A Travessia Pioneira: quase 30 anos de uma visão global para o TCE-TO

José Wagner Praxedes

Em 1996, há quase três décadas, o Tribunal de Contas do Tocantins (TCETO) era uma instituição ainda jovem, forjando seus primeiros passos em um cenário nacional. Sentia-se, contudo, a urgência de olhar para além das fronteiras, buscando um horizonte de excelência que só poderia ser alcançado pelo intercâmbio com as mais respeitadas cortes de contas do mundo.

Foi com esse espírito audacioso que, na época como presidente, e hoje conselheiro decano, me lancei em uma missão pioneira diplomática, cruzando o vasto Oceano Atlântico. Ao meu lado, o então procurador-geral de contas, Aparício José Ramos Varanda, compartilhava o peso e a honra dessa jornada. Não procurávamos apenas acordos, buscávamos uma visão global para uma instituição local.

A Formalização de Laços Históricos e Técnicos

Lembro-me claramente de quando, ao assumir a primeira Presidência do Tribunal de Contas do Tocantins, em 1995, em um congresso internacional em Ouro Preto (MG), fiz uma amizade providencial com o então presidente do Tribunal de Contas de Portugal, Alfredo José de Sousa, e o então diretor-geral, conselheiro José Tavares. Ali, firmamos um laço que me trouxe insights valiosíssimos.

Eles não apenas me abriram as portas para essa grandiosa viagem, mas também articularam e facilitaram as visitas às demais cortes congêneres. Nossa primeira e fundamental parada foi em Portugal, nação com a qual o Brasil mantém laços histórico-culturais e o idioma em comum, facilitando a cooperação. Sabíamos que a complexidade crescente das funções de controle exigia um aperfeiçoamento contínuo, e a troca de experiências se tornava vital.

Em um auditório lotado em Lisboa, formalizamos o Acordo de Cooperação Científica e Técnica com a Corte de Contas portuguesa. Foi um momento solene, onde, além de mim e Varanda, firmaram o termo o presidente Alfredo José de Sousa e o diretor-geral, José Tavares. Este documento não era meramente protocolar, ele pavimentou o caminho para uma colaboração robusta, que incluía:

– Troca permanente de experiências para aperfeiçoamento institucional;

– Realização de ações conjuntas como conferências, seminários, pesquisas e programas de treinamento;

– Intercâmbio regular de documentação e relatórios técnicos.

Dias mais tarde estivemos na Espanha, onde o “Tribunal de Cuentas” também formalizou um Termo de Cooperação. Com a mesma importância, fomos recebidos pela presidente da época, Milagros Garcia Crespo, e pelo conselheiro Ramón Muñoz Garcia, consolidando mais um pilar de nossa estratégia internacional.

O Diálogo com Berços da Tradição

A missão diplomática seguiu firme e nosso itinerário incluiu conversações essenciais com cortes de contas em outros países europeus, berços de uma rica tradição fiscalizadora.

– Itália: Em Roma, tivemos êxito em estabelecer um diálogo profícuo com a “Corte dei Conti“. Fomos recebidos por seu presidente, Giuseppe Carbone, e pelos conselheiros Enio Colasantri e Bartolomeu Manna. O detalhamento da estrutura técnica e administrativa da Corte dei Conti, oferecido pelo conselheiro Manna, foi um insight valiosíssimo para a nossa jovem corte.

– França: Em Paris, visitamos a “Cour des Comptes” uma das mais tradicionais da Europa, cujas raízes remontam à era de Napoleão Bonaparte. Fui recebido pelo conselheiro Marc Breton, segundo presidente da Corte, e pelo chefe de gabinete, Dominique Terroki.

Nesses contatos pudemos extrair o que havia de mais avançado no controle externo europeu para elevar no que pudéssemos o padrão de fiscalização e governança no Tocantins, servindo ainda de marco para os tribunais de contas brasileiros.

O Legado de uma Iniciativa Inovadora

Naquela época, a ousadia de um Tribunal de Contas estadual em buscar tal intercâmbio internacional era, de fato, uma experiência inovadora para os Tribunais de Contas de todo o Brasil. Concebemos essa iniciativa estrategicamente para adquirir o conhecimento que nos permitiria crescer e nos tornarmos a instituição de respeito que somos hoje. Os resultados positivos colhidos foram impactantes. A visão e o conhecimento trazidos da Europa foram cruciais para definir a trajetória do TCETO, permitindo que a Corte pudesse conduzir nosso trabalho com maior clareza, conhecimento e inovação.

Hoje, ao celebrar quase três décadas dessa ação, reconhecemos que aquele movimento antecipou tendências e contribuiu significativamente para a modernização e qualificação dos trabalhos da corte de contas tocantinense, pavimentando o caminho para um padrão mais elevado de fiscalização e governança que serve de exemplo.

É com profundo senso de dever cumprido que, ao participar de congressos e debates internacionais nos dias de hoje, observo a valia inestimável dessa abertura pioneira. A semente que plantamos floresceu: vejo as Cortes de Contas brasileiras, e faço aqui uma menção honrosa à Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon) e ao Instituto Rui Barbosa (IRB), firmando parcerias robustas com estes e outros tribunais mundo afora. Essa expansão é a prova da importância estratégica de nossa ação inicial. Fomos o marco que impulsionou o sistema de controle externo nacional a buscar, de forma perene, a excelência global.

O Oceano Atlântico foi cruzado em busca de uma visão que pudesse dar à nossa instituição a solidez do tempo e a precisão do saber internacional, e o conseguimos. É um legado de pioneirismo que o TCETO carrega com orgulho.

José Wagner Praxedes é conselheiro decano do Tribunal de Contas do Estado do Tocantins (TCE-TO)