O que a sociedade pensa dos Tribunais de Contas?

por Valdecir Pascoal*

Presidente da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil – Atricon ([email protected])

Muda-se o ser, muda-se a confiança;

Todo o mundo é composto de mudança,

Tomando sempre novas qualidades. Luís de Camões

Vox populis, vox Dei! Essa máxima, embora desvirtuada algumas vezes no curso da história, ainda representa, no popular, consensos úteis e respeitáveis. Assim, as pesquisas de opinião sobre instituições, quando fundadas em critérios científicos e isentos, constituem fonte rica para avaliações e ações de aprimoramento da imagem (parecer) e da própria essência das organizações (ser). Na área pública, essa estratégia tem sido usada com frequência com essa finalidade, especialmente nos tempos de métricas e indicadores de desempenho, banhados pela modernidade dos benchmarkings.

Por conta disso, a Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon) interagiu com a CNI e o Ibope no sentido de desenvolver pesquisa nacional específica sobre o conhecimento e a imagem desses órgãos junto à sociedade.

Na pesquisa, aplicada no período de 24 a 27 de junho, foram ouvidos 2002 cidadãos. Os resultados revelam a aprovação geral dessas instituições, mas indicam pontos em que a sociedade reclama ajustes.

De início, merece destaque que apenas 17% da população sabe o que fazem os Tribunais de Contas. Embora não tão expressivo, esse número não destoa do conhecimento do cidadão em relação a outros órgãos e Poderes de mesma natureza, que, por atuarem na retaguarda das políticas públicas, tornam-se menos conhecidos. Os dados da pesquisa também revelam que esse conhecimento no extrato dos respondentes com grau de instrução superior alcança 43%, o que é animador, em vista do caráter de formador de opinião desse grupo.

Se tomarmos a opinião dos que conhecem os Tribunais de Contas, os resultados também ressaltam a enfática aprovação sobre a importância desses órgãos no combate à corrupção, tema em que 90% demonstrou concordância. Neste caso, os que concordam totalmente com essa percepção chega a 72% (18% concordam em parte), o que confere maior validade ainda a esse reconhecimento. Tal sentimento certamente é fruto das atribuições constitucionais de julgar as contas dos gestores, da fiscalização cada vez mais preventiva (cautelar) em licitações e contratos, do desenvolvimento de portais de transparência que estimulam o controle social e da atuação integrada e em rede com o controle interno, os ministérios públicos e a polícia federal. Ações que costumam resultar em responsabilizações no campo administrativo, eleitoral, político, penal e da improbidade. É curioso observar que mesmo na amostra integral, que inclui os que desconhecem as atribuições desses órgãos, tal percentual ainda atinge 79%, o que confirma que essa expectativa faz parte do imaginário da sociedade sobre a função dos Tribunais de Contas.

Quanto ao controle técnico exercido por essas instituições, seja no combate à ineficiência e ao mau uso dos recursos ou no aprimoramento da gestão, as opiniões são francamente favoráveis, com índices respectivos de 89, 80 e 82%. Ressalte-se que esses resultados são tanto mais significativos quando se leva em conta que esses números se referem àqueles que demonstraram conhecer esses entes de controle.

A pesquisa também revela que os Tribunais de Contas são tidos como órgãos mais técnicos do que políticos, na opinião de 62% dos respondentes desse mesmo extrato. No entanto, o modelo de indicação de seus membros é visto como um obstáculo ao bom funcionamento dessas instituições, para 75% dos entrevistados. Sob nossa ótica, essa percepção reflete, de certo modo, a crise do Estado e da representatividade política, que afeta, de forma geral, o juízo de valor da sociedade sobre as instituições públicas. Por mais avançados que já sejam os critérios constitucionais para a composição dos Tribunais de Contas (e, de fato, eles já o são), e por mais esforços que estejam sendo feitos com vistas ao seu efetivo cumprimento, a discussão sobre a possibilidade de aprimoramentos neste tema se impõe.

No que respeita aos indicadores gerais do desempenho dos órgãos, a avaliação é bem repartida. Com efeito, apesar de uma parcela importante (33%) aprovar o desempenho dos Tribunais de Contas, as opiniões divergentes têm a mesma expressão numérica: 32% veem a atuação como regular e 30% mostram-se insatisfeitos. Considerando o atual contexto de crise ética e da forte cobrança do cidadão, e levando em conta que os Tribunais de Contas não dispõem de mecanismos de investigação e de punição de natureza policial ou judicial, como quebrar sigilos e determinar prisões de gestores públicos, por exemplo, o fato de 65% avaliarem o desempenho dessas instituições como ‘ótimo, bom ou regular’, representa, decerto, um bom resultado. Não obstante, a Atricon vem desenvolvendo ações voltadas ao aprimoramento do sistema, em busca de um desempenho ainda mais efetivo, com a implementação do Programa Qualidade e Agilidade dessas instituições, que já alcança 33 dos 34 Tribunais de Contas do Brasil.

Finalmente, os dados mostram que, no cômputo geral, as instituições têm um bom índice de aprovação, com a manifestação favorável à sua manutenção por 94% dos respondentes que as conhecem.

As mudanças, que tiveram grande inflexão a partir da Constituição “Cidadã” de 1988, e mais adiante com a LRF e com a lei da ficha limpa, certamente continuarão. A Atricon seguirá nesta senda, considerando o olhar do cidadão como farol para orientar o caminho a seguir no aprimoramento sistêmico e sustentável do desempenho dos Tribunais de Contas. Tudo isso com vistas a assegurar a máxima efetividade ao ordenamento jurídico que os disciplina, mas, ao mesmo tempo,  vigilante, para lutar contra tentativas de enfraquecimento, e atuante nos debates sobre  reformas estruturais que possam fortalecer ainda mais o controle externo brasileiro.