A busca de soluções consensuais como medida de prevenção a litígios e problemas estruturais é um fenômeno cada vez mais estudado e posto em prática por órgãos de controle e pelo Poder Judiciário. As experiências dos Tribunais de Contas (TCs) mostram que a incorporação de instrumentos de consensualidade tem trazido relevantes avanços no aprimoramento da gestão pública. Porém, ampliar o emprego da consensualidade e aperfeiçoar seu modus operandi colocam-se como desafios.
O Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ) adotou a consensualidade como prioridade em 2021, ainda em meu primeiro mandato como Presidente. Atento à reforma da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), que positivou o que a doutrina tem reconhecido como cláusula geral de consensualidade para a Administração Pública (cf. art. 26 da LINDB), o Tribunal alterou o antigo Regimento Interno e regulou os conhecidos Termos de Ajustamento de Gestão (TAGs). O instrumento foi mantido no atual Regimento Interno.
Atualmente, o fortalecimento dos mecanismos de consensualidade aplicáveis aos processos de controle externo figura formalmente como pressuposto básico da gestão para o biênio 2023-2024 do TCE-RJ. É também uma diretriz da atual administração a consolidação do uso de mecanismos de consensualidade, com o objetivo de impulsionar a celeridade e a adequação das ações corretivas, de forma a obter resultados mais benéficos à sociedade.
Fortalece esse movimento em torno da consensualidade administrativa a Nota Recomendatória nº 02/2022 expedida pela Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon). O documento orienta os TCs para que, observado o regime jurídico-administrativo, adotem instrumentos de solução consensual de conflitos, aprimorando essa dimensão nos processos de controle externo.
Nessa direção, o Tribunal de Contas da União (TCU), alinhado à referida Nota, criou recentemente a Secretaria de Controle Externo de Solução Consensual e Prevenção de Conflitos (SecexConsenso), cujo papel é identificar soluções consensuais para problemas relevantes, bem como mitigar litígios que, muitas vezes, tramitam demoradamente no Tribunal e nem sempre chegam a ser concluídos ou convertidos em benefícios à sociedade.
A iniciativa de criar a unidade técnica especializada do TCU se deu em razão da edição da Instrução Normativa nº 91/22, que instituiu procedimentos de solução consensual de controvérsias relevantes e prevenção de conflitos afetos a órgãos e entidades da Administração Pública Federal desencadeados a partir das Solicitações de Solução Consensual (SSC), como são chamadas. Os procedimentos são desencadeados a partir de uma solicitação de solução consensual pelos legitimados nela elencados.
No âmbito do TCE-RJ, foram instituídas, no primeiro biênio da atual gestão, as reuniões técnicas de jurisdicionados com representantes do Corpo Instrutivo. Esse mecanismo de consensualidade aplicável aos processos de controle externo, com o objetivo de impulsionar a celeridade e a adequação das ações corretivas, foi também expressamente previsto pelo novo Regimento Interno, aprovado em fevereiro deste ano.
Outro instrumento à disposição da Administração Consensual, as assim chamadas Mesas Técnicas também têm sido objeto de destaque no âmbito de outras Cortes de Contas brasileiras. Elas são mais uma ferramenta na busca de consensos e da segurança jurídica. Consistem em reuniões de trabalho com agentes e servidores de órgãos e entidades jurisdicionados para tratar de matérias de destacada relevância ou de alto grau de complexidade diretamente com representantes do Corpo Instrutivo e, em alguns casos, com o relator do processo em tramitação no Tribunal.
Com efeito, as Mesas Técnicas e as SSCs podem ser definidas como foros de discussões no bojo dos quais há espaço para a exposição, pelo jurisdicionado, dos problemas e dificuldades reais por ele enfrentados (cf. art. 22 da LINDB). A partir do diálogo estabelecido, é exercida, por assim dizer, e segundo o Ministro do TCU Benjamin Zymler, em palestra proferida no XI Fórum Jurídico de Lisboa, uma espécie de controle concomitante, prevenindo futuras controvérsias e promovendo maior segurança ao gestor.
Os debates têm por objetivo tanto a realização de um controle externo mais simples, menos solene, mais célere, mais versátil e mais próximo das preocupações cotidianas dos gestores públicos, quanto a promoção de procedimentos de controle externo que prestigiem o diálogo e a cooperação. A iniciativa além de auxiliar o gestor público na identificação de soluções mais eficientes e seguras, em prol do cidadão, legitima o processo decisório e amplia a segurança jurídica aos fiscalizados.
Deflagradas a partir da provocação de autoridades competentes no âmbito dos próprios Tribunais de Contas ou mesmo dos jurisdicionados, as Mesas Técnicas buscam, ainda, privilegiar ações de controle externo preventivo antes da instauração de processos sancionadores.
Por fim, em consonância com o Pressuposto Básico da Gestão para o biênio 2023-2024 do TCE-RJ, de fortalecimento dos mecanismos de consensualidade aplicáveis aos processos de controle externo, o presente texto tem o condão de incentivar o debate, no âmbito de nossa Corte de Contas, para avaliação da possibilidade e da pertinência da adoção das Mesas Técnicas, considerando o efetivo potencial desses instrumentos para o contínuo aprimoramento do Controle Dialógico da gestão pública.
Rodrigo Melo do Nascimento – Presidente do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro.