João Antonio da Silva Filho
Os tempos estão mudando em acelerada dinâmica. Os humanos correm atrás para tentar não ficar pelo caminho. Quero dizer: a ganância do capital destrói a natureza em busca de lucro fácil, tudo isso acompanhado de uma revolução tecnológica que vem globalizando o mercado, a moeda, os costumes e as profissões. A lógica do capital se sobrepõe à lógica da vida, e os impactos são sentidos em todos os cantos do planeta — do campo às grandes cidades, dos polos industriais às aldeias mais remotas. Essa dinâmica impõe aos viventes do planeta uma inesperada realidade que derrete as expectativas e afeta qualquer planejamento de médio prazo. O amanhã tornou-se um território nebuloso, onde o presente é vivido como urgência e o futuro como ameaça.
A atual revolução tecnológica, com sua velocidade estonteante, não traz garantias nem sequer para os donos do capital. A inteligência artificial, a automação e o big data abrem horizontes de possibilidades, mas também colocam em xeque modelos de negócios, profissões consolidadas e relações sociais historicamente construídas. Vivemos um momento de potencialização do individualismo, em que o “eu” se sobrepõe ao “nós”, e a coletividade cede espaço à performance pessoal. As redes sociais, com seus algoritmos moldados para reforçar bolhas de afinidade, acentuam essa fragmentação. O que deveria conectar, frequentemente separa.
Nas interações cotidianas, o contraste é evidente. É comum presenciarmos em restaurantes, praças, transportes públicos ou até mesmo dentro de casa, famílias inteiras imersas em suas telas, conectadas ao mundo, mas desconectadas entre si. A presença física perdeu lugar para a presença virtual. A palavra dita foi substituída pela mensagem digitada. A escuta foi trocada por reações rápidas. A impessoalidade passou a ser a nova zona de conforto. Nas redes, somos corajosos para atacar, opinar e julgar, mas no olho no olho, muitas vezes, impera o silêncio. A tecnologia, que poderia ser uma ponte, tornou-se um muro invisível que nos separa em nome da praticidade, da eficiência e da conveniência.
Essa globalização da indiferença, onde a dor do outro parece não comover mais, é uma das faces mais perversas do nosso tempo. A solidariedade cede espaço à competitividade, e o cuidado ao outro é engolido pela pressa. Estamos todos conectados, mas cada vez mais sós.
Em uma época em que a comunicação — muitas vezes desprovida de ética — se propaga em velocidade vertiginosa, assistimos à aliança entre subjetividade e individualismo aprofundar o abismo entre as pessoas. A indiferença, impulsionada pela lógica da competição e pelo culto ao imediatismo, se espalha de forma sutil, porém alarmante. Diante desse cenário, torna-se imperativo traçar novos caminhos para a humanidade. Atitudes conservadoras, que apenas retardam as transformações necessárias, já não servem ao tempo presente. A vida exige coragem. Não há mais espaço para pactuar com o atraso. A revolução tecnológica em curso precisa ser moldada com responsabilidade, para que se torne uma ferramenta a serviço da dignidade humana e do bem comum.
João Antonio da Silva Filho é conselheiro do Tribunal de Contas do Município de São Paulo e vice-presidente de Defesa de Direitos e Prerrogativas e Assuntos Corporativos da Atricon