Asseguração dos Relatórios de Sustentabilidade: A nova fronteira da Auditoria Pública

Inaldo da Paixão Santos Araújo

Independentemente das nossas preferências políticas, principalmente em tempos tão polarizados e trevosos, é forçoso reconhecer que a frase proferida pelo presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, ao discursar para chefes de Estado e de Governo na Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP28), em Dubai, em 1º/12/2023, é emblemática: “Se não deixarmos nossas diferenças de lado, em nome de um bem maior, a vida no planeta estará em perigo e será tarde demais para chorar”.

De fato, a sustentabilidade do nosso planeta é o maior desafio já enfrentado pela humanidade em tempos de Inteligência Artificial.

Contudo essas preocupações não são novas, pois, há muito, o conselheiro aposentado do Tribunal de Santa Catarina, ex-presidente da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas (ATRICON) e do Instituto Rui Barbosa (IRB), Salomão Ribas, afirmava que a geração do presente tem um compromisso ético e moral de deixar um legado sustentável para as próximas gerações.

Esse pensar corrobora o entendimento manifestado pela Comissão Brundtland da Organização das Nações Unidas (ONU), ao estabelecer o objetivo do desenvolvimento sustentável em: “Satisfazer as necessidades do presente sem comprometer a capacidade de as gerações futuras satisfazerem as suas próprias necessidades”. (Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, em 1987).

Assim, cabe aos setores públicos e privados informarem à sociedade, de forma transparente e tempestiva, o impacto de suas ações (de forma positiva e/ou negativa) no desenvolvimento sustentável. Esse informe são os denominados “Relatórios de Sustentabilidade”.

Na nossa área de atuação profissional, é relevante registrar que, apesar de obrigatório para empresas estatais desde 2016 como um dos requisitos de transparência (ex vi art. 8º da Lei Federal n. 13.303/2016), a elaboração de “Relatório de Sustentabilidade” para as demais instituições do setor público ainda não é, infelizmente, uma preocupação. 

No setor privado brasileiro, atentas às questões dos ESG, muitas companhias estão a divulgar os seus Relatórios de Sustentabilidade, cuja forma e modelo estão por ser regulamentados pela CVM e pelo CFC (ex vi Resolução CVM n º 193, de 20/10/2023 e Resolução CFC nº 1.710 de 25/10/2023).

Mas tão importante quanto a elaboração e a divulgação de Relatórios de Sustentabilidade no setor público é a asseguração dessas informações pelos Tribunais de Contas brasileiros. Sim, entre quem informa e o destinatário final (o cidadão) dessas informações, é preciso uma voz independente da razão, que ateste que esses dados são suficientes e adequados.

Não por outra razão, a International Development Initiative (IDI) da International Organization of Supreme Audit Institutions (INTOSAI), em parceria com a ACCA (Association of Chartered Certified Accountants) e com a IFAC (International Federation of Accountants), divulgou o sumário executivo denominado “Preparando para a Divulgação e para a Asseguração de Relatórios de Sustentabilidade”, disponível em https://www.idi.no/our-resources/professional-sais, que apresenta as primeiras ações necessárias para essa nova responsabilidade para o controle externo. E afirma: “qualquer que seja o papel específico de uma entidade do setor público, o valor social é uma preocupação primária em todas as atividades porque, fundamentalmente, cada organização do setor público deve agir de acordo com o interesse público para fornecer governança ou serviços e, portanto, tem um impacto na sociedade e no meio ambiente.”

Também é necessário informar que a Estrutura de Pronunciamentos Profissionais da INTOSAI inclui o GUID 5202 – Desenvolvimento Sustentável: O Papel das Instituições Superiores de Controle, disponível em file:///C:/Users/inaldo/Downloads/GUID-5202-Desarrollo-Sostenible-El-Papel-de-las-Entidades-Fiscalizadoras-Superiores%20(1).pdf. Esse documento foi aprovado pela INTOSAI em 2004 e, com a instituição da Estrutura de Pronunciamentos Profissionais da INTOSAI (IFPP, na sigla em inglês), foi renomeado e considerado como GUID 5202, com alterações editoriais em 2019. Assim, o citado Guia muito pode servir de orientação para iniciar o processo de divulgação e asseguração de “Relatórios de Sustentabilidade” nos países em desenvolvimento.

No Brasil, o Instituto Rui Barbosa (IRB), a Casa do Conhecimento dos Tribunais de Contas, por meio do seu Comitê de Auditoria, em parceria com outros atores interessados, acompanhará essas ações e disponibilizará em português os avanços materializados nessa nova fronteira da auditoria pública, em especial as normas de auditoria sobre como assegurar os Relatórios de Sustentabilidade e implementará os necessários programas de capacitação. Afinal, somos todos responsáveis por garantir um mundo equilibrado e sustentável para todos, pois, como disse o presidente Lula: “Em vez de unir forças, o mundo trava guerras, alimenta divisões e aprofunda a pobreza e as desigualdades”.

Inaldo da Paixão Santos AraújoConselheiro do TCE-BA e vice-presidente de Auditoria do IRB