitar desperdícios e corrupção, mas também para garantir celeridade, efetividade e prevenção”, destaca o texto.

Diante disso, cabe aos TCs, por exemplo, fiscalizar como estados e municípios usam verbas emergenciais em desastres climáticos, verificar se as obras públicas consideram critérios de adaptação climáticas e segurança e a avaliar a implementação de planos de mitigação e adaptação, cobrando metas e resultados.

Desmoronamento em área de risco

Com esse fim, o manual recomenda uma mudança de postura dos TCs: passar do controle reativo ao controle proativo. Historicamente, os tribunais de conta sempre atuaram de forma reativa, fiscalizando gastos após a execução. Agora, diante da crise climática, é cada vez mais necessário atuar preventivamente, identificando riscos antes que se transformem em prejuízos, alerta o documento.

Exemplos dessa atuação preventiva são o monitoramento de obras de drenagem urbana antes da estação das chuvas, avalição de políticas de habitação em áreas de riscos e análise de planos de contingência municipais.

Os autores do documento apontam as auditorias temáticas como uma das ferramentas mais poderosas dos TCs. Elas permitem avaliar se um município tem plano da adaptação climática, se há mapeamento atualizado de áreas de risco e se os investimentos em infraestrutura estão adequados aos cenários futuros.

Outro procedimento crucial é exigir indicadores claros, que indiquem, por exemplo, percentual de áreas urbanas cobertas por sistemas de drenagem, taxa de execução de obras de contenção e número de famílias retiradas de áreas de risco e reassentadas. Além disso, o manual propõe que os TCs promovam ações de capacitação e orientação técnica de gestores públicos sobre ferramentas e soluções para lidar com riscos climáticos, fortalecendo a capacidade dos municípios de planejar e agir.

A parceria com universidades e outras instituições de pesquisa é fundamental em razão da complexidade dos desafios climáticos, cujo enfrentamento exige conhecimento técnico avançado. Essa colaboração pode propiciar, entre outras coisas, o uso de dados climáticos e geoespaciais, o desenvolvimento de metodologias conjuntas de auditoria ambiental, treinamentos e capacitações em análise de risco climático, e a criação de observatórios regionais com informações integradas para subsidiar decisões.

Um exemplo de resultado prático é permitir que um TC identifique as áreas de um município mais vulneráveis a enchentes, passando a priorizar auditorias e fiscalizações nesses locais.

A transformação institucional exigida pela crise climática demanda a adoção de novas ferramentas e práticas pelos TCs, afirma o documento. Algumas dessas possíveis iniciativas são a criação de plataformas digitais interativas com dados climáticos, orçamentários e de obras públicas, o uso de inteligência artificial e sensoriamento remoto para monitorar áreas de risco em tempo real, a criação de núcleos especializados em mudanças climáticas dentro dos tribunais e o estabelecimento de parceria com organizações da sociedade civil para ampliar a transparência e o controle social.

Com informações da Assessoria de Comunicação do IEA