por Inaldo da Paixão Santos Araújo*
Os Tribunais de Contas são órgãos de status constitucional que auxiliam o Poder Legislativo no exercício do controle externo, porém sem manter, com esse Poder, relação de dependência. O objetivo maior dessas Casas de Controle é assegurar o cumprimento da accountability (obrigação de prestar contas), combater a corrupção e promover boas práticas de gestão.
Esses Tribunais, todavia, possuem uma característica especial. Conquanto possuam a função de julgar contas dos administradores, dos demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos e daqueles que derem causa à perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário (Constituição Federal, art. 70, II), eles não esperam ser acionados para agir. De moto próprio, esses Tribunais administrativos coletam suas provas, formalizam seus processos e julgam.
Entretanto qualquer decisão dos Tribunais de Contas deve estar fundamentada em trabalhos auditoriais. Por auditoria, entende-se o processo sistemático e independente, pautado em normas profissionais consagradas, que permite a obtenção de evidências – suficientes e adequadas – sobre se uma determinada prática está ou não em conformidade com o parâmetro estabelecido. As constatações decorrentes devem ser devidamente documentadas e apresentadas em relatórios objetivos e oportunos.
Assim, para que esse imprescindível órgão da República cumpra com efetividade o seu mister maior, necessário se faz contar com recursos orçamentários suficientes, pessoal qualificado e motivado, e devem ser livres de qualquer espécie de interesse e intimidação que evidencie perda de independência. Aliás, desde a sua idealização, pelo baiano Ruy Barbosa, deseja-se um Tribunal de Contas “colocado em posição autônoma, com atribuições de revisão e julgamento, cercado de garantias contra quaisquer ameaças”, na forma expressa na Exposição de Motivos ao Decreto nº 966-A, de 7/11/1890, que criou o Tribunal de Contas da União.
Transcorridos mais de 125 anos da sua criação, os Tribunais de Contas enfrentam, ainda, desafios de ordem institucional e operacional. Nessa linha de pensar, razão assiste ao conselheiro aposentado Zilton Rocha, quando defende a necessidade de aperfeiçoamento da forma de provimento dos membros desses Tribunais, bem como que eles atuem, prioritariamente, de forma seletiva, tempestiva, pedagógica e que demonstrem, sempre, a positividade da relação custo x benefício.
De fato, a Constituição de 1988 aprimorou o processo de escolha dos julgadores de contas. Mas os “tempos modernos” estão a exigir um salto ainda maior, ampliando a participação técnica na composição dos Tribunais de Contas.
Torna-se necessário que esses Tribunais, ao realizarem auditorias segundo as normas profissionais, e, tendo como norte a adoção de medidas que reduzam as ocorrências de “malfeitos”, divulguem tempestivamente suas constatações relevantes. Outrossim, análises comparativas entre o custo incorrido por essas Casas de Contas e os benefícios de suas ações devem ser continuadamente realizadas e apresentadas.
É preciso, ainda, que os Tribunais de Contas tenham mais visibilidade. Afinal, quando se trata do combate à corrupção, não se pode esquecer de que “robustos trabalhos” institucionais desenvolvidos pela Polícia, pelo Ministério Público e por instâncias do Poder Judiciário originaram-se em ações de órgãos de controle, em especial, os Tribunais de Contas.
Em forma proativa de pensar, loas para a Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (ATRICON), que está aberta “ao debate sobre possíveis aprimoramentos na forma de composição dos Tribunais, mas reitera que o atual modelo, […] foi um dos grandes avanços da Constituição Federal”. Essa Associação, oportuno registrar, desenvolve programa pioneiro de avaliação dos Tribunais de Contas, denominado “Projeto Qualidade e Agilidade do Controle Externo” ou, simplesmente, QATC. Em sua segunda fase, esse programa objetiva avaliar os Tribunais de Contas por meio de uma poderosa ferramenta denominada “Marco de Medição de Desempenho”.
Ao serem observados esses requisitos, dúvidas não haverá de que este país realmente avança e de que teremos um Tribunal de Contas diferente – diferentemente melhor – e sem o risco de se transformar em uma “instituição de ornato aparatoso e inútil”. Como preconizou, aliás, o seu idealizador.
Inaldo da Paixão Santos Araújo é Mestre em Contabilidade. Conselheiro-presidente do Tribunal de Contas do Estado da Bahia. Professor. Escritor.