O avanço do uso de inteligência artificial, a modernização da gestão pública e o fortalecimento da transparência guiaram os debates do simpósio “Governança, IA e Transparência na Administração Pública”, realizado na última terça-feira (4), no auditório Nereu Ramos, na Câmara dos Deputados, em Brasília. O encontro reuniu parlamentares, membros dos Tribunais de Contas, pesquisadores e gestores públicos para debater os desafios e as oportunidades que a inovação traz ao Estado brasileiro, especialmente no contexto da Lei de Acesso à Informação (LAI), da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e da construção do Marco Legal da Inteligência Artificial.
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Abertura – Governança e transparência como bases para a inovação pública
O presidente da Atricon, Edilson Silva, realçou que governança e transparência permanecem como fundamentos essenciais para instituições públicas sólidas. “Estamos diante de uma administração cada vez mais orientada por dados e tecnologia, e a sociedade exige que as decisões públicas sejam éticas, eficazes e verificáveis”, observou.
O deputado Acácio Favacho, presidente da Frente Parlamentar Mista pela Transparência Pública, sublinhou que o Legislativo segue comprometido com políticas que reforcem o acesso à informação e ampliem a confiança social nas ações governamentais. Já o presidente do Instituto Rui Barbosa, Edilberto Pontes, lembrou que, embora os instrumentos mudem com a inovação, princípios como governança e eficiência continuam guiando o serviço público.
A mesa de abertura contou ainda com a presença do presidente do CNPTC, Luiz Antônio Guaraná, e dos deputados Mauro Benevides e Fausto Júnior.
Painel 1 – Governança e inovação no setor público
O primeiro painel abordou o desafio de construir uma administração capaz de operar com previsibilidade, coordenação e orientação para resultados. Os participantes enfatizaram que a governança deve servir como eixo estruturante das políticas públicas, integrando liderança, estratégia e mecanismos de controle para assegurar a entrega de valor ao cidadão.
O ministro do TCU, Augusto Nardes, assinalou que a transformação tecnológica só se sustenta quando apoiada por estruturas sólidas de governança, capazes de articular órgãos de controle e promover decisões fundamentadas em dados confiáveis.
Na sequência, o secretário-executivo do Ministério da Gestão e da Inovação, Roberto Pojo, observou que o Brasil dispõe de um sistema formal de transparência, mas ainda enfrenta barreiras para tornar as informações plenamente acessíveis. Segundo ele, tornar dados públicos compreensíveis para toda a população é parte essencial do equilíbrio entre Estado e sociedade.
O mediador do painel, Cezar Miola, sintetizou o debate ao afirmar que o fortalecimento dos órgãos de controle contribui diretamente para a proteção dos princípios republicanos e para a efetividade da democracia. Ele reforçou a necessidade de cooperação contínua entre Tribunais de Contas, ministérios e órgãos de controle interno.
Painel 2 – Marco Legal de IA e seus impactos na transparência pública
O segundo painel discutiu pontos do Marco Legal da Inteligência Artificial e seus impactos sobre a administração pública. Para os debatedores, o novo marco inaugura uma etapa em que o Estado precisará adotar sistemas inteligentes guiados por padrões rigorosos de ética, supervisão e transparência. Avaliação de risco, explicabilidade, auditorias e responsabilização foram apontados como elementos fundamentais dessa governança.
A coordenadora do Eixo Governança do Laboratório de Inovação da Advocacia-Geral da União, Mariana Montenegro, abordou a necessidade da confiabilidade dos dados e da transparência algorítmica, destacando que experiências internacionais, e até mesmo as regras adotadas pelo Conselho Nacional de Justiça para o uso de IA no Judiciário, oferecem referências valiosas para o Brasil.
O presidente do Conaci e secretário de Transparência do Espírito Santo, Edmar Camata, reforçou que a regulação da IA precisa dialogar com a LGPD e com o arcabouço normativo já existente. Ele chamou atenção para a realidade dos municípios, que ainda possuem baixo nível de maturidade digital e estruturas de controle reduzidas. Segundo Camata, é essencial equilibrar proteção, capacidade de implementação e o aproveitamento dos benefícios que a IA pode trazer ao setor público.
O mediador, Antônio Joaquim, completou o debate ao mencionar que a IA pode ampliar significativamente a capacidade de organização e disponibilização de dados públicos, tornando temas complexos, como orçamento e execução de políticas, mais compreensíveis à sociedade.
Painel 3 – Inovação no controle público: IA como ferramenta de governança e transparência
O painel de encerramento abordou o uso crescente da inteligência artificial no controle público, com exemplos de automação, análise preditiva e mineração de dados que vêm aumentando a eficiência do Estado na detecção de irregularidades e no monitoramento de políticas públicas.
A secretária-executiva da CGU, Eveline Brito, alertou para os riscos de aprofundamento de desigualdades estruturais caso o país não enfrente a chamada tríade da escassez: disponibilidade de profissionais qualificados, recursos financeiros e acesso equitativo a tecnologias. Ela argumentou que essa assimetria já é perceptível dentro do próprio setor público, onde alguns órgãos possuem infraestrutura robusta enquanto outros mal conseguem acompanhar a transformação digital.
O diretor da Agência Nacional de Proteção de Dados, Iagê Miola, reforçou que ampliar a transparência é indispensável para o uso responsável da IA. Segundo ele, tecnologias sempre produzem efeitos ambientais, sociais e institucionais, e por isso mecanismos sólidos de transparência algorítmica são essenciais para assegurar legitimidade às decisões automatizadas.
Encerrando o painel, o conselheiro do TCE-PE, Carlos Neves, registrou que o país ainda enfrenta um cenário federativo desigual, no qual milhares de municípios carecem de infraestrutura digital mínima, o que compromete a oferta de serviços públicos digitais e a adoção de soluções inteligentes.