A Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil – ATRICON vem a público manifestar veemente repúdio às declarações proferidas pelo Governador do Estado do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, durante evento público recentemente realizado naquele Estado, quando proferiu ataques gravíssimos e incompatíveis com o decoro exigido do cargo que ocupa ao Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ) e ao Conselheiro Relator de determinado processo em tramitação naquela Corte de Contas.
Na ocasião, o Governador, em discurso pautado por evidente desconhecimento do ordenamento jurídico pátrio e movido por inconformismo com uma decisão cautelar proferida pelo relator do caso, acusou, sem apresentar qualquer prova, o Conselheiro do TCE-RJ de ter decidido “por politicagem”. Em uma escalada de hostilidade incompatível com a liturgia do cargo, conclamou os parlamentares presentes a criar uma “punição severa aos Conselheiros do Tribunal de Contas”, alegando falsamente que “o único órgão que não tem punição nenhuma é o Tribunal de Contas”.
A escalada autoritária do discurso prosseguiu com insinuações intimidatórias, incluindo ataques pessoais de baixo nível e a utilização de expressões chulas e ofensivas ao Conselheiro e ao próprio Tribunal de Contas, além de sugerir a instalação de CPI para apurar uma decisão juridicamente fundamentada e proferida com amparo no art. 71, IX, da CRFB/88, em clara tentativa de constranger e deslegitimar o exercício independente da jurisdição de contas.
Esse tipo de manifestação, que beira a incitação à violência, é característica de ações orquestradas em ambiente virtual, frequentemente utilizadas para estimular e amplificar ataques contra autoridades públicas, na tentativa de intimidar e descredibilizar aqueles que decidem conforme a Constituição e não se curvam a interesses escusos.
Ao contrário do que propaga o Governador, os membros dos Tribunais de Contas estão, sim, submetidos ao ordenamento jurídico e sujeitos às sanções administrativas, civis e penais quando agem em desconformidade com as competências que lhes foram atribuídas pela Constituição da República. O que não é admissível, e merece absoluto repúdio, é que um Conselheiro, no exercício legítimo da magistratura de contas, seja alvo de ameaças pessoais e campanhas de deslegitimação por decidir segundo seu livre convencimento técnico e jurídico.
O episódio insere-se em um preocupante cenário de recrudescimento dos ataques às instituições da República por parte de grupos políticos que não toleram decisões contrárias aos seus interesses. A ATRICON, na qualidade de entidade representativa dos Tribunais de Contas e de seus membros, tem reiterado, em diversas circunstâncias institucionais, que pensar diferente é legítimo em uma democracia; o que não se admite é que se tente silenciar, constranger ou eliminar o pensamento divergente por meio da intimidação ou da violência, o que configura um verdadeiro atentado ao Estado de Direito.
Importante frisar que o sistema de controle externo possui instrumentos jurídicos próprios para revisão de decisões, por meio dos recursos processuais previstos na legislação vigente. A inconformidade com uma decisão não autoriza a adoção de comportamentos atentatórios à honra pessoal de seus prolatores nem à autonomia institucional do órgão competente. Esse caminho, além de ilegítimo, é antidemocrático.
No caso concreto, a decisão proferida pelo Conselheiro do TCE-RJ foi amparada por robusta análise técnica da unidade de auditoria e pelo parecer do Ministério Público de Contas, identificando graves falhas no edital da licitação deflagrada pela Companhia Estadual de Águas e Esgotos (CEDAE), voltada à construção da Estação de Tratamento de Água do Novo Guandu, com valor estimado em R$ 1,69 bilhão. A fiscalização apontou, entre outros pontos, a ausência das composições analíticas de preços dos chamados “itens especiais”, que somam mais de R$ 861 milhões, o que compromete a transparência e impede a adequada avaliação da economicidade da contratação.
A ATRICON reconhece a importância da obra para a população fluminense, mas reafirma que toda política pública deve ser implementada com responsabilidade e nos estritos termos da lei e da Constituição, para que o interesse público não seja pretexto para lesões ao erário e favorecimentos indevidos — prejuízos que, ao fim e ao cabo, sempre recaem sobre o cidadão menos favorecido.
Diante da gravidade dos ataques proferidos, a ATRICON manifesta sua irrestrita solidariedade ao Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro e a todos os seus membros, reiterando que acompanhará de perto o desenrolar dos fatos e não se furtará a adotar todas as providências legais cabíveis para defender, em todas as instâncias, a autonomia constitucional, a independência técnica e as prerrogativas institucionais dos Tribunais de Contas do Brasil e de seus membros.
Presidência da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon)