Pepe Mujica: Entre o limite e a serenidade

João Antonio

Para aqueles que apreciam a arte da escrita, é impossível permanecer em silêncio na semana em que o mundo se despede de José “Pepe” Mujica. Mas este não é um texto sobre a morte — é, antes, uma celebração da vida e de tudo o que a torna mais leve, segura e equilibrada. Mujica nos ensinou que não são as riquezas materiais que sustentam a existência com dignidade, mas sim a capacidade de cada indivíduo de se projetar no tempo e de traçar sua trajetória com base em princípios sólidos — ancorados na espiritualidade ou, simplesmente, na concretude de ações voltadas à preservação da vida em todas as suas dimensões.

Há seres humanos que, por posturas individualistas, passam despercebidos. Em contrapartida, há outros que, guiados por valores humanistas e desprovidos de ambições meramente materiais, se tornam gigantes morais e se projetam como faróis para muitas gerações. Nesse perfil raro e luminoso, Pepe Mujica se encaixa com perfeição.

Sim, poderíamos escrever dezenas de páginas sobre a trajetória desse homem quase singular no cenário mundial — mas não é esse o objetivo. Prefiro destacar, em poucas palavras, aquilo que considero seu maior legado: a sabedoria de viver com simplicidade, coerência e profundidade. Mujica ensinou, com o exemplo, que viver bem não é acumular bens, mas cultivar valores. Sua vida foi um manifesto silencioso contra os excessos e uma convocação ao essencial.

Algumas de suas frases resumem essa visão de mundo:

  • “Não sou pobre: pobres são aqueles que precisam de muito para viver.”
  • “Fomos educados para o crescimento, mas não para a felicidade.”
  • “A liberdade é ter tempo para fazer o que se gosta.”
  • “Os políticos devem viver como vive a maioria, não como vive a minoria.”
  • “Se você não é feliz com pouco, não será feliz com muito.”
  • “Não sou contra o consumo, sou contra o consumismo.”
  • “A vida é um milagre, mas nos esquecemos disso porque nos distraímos com o consumo.”
  • “O que sustenta nossa civilização é o tempo que as pessoas gastam trabalhando, não o dinheiro.”
  • “A política não deve ser um negócio, mas uma paixão pelo bem público.”
  • “A humanidade precisa aprender a viver com o suficiente.”
  • “As pessoas valem mais do que os bens materiais.”
  • “O poder não muda as pessoas, apenas revela quem elas realmente são.”
  • “A economia de mercado criou uma cultura onde tudo se compra e se vende — até as relações humanas.”
  • “O verdadeiro herói não é aquele que vence, mas aquele que não desiste de lutar.
  • “O sonho de igualdade entre os homens deve ser o norte permanente.”
  • “Minha ideologia é simples: viver com dignidade, lutar pela justiça e cuidar do planeta.”

Essas palavras, vindas de quem as viveu com coragem e integridade, são mais do que frases: são sementes de consciência. São convites à transformação individual e coletiva.

Sua trajetória, desde os tempos de guerrilheiro que enfrentou uma ditadura brutal — passando por anos de prisão, tortura e isolamento — até sua eleição como presidente do Uruguai, é marcada por coerência ética e grandeza espiritual. Mujica não se deixou consumir pelo ódio. Ao contrário: transformou a dor em sabedoria, e a experiência em ponte para o diálogo. Governou não com vaidade ou sede de poder, mas com um raro senso de dever público, unificando o país por meio da autenticidade e da serenidade de suas convicções.

No fim, o verdadeiro significado de Pepe Mujica para a humanidade está em sua capacidade de ser ao mesmo tempo símbolo e espelho. Símbolo de uma política que serve à vida; espelho de tudo aquilo que ainda podemos ser.

Viva Pepe Mujica!

João Antonio é conselheiro do TCM-SP e vice-presidente da Atricon