Vitória: STF decide que compete aos Tribunais de Contas julgar prefeitos ordenadores de despesas

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que compete aos Tribunais de Contas o julgamento das contas de Prefeitos que atuem na qualidade de ordenadores de despesas. O julgamento Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 982/PR, impetrada pela Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon), foi finalizado pelo Plenário Virtual do STF, à meia-noite desta sexta-feira (21), e a decisão dos ministros foi unânime.

O vice-presidente de Relações Jurídico-Institucionais da Atricon, Carlos Neves, considerou que decisão do Supremo representa um marco para o Sistema Tribunais de Contas. “O processo teve um início desafiador, com uma decisão inicial desfavorável que sequer conheceu a ADPF”, lembrou. “No entanto, graças ao trabalho incansável da diretoria da Atricon, à atuação estratégica do Escritório de Advocacia Souza Neto e Tartarini Advogados e ao esforço conjunto dos Tribunais de Contas parceiros, conseguimos reverter o cenário e assegurar essa conquista histórica”.

O presidente da Atricon, Edilson Silva, destacou que a conquista não foi fácil e que a vitória é fruto do trabalho conjunto realizado durante todo o processo. “Demandou articulação, estratégia e um esforço conjunto de toda a Diretoria da Atricon com o apoio especializado da nossa consultoria jurídica”, comentou. “O resultado final demonstra a força e a importância do Sistema Tribunais de Contas na proteção do patrimônio público e na fiscalização da Administração Pública”.

Ex-presidentes

Todo o processo teve início na gestão do conselheiro Valdecir Pascoal, hoje presidente do TCE-PE. Ao tomar conhecimento da decisão, ele se recordou de quando esteve no STF para acompanhar o julgamento da Lei da Ficha Limpa, que, por 6×5, comprometeu a atuação dos Tribunais de Contas na fiscalização dos atos de gestão dos prefeitos. “Foi, sem dúvida, um dos momentos mais difíceis da minha trajetória na Atricon. Apesar da frustração daquela decisão, saímos dali com a convicção de que esse entendimento, um dia, seria revisto”, relembrou. “Esse dia chegou. E hoje é momento de celebrar e reconhecer o esforço incansável de tantos colegas que estiveram conosco nessa jornada, em especial da atual Diretoria da Atricon, que está de parabéns”, comemorou.

O ex-presidente Fábio Nogueira, hoje presidente do TCE-PB, afirmou que durante seus dois anos de mandatos à frente da Atricon, essa sempre foi uma as prioridades dentro do Sistema Tribunais de Contas. “Lutamos incansavelmente para que a tese fixada pelo Supremo, em 2016, fosse melhor esclarecida. Ao longo desses anos, enfrentamos inúmeros desafios, incluindo decisões desfavoráveis em Tribunais de Justiça locais, que não reconheciam nossa competência para atuar em relação aos prefeitos ordenadores de despesa. Mas a nossa luta não foi em vão”, disse. “Hoje, celebramos essa grande conquista, fruto do empenho coletivo de muitos colegas que, ao longo dos anos, mantiveram-se unidos e determinados nessa causa”.

Já o ex-presidente Cezar Miola (TCE-RS) afirmou que a decisão reafirma as competências constitucionais dos Tribunais de Contas em relação à atuação dos prefeitos gestores e quanto à possiblidade da aplicação de sanções e de imputação de débito. “É uma grande conquista, uma verdadeira afirmação do Sistema Tribunais de Contas”, considerou. “Mais que uma vitória do controle externo, é um ganho para a sociedade brasileira, que pode ter a segurança de que as Cortes de Contas continuarão atuando vigilantes em relação ao poder local”.

Como tudo começou?

Em 2016, o STF foi instado a analisar o tema 835, da Repercussão Geral, para definir a questão: Quem tem competência para julgar as contas de Chefes do Executivo que atual como ordenadores de despesas?

STF
“Para fins do art. 1º. I,”g”, da LC 64/90, a apreciação das contas de prefeitos, tanto as de governo quanto as de gestão, será exercida pelas Câmaras Municipais, com o auxílio dos Tribunais de Contas competentes, cujo parecer prévio somente deixará de prevalecer por decisão de 2/3 dos vereadores”.

O que aconteceu depois da decisão do STF no tema 835?

Vários Tribunais de Justiça do país passaram a anular as sanções aplicadas pelos Tribunais de Contas a prefeitos que atuavam como ordenadores de despesas. O problema é que a tese do STF tratava apenas dos efeitos eleitorais, mas algumas decisões judiciais foram além, anulando multas e imputações de débito por danos ao erário.

Ação no STF

A Atricon, então, ajuizou a ADPF 982/PR, buscando reverter a interpretação equivocada adotada por vários TJs que estavam anulando sanções aplicadas pelos TCs a prefeitos que atuavam como ordenadores de despesas.

Em um primeiro momento, o Supremo entendeu que não havia, no caso, decisões judiciais que atendessem ao requisito da controvérsia constitucional relevante, previsto na Lei 9.882/1999. A Atricon recorreu da negativa e iniciou uma agenda estratégica juntos aos ministros para explicar o cenário.

O objetivo das diversas conversas foi ressaltar a importância do tema e reforçar os argumentos apresentados no recurso, demonstrando os impactos da decisão para os TCs e para a administração pública.

A reviravolta

Em agosto de 2024, o Plenário do STF, por maioria, deu provimento ao recurso da Atricon e determinou o seguimento da ADPF 982. O presidente do Supremo, ministros Roberto Barroso, decidiu retirar o processo de pauta, levando a discussão do mérito para uma nova sessão futura.

Vitória

Agora, o STF decidiu por um novo entendimento que estabelece o seguinte:

1) Prefeitos que ordenam despesas têm o dever de prestar contas;
2) Compete aos Tribunais de Contas o jultamento das contas de Prefeitos que atual na qualidade de ordenadores de despesas;
3) A competência dos TCs, quando atestada a irregularidades de contas de gestão prestadas por Prefeitos ordenadores de despesa, se retringe à imputação de débito e à aplicação de sanções fora da esfera eleitoral, independentemente de ratificação pelas Câmaras Municipais.