AtriConversa-05

Nº 005/2022
Data: 17-08-2021


O desafio do transporte coletivo urbano
e os Tribunais de Contas

Até o dia 31 de agosto, o Grupo de Trabalho criado pela Atricon deve finalizar um diagnóstico a respeito das principais dificuldades enfrentadas na prestação dos serviços de transporte coletivo urbano por ônibus no país.

O desafio é imenso. Segundo o Anuário da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), ao longo do tempo, houve expressiva redução no número de passageiros por ônibus, o que onera o serviço e os municípios - através da oferta de subsídios a esse sistema. Entre 1994 e 2012, a redução no número de usuários foi de 24,4%; de 2013 a 2019, de 26,1%; e de agosto de 2020 a julho de 2021, ficou estabilizada entre 35% e 40%.

O trabalho da Atricon é coordenado pelo presidente do Tribunal de Contas do Município de São Paulo (TCM-SP), conselheiro João Antonio da Silva Filho. A realidade da maior metrópole da América Latina exemplifica boa parte dos problemas que atingem quase a totalidade das cidades do país nessa área. O coordenador do GT, além de conhecer os mecanismos de controle externo que contribuem para esse diagnóstico, acumula a experiência e a sensibilidade de quem já esteve do “outro lado do balcão”, exercendo as funções de ordenador de despesas, de líder de governo e de oposição durante mandatos legislativos.

O coordenador

“Eu fiz o caminho inverso, eu venho da política para a academia e para o Sistema de Controle”, afirmou o conselheiro durante a entrevista ao Atriconversas. Em 2000, Silva Filho foi eleito vereador pela cidade de São Paulo e depois reeleito por três mandatos consecutivos. Foi líder de governo, por diversas vezes, líder de bancada, de situação e de oposição. Depois, na Assembleia Legislativa, eleito deputado estadual. Em seguida, convidado para ser secretário da Casa Civil do Governo Fernando Haddad, quando abriu a vaga para o Tribunal de Contas do Município de São Paulo. Foi escolhido por unanimidade (55 vereadores)  para ocupar o cargo que foi de escolha da Câmara Municipal, em 2014. Em 2018, assumiu a presidência do TCM-SP, função que vai ocupar até o final de 2022.

Na academia, fez especialização em Direito Administrativo e mestrado em Filosofia do Direito pela PUCSP, e é doutorando na área de Direito Público. 

Do curso de mestrado, nasceu a obra: “A democracia e a democracia em Norberto Bobbio”, onde faz uma reflexão sobre o avanço do Estado no mundo e do surgimento dos Estados nacionais nos tempos contemporâneos. “Eu me concentro nas teses e nas obras de Norberto Bobbio, filósofo italiano reconhecido, com presença marcante no Direito especialmente no Brasil”, explicou Silva Filho. É ainda autor das obras: “A Era do Direito Positivo, considerações sobre Política, Estado, Sociedade e Direito” – e “O sujeito oculto do crime, considerações sobre a teoria do domínio do fato”. O penúltimo livro que escreveu tem o título: “Os Tribunais de Contas e o Estado Democrático de Direito e os desafios do Controle Externo”, versando sobre a atuação dos órgãos de controle no país. E recentemente, sob o pseudônimo Mimila K. Rocha, escreveu um livro de poesias.

 

O papel preventivo dos Tribunais de Contas

 
Qual a importância do Grupo de Trabalho (GT) do Transporte Coletivo Urbano criado pela Atricon e os principais desafios desse setor? 

O controle precisa ser preditivo e preventivo, atuando antes que o desperdício do dinheiro público se efetive. Mas para controlar, é preciso conhecer. Por isso acho da mais alta importância a iniciativa do presidente da Atricon, Cezar Miola, de organizar diversos grupos de trabalho para tratar de matérias que versam sobre políticas públicas, que vão ao encontro dos interesses do povo brasileiro. Nesse aspecto, situa-se o GT do Transporte Coletivo. Nós estamos com um desafio enorme que é apresentar o resultado desse trabalho nas próximas semanas. O levantamento trará dados dos municípios com mais de 100 mil habitantes sobre o modelo de contratação, a forma de funcionamento do sistema de transporte, os custos, entre outras informações.

“Nossa tarefa é integrar políticas públicas dentro
dessa visão de um
controle preventivo que
chegue antes do
desperdício de dinheiro
público, avalista de
políticas públicas exitosas
voltadas ao bem-estar
da população.”

Estamos assistindo, cada vez mais, ao aumento do subsídio do transporte coletivo ofertado pelo poder público. Na cidade de São Paulo, por exemplo, o sistema de transporte custa R$ 9,8 bilhões por ano e recebe o subsídio do Executivo de R$ 4,5 bilhões. Acredito que , daqui a pouco, o Município não vai suportar esse investimento. É na busca dessas alternativas, e de soluções integradas que esse GT foi criado. Nossa tarefa é integrar políticas públicas dentro dessa visão de um controle preventivo que chegue antes do desperdício de dinheiro público, avalista de políticas públicas exitosas voltadas ao bem-estar da população. Ao promover a dignidade da pessoa humana, um dos princípios fundamentais da nossa Constituição, estamos promovendo cidadania.

O que é esperado com a conclusão desse trabalho? Será possível projetar uma modelagem mais adequada para os municípios, ou o objetivo é simplesmente levantar os problemas do sistema para que cada cidade procure uma solução específica de acordo com suas particularidades?

Nossa intenção é procurar realizar a integração de políticas públicas e compartilhar experiências para facilitar iniciativas locais. Um dos grandes desafios é encontrar novas formas de financiamento para o transporte coletivo nas cidades. Por quê? Porque a maioria desses municípios já está com dificuldades financeiras. Existem raríssimas exceções como Maricá, no Rio de Janeiro. A cidade tem tarifa zero porque a arrecadação tributária é alta por conta dos royaltes do petróleo, mas é uma exceção. Então é necessário buscar uma forma articulada de financiamento entre os entes federados: União, Estados e Municípios.

 
Já se vislumbra uma modelagem mais adequada?

Estamos na fase de levantamento de dados, dos tipos de contratos, dos dilemas e  dos problemas de cada um desses grandes centros urbanos. É uma etapa de estudos, de compartilhamento e de sistematização de informações a partir de auditorias já realizadas pelos Tribunais de Contas. Tenho a certeza de que esse trabalho será exitoso e, ao final de agosto, teremos um mapeamento consistente com diretrizes que poderão servir de subsídios para a tomada de decisões dos gestores públicos.

“Tenho certeza de que esse trabalho será exitoso e,
ao final de agosto,
teremos um mapeamento consistente, com diretrizes que poderão servir de subsídios para a tomada de decisões dos
gestores públicos.”

 

 

Entrevista: Matheus Giglio.
Edição: Priscila Oliveira.
Webdesigner: Márcia Vecchio.