Colaboração premiada

O professor Robert Cooter, da Universidade de Berkeley na Califórnia, é reconhecida autoridade no campo de estudos denominado “Direito e Economia”. Na abordagem dessa disciplina, a corrupção é vista muito mais como um problema de incentivos e organização do que de moral pública ou de normas. Assim, quanto maiores forem as sanções, monetárias ou não, a práticas corruptas, bem como a probabilidade de punição dos responsáveis, maior êxito terão as políticas anticorrupção. A hipótese da delação premiada, presente na legislação penal de diversos países, é uma aplicação prática dessa teoria, com registro de bons resultados na Itália e nos Estados Unidos.

Recentes acontecimentos trouxeram a colaboração premiada para as manchetes da imprensa nacional, sem, no entanto, explicar o seu funcionamento.

No Brasil, a denominada delação premiada foi regulamentada com o nome de colaboração premiada pela lei 12.850, de 02/08/2013, portanto há pouco mais de um ano. É interessante notar que a referida lei não foi proposta pelo Executivo mediante Medida Provisória, mas se originou do projeto de lei do Senado 150/2006, convertido no projeto 6.578/2009 e sancionado na íntegra.

A lei estabelece que a colaboração premiada é um dos meios de obtenção de prova, assim como quebra de sigilos, interceptação de comunicações e infiltração na organização criminosa – OC. O colaborador premiado poderá ter sua pena reduzida em 2/3 (dois terços) desde que contribua para um ou mais dos seguintes resultados:

I – identificação dos demais coautores e partícipes da OC e das infrações penais por eles praticadas;

II – revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da OC;

III – prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da OC;

IV – recuperação total ou parcial do produto das infrações penais praticadas pela OC;

Ou seja, somente pode haver colaboração premiada no contexto de uma organização criminosa, que é assim definida: a associação de quatro ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a quatro anos, ou que sejam de caráter transnacional.
Ademais, considerando a relevância da colaboração prestada, o Ministério Público e o delegado de polícia poderão requerer ou representar ao juiz pela concessão de perdão judicial ao colaborador.
Finalmente, o Ministério Público poderá deixar de oferecer denúncia se o colaborador não for o líder da organização criminosa e se for o primeiro a prestar efetiva colaboração. Nessa última hipótese, o colaborador premiado sequer será réu, mas apenas testemunha.

A norma é inteligente ao oferecer o maior benefício ao primeiro que se dispuser a colaborar e ao admitir significativa redução de pena para outros colaboradores, à exceção dos considerados líderes da organização.
Ponto relevante da lei é que nenhuma sentença condenatória será proferida com fundamento apenas nas declarações do colaborador, isto é, são indispensáveis outras provas da ocorrência dos fatos e de sua autoria, que confirmem as informações prestadas pelo colaborador.

Por sua vez, a lei 12.846/2013, alcunhada Lei Anticorrupção, também prevê a celebração de acordo de leniência com as pessoas jurídicas responsáveis pela prática dos atos nela previstos que colaborem efetivamente com as investigações. De igual modo, a lei 12.683/2012 aprimorou os controles sobre lavagem de dinheiro.

Assim, as recentes inovações legislativas possuem expressivo potencial de coibir ou inibir práticas criminosas, tanto por estimular acordos de colaboração ou leniência, quanto por aumentar os riscos dos que não celebrarem tais acordos e persistirem em atividades ilegais. De certa forma, o direito brasileiro assimilou as lições do professor Cooter e da experiência internacional.

Luiz Henrique Lima é Conselheiro Substituto do TCE-MT.