Os Tribunais de Contas e o Consensualismo

José Raimundo Bastos de Aguiar

Os Tribunais de Contas brasileiros estão em constante evolução. É natural que isso ocorra, pois a gestão pública também está cada vez mais sofisticada e complexa. Nos últimos anos, os órgãos de controle externo, sem descuidar do dever constitucional de fiscalizar a legalidade das despesas e dos atos administrativos, também passaram a cuidar da qualidade dos gastos, com auditorias destinadas a avaliar a eficiência e a efetividade das ações governamentais, bem como o cumprimento das políticas públicas, que produzem os serviços que atendem os direitos dos cidadãos.

A crescente demanda da sociedade por serviços públicos de qualidade, a evolução tecnológica e as limitações das finanças públicas levaram os entes estatais a buscarem a expertise e os recursos de outras organizações e investidores. Com isso, o Estado passou a fazer concessões de serviços e a realizar parcerias público-privadas para atrair investimentos e promover o desenvolvimento.

Era previsível que, com o tempo, algumas dessas contratações enfrentassem conflitos que poderiam sobrecarregar ainda mais o Poder Judiciário.

A sobrecarga dos sistemas judiciários em vários países deu origem ao conceito de direito multiportas, ou sistema de múltiplas portas, que defendeu a existência de diversas formas para resolver conflitos.

No Brasil, o Código de Processo Civil (CPC) de 2015 deu início à valorização da conciliação e da mediação como alternativas para a solução de conflitos. No mesmo ano, a Lei No 13.140/2015 dispôs sobre a autocomposição de conflitos na administração pública. Em 2018, a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) trouxe, entre outras alterações, a que admitiu a solução consensual de controvérsias na aplicação do direito público.

Mais recentemente, a nova Lei Federal de Contratos e Licitações (Nº 14.133/2021) autorizou a conciliação e a mediação, entre outros meios alternativos de prevenção e resolução de conflitos na administração pública.

Entre outros Tribunais de Contas, já temos o da União (TCU) com a sua Instrução Normativa No 91/2022, o TCE/MT com a Lei Complementar Estadual No 752/2021, e o TCE/BA, com a Resolução No 46/2024, que consolidaram os procedimentos de solução consensual de controvérsias e prevenção de conflitos nas respectivas esferas da administração estatal.

Mas quais seriam as vantagens de termos os tribunais de contas atuando como mediadores para a solução de controvérsias?
Em primeiro lugar, vislumbra-se uma maior agilidade e custos menores, quando se compara ao processo judicial.

Depois, e principalmente, deve-se destacar a formação multidisciplinar e a especialização dos auditores dos tribunais de contas. A atividade auditorial exige que as equipes sejam compostas por profissionais com formações variadas, como administração, contabilidade, direito, economia, engenharia e tecnologia da informação, entre outras. E, também por exigências da atividade profissional, os auditores precisam ter especializações em temas relacionados a essas áreas, que são fundamentais para o melhor deslinde das questões subjacentes às controvérsias na gestão pública.

Outra vantagem da atuação dos tribunais de contas é que os opinativos das unidades técnicas especializadas compõem o processo, que também passará pela homologação do colegiado de conselheiros.
Assim, as partes terão uma maior segurança jurídica de que as soluções acordadas não descumprirão normas ou princípios da administração pública, o que poderia invalidar a autocomposição.

Importa esclarecer que o consensualismo nos tribunais de contas não contraria o princípio da indisponibilidade do interesse público, já que este não está desassociado do interesse social. E assegurar a observância do princípio constitucional da eficiência, com soluções rápidas e eficazes para problemas que afetam a população, também garante a preservação do interesse público.

Portanto, a atuação dos tribunais de contas na mediação de conflitos está a serviço da eficiência na administração pública, o que contribuirá, consequentemente, para o aumento da produtividade brasileira e para o desenvolvimento econômico e social, além de fortalecer uma cultura nacional de diálogo, negociação e pacificação.

José Raimundo Bastos de Aguiar é secretário de controle externo do TCE-BA