Por Cezar Miola*
As agendas das autoridades podem nos dizer muito. A falta delas, também.
Com frequência, tomamos conhecimento de que agentes públicos por vezes se reúnem com diferentes atores em horários “atípicos” ou em espaços não usuais. E que tais encontros, quiçá por furtivos, não constam das respectivas agendas oficiais.
Assim, quase ingenuamente, poderíamos perguntar: por que razão não se dá publicidade a tais compromissos? Acaso não se estaria atentando para a célebre advertência de Immanuel Kant?: “Tudo o que não puder contar como fez, não faça”.
Situações assim, para além das dúvidas e preocupações que geram, permitem lembrar que o Código de Ética instituído pelo Decreto Federal nº 4.081, de 2002, manda a autoridade divulgar e manter arquivada a agenda das reuniões. Pelo mesmo regramento, as audiências devem ser solicitadas formalmente, com especificações do tema a ser tratado, identificação dos participantes, registro para consulta e acompanhadas de pelo menos um outro servidor público.
O certo é que, independente de ato normativo, autoridades com competência decisória, em qualquer escalão, têm obrigação de transparência quanto aos seus compromissos de trabalho. Essa prática é fundamental à fiscalização pela sociedade e essencial para aqueles dispostos a se blindar de conversas “não republicanas”.
Partindo do princípio de que as pressões e a capacidade de influência são inerentes à democracia, e, por isso, não necessariamente irregulares ou ilegítimas, é preciso estabelecer instrumentos para que essas iniciativas se mantenham dentro da moldura institucional. Ademais, a publicidade sobre os compromissos também ajuda a dissipar teorias conspiratórias, uma vez que, em um país em crise e polarizado, conversar virou quase um delito.
Por isso, é de se estimular as boas práticas no âmbito da administração pública, as quais têm potencial para se transformar em referências a serem replicadas nas diversas esferas de poder.
Já se disse que “democracias morrem atrás de portas fechadas”. E a República só se concretiza num ambiente de controle e de transparência.
Cezar Miola é conselheiro-ouvidor do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul