Escrever é também garimpar palavras. E na lavra diária para encontrar o melhor verbete, aquele que case com o melhor sentido, confesso que ainda utilizo, entre outros, o pesado dicionário físico Aurélio, da Língua Portuguesa, para viver a experiência de mineração da linguagem. No caso específico deste artigo, folheei, aos blocos, o grande volume até parar na página 1.349, onde encontrei a acepção que me interessava da palavra moção: “Proposta, em uma assembleia, acerca do estudo de uma questão, ou relativa a qualquer incidente que surja nessa assembleia; proposta”. No azo de reconhecer o empenho dos profissionais do controle ou de qualquer outra personalidade cujo trabalho sirva à sociedade, costumo propor moções de aplauso e louvor nas sessões plenárias do Tribunal de Contas do Estado da Bahia (TCE/BA). É uma maneira de marcar, no tempo, a história de quem faz ou de quem transforma sonhos em realidade.
Na sessão plenária do dia 9.05.2023 do TCE/BA, tive o prazer de propor uma moção que, para mim, foi motivada por um fato histórico. O auditor-chefe do Banco Central do Brasil (BCB), o baiano Ailton Aquino dos Santos, foi indicado para ocupar o cargo de Diretor de Fiscalização da instituição financeira. Como servidor público e professor da Universidade do Estado da Bahia (Uneb), só posso louvar a atitude do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de valorizar um servidor de carreira, que será o primeiro negro a integrar a cúpula do BCB.
Ailton, inclusive, foi meu aluno. Ainda me lembro da alegria do talentoso e dedicado jovem ao me comunicar a sua aprovação no concurso para o então BACEN. Na autarquia dos bancos, fez carreira e brilhou como contador. Como auditor-chefe no Banco Central, trilhou um caminho dignificante e merecido.
Seu vasto currículo inclui duas formações acadêmicas: cursou contabilidade na universidade Estadual da Bahia (Uneb) e direito na UDF Centro Universitário. Além disso, possui mais três especializações, Contabilidade Internacional, Engenharia Econômica e de Negócios e Direito Público.
Aquino é a prova provada de que dedicação, estudo e competência podem, sim, neste país tão desigual, ser a fórmula para o sucesso. Mas, antes de tudo, é preciso narrar um pouco da origem desse brilhante profissional, natural de Jequié, no sertão baiano. Filho do carpinteiro Augustinho Ribeiro dos Santos e da dona de casa Ceci de Aquino Santos, o auditor-chefe do BCB enfrentou muitas adversidades antes de deslanchar em sua carreira no serviço público. Quando cursava a 7ª série, no Colégio Polivalente de Jequié, teve que estudar à noite para trabalhar e ajudar a família. Mudou-se para Salvador, em 1993, para continuar seus estudos. Na ocasião, foi morar com seu pai, em um barraco, no final de linha da Rua Daniel Lisboa, em Brotas.
Os estudos e a perseverança sempre foram, para o incansável contabilista, uma religião. Ailton foi aprovado em Ciências Contábeis na Uneb e, ao mesmo tempo, passou no concurso do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJBA) para digitador. Estudando pela manhã e trabalhando no turno vespertino, dedicava-se fortemente para passar em vários outros concursos. Com o apoio didático dos seus professores, foi aprovado, ainda, quando cursava o 7º semestre de Ciências Contábeis, no concurso de analista do Banco Central, onde começou a trabalhar na fiscalização de instituições financeiras. Formou-se no dia 8.1.1998, pela manhã, e tomou posse no BC no mesmo dia, no turno da tarde. Na faculdade, teve a oportunidade de revisar algumas apostilas para concursos elaboradas por mim. Aílton sonhava em ser auditor, e o destino, como privilegia os persistentes, abriu-lhe as portas do Banco Central, onde ocupou também o cargo de chefe da Auditoria Interna, sendo, atualmente, Contador-geral da Autarquia.
Eu sempre acreditei que carregamos significados em nossos nomes. Em seu étimo, Ailton significa ‘Habitante da Colina’, aquele que convive com o estado de elevação. Seu segundo nome, Aquino, remete a São Tomás de Aquino, doutor da Igreja Católica, grande defensor da Escolástica, método de pensamento que conciliava a fé com a razão. Os dois nomes formam a tríade necessária para o bom combate, elevação e fé, já que Ailton Aquino é dos Santos. Que os Santos que protegem a nossa Bahia de Todos os Santos, Terra da Liberdade, o protejam nesta caminhada.
Que o novel diretor de fiscalização do Banco Central continue a fazer o seu grande trabalho, servindo de exemplo, não para situações raras, de exceção em nossa sociedade tão desigual, mas para que cada vez mais negras e negros assumam postos de poder nas cúpulas das instituições.
Para mim, Ailton é um exemplo digno de muitas e muitas moções e emoções, levando-se em conta o país de sociedade excludente em que vivemos. Como professor e orientador desse grande profissional, só posso desejar que o novel diretor de Fiscalização do Banco Central continue a fazer o seu grande trabalho, servindo de exemplo, repito, não para situações raras, de exceção, mas para que cada vez mais negras e negros façam parte das boas estatísticas e assumam postos de comando. Sempre é tempo de acreditar e de transformar!
Inaldo da Paixão Santos Araújo – Conselheiro do TCE-BA