Por Inaldo da Paixão Santos Araújo*
Se por um lado a Constituição Federal estabelece que os Tribunais de Contas não compõem o Poder Judiciário; de igual modo, é a Carta Maior que define que os membros dessas Casas de Controle possuem os mesmos direitos e deveres dos magistrados do Direito.
Embora, ainda, não seja exigido concurso público para ingresso na carreira da maioria de seus membros (sete dos nove ministros do Tribunal de Contas da União e cinco dos sete conselheiros no âmbito dos Tribunais de Contas dos Estados), o provimento desses ministros e conselheiros é ato complexo. Primeiro, faz-se necessário observar os requisitos do § 1º do artigo 73 da Constituição Federal.
Além disso, suas nomeações só se dão, por parte do Chefe do Poder Executivo, após sabatina pelo Parlamento.
Sobre esse processo, a Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (ATRICON), em Nota Pública, defende que “os requisitos de idoneidade moral e reputação ilibada para a nomeação dos indicados para compor o quadro de ministros e conselheiros dos Tribunais de Contas, a que se refere a Constituição Federal, sejam aferidos rigorosamente com base nos critérios da Lei da Ficha Limpa e que os próprios Tribunais devem negar posse aos indicados que desatendam os requisitos legais”.
Importante trazer para o debate que a independência dos magistrados de Contas é assegurada principalmente pela Carta Maior, ao estender-lhes as garantias da vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de subsídios. Nessa linha de pensar, poder-se-ia indagar, como bem o faz o Ministro aposentado do STF, Ayres Britto, “o que mais querem os Tribunais de Contas?”
Indubitavelmente, os Tribunais de Contas, em face das inúmeras atribuições constitucionais que possuem e que estão listadas no art. 70 da Carta Magna (funções opinativa, judicante, fiscalizatória, consultiva e sancionatória), configuram-se como verdadeiros guardiães das coisas do povo, pois, das causas, cuida o Poder Judiciário.
Sim! Quando se referir à proteção do erário, ao combate à corrupção, a assegurar as boas práticas de governança, ao aumento da eficiência e da efetividade das políticas públicas e à transparência das contas governamentais, os protagonistas devem ser os Tribunais de Contas.
Porém, no exercício constitucional desse protagonismo, esses Tribunais emitem pareceres, julgam contas, aprovando-as, reprovando-as, ressalvando determinados aspectos, recomendando a adoção de melhores práticas e multando e responsabilizando financeiramente gestores por eventuais danos causados ao patrimônio público.
Ao decidir, os membros dos Tribunais de Contas devem estar fundamentados em evidências suficientes e adequadas, obtidas em processos auditoriais. Não por outra razão é que a Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado da Bahia (TCE/BA), em seu art. 9º, estabelece que:
“[…] o parecer prévio sobre as contas do Chefe do Poder Executivo, bem como o julgamento das contas dos administradores e demais responsáveis […] devem estar fundamentados nas respectivas auditorias”.
Além disso, o parágrafo único desse dispositivo determina que as decisões contrárias às auditorias devem ser, “necessariamente, fundamentadas com a indicação expressa dos motivos que conduziram à divergência”.
Na mesma trilha caminha a Lei nº 8.443/1992 do Tribunal de Contas da União (TCU), ao definir, no § 3° do seu art. 1º, que constará das decisões do Tribunal o relatório do ministro-relator, nele incluídas as conclusões do Relatório da equipe de auditoria.
Dúvida não pode restar sobre a importância da atividade auditorial para as decisões dos Tribunais de Contas, que, como órgãos independentes, devem, além desse aspecto, contar, como requisito essencial, com a imparcialidade de seus membros.
Todavia não se pode esquecer de que, em relação à conduta dos membros dos Tribunais de Contas, também é exigido, em especial, o dever da “circunspecção e o do recato”.
O Presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ministro Ricardo Lewandowski, no artigo publicado pela Folha de S. Paulo, em 13/09/2015, manifestou-se sobre esse tema. Nele, afirmou que “a verbosidade de integrantes do Poder Judiciário, fora dos lindes processuais, de há muito é tida como comportamento incompatível com a autocontenção e austeridade que a função exige”.
Concluiu destacando que “o protagonismo extramuros, criticável em qualquer circunstância, torna-se ainda mais nefasto quando tem o potencial de cercear direitos fundamentais, favorecer correntes políticas, provocar abalos na economia ou desestabilizar as instituições, ainda que inspirado na melhor das intenções”.
Não por outra razão, esse artigo foi considerado pelo presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcus Vinicius Furtado Coêlho, como “uma verdadeira aula sobre a postura que se aguarda do magistrado atual nessa quadra histórica. Equilibrado e discreto, prudente e imparcial. O juiz deve buscar a credibilidade, não a popularidade”.
Desse modo, levando-se em consideração esses pontos, crê-se que os Tribunais de Contas estão no caminho certo para, de forma independente e circunspecta, avançarem, zelando sempre pelo dinheiro que ao povo pertence e tornando-se, cada vez mais, um órgão reconhecidamente primordial para toda a sociedade.
(*) Inaldo da Paixão Santos Araújo é Mestre em Contabilidade, Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado da Bahia, Professor universitário e Escritor.