Tribunais de Contas, Poder Executivo, organizações sociais e sociedade civil devem definir, juntos, os parâmetros de avaliação das políticas públicas.
Um dos principais desafios atuais dos órgãos de controle externo no Brasil é encontrar parâmetros únicos de avaliação das políticas públicas implementadas em todo o Brasil. Mas isso é possível? Segundo Gabriela Spanghero Lotta, professora da Fundação Getúlio Vargas e da Escola Nacional de Administração Pública, somente as políticas públicas obrigatórias por garantias constitucionais ou exigência de lei podem ter parâmetros únicos de avaliação. O painel foi mediado pelo presidente da Abracom, Thiers Vianna Montebello e contou com palestra do professor Emerson Garbado, da Pontifícia Universidade Católica do Paraná.
Gabriela foi uma das palestrantes do I Congresso Internacional dos Tribunais de Contas, que termina nesta quinta-feira (14), em Foz do Iguaçu (PR). Para ela, as políticas públicas centralizadas devem seguir o modelo de governança multinível, com parâmetros únicos de avaliação. Já as políticas públicas descentralizadas precisam ser avaliadas de acordo com a combinação entre ambiguidade e conflito, observando os diferentes contextos de implementação: administrativo, político, experimental ou simbólico.
Para que se possa definir os parâmetros de avaliação dentro desse contexto, Grabriela apontou as três perguntas que precisam ser respondidas previamente pelos órgãos fiscalizadores e pelos executores das políticas públicas: Qual o tipo de descentralização – total, coordenada ou direta?; Qual seu grau de ambiguidade e conflito?; e Qual são os atores envolvidos na política?
“A combinação das respostas a esses questionamentos deve orientar a definição dos parâmetros de avaliação das políticas públicas no Brasil.“Tarefa fácil? Não. Mas possível”, garante Gabriela Spanghero Lotta.
Existem parâmetros de avaliação que podem ser únicos no Brasil ou as diferenças regionais e a diversidade de políticas públicas exigem sempre parâmetros variados?
Gabriela – Não existe receita pronta. Tem coisas que podem ser padronizadas e outras, não. O avanço dos sistemas de avaliação só vai acontecer quando conseguirmos estabelecer esse equilíbrio, de forma clara e objetiva. Hoje, o exemplo da saúde é o mais legal. O SUS é um ótimo exemplo de governança em multinível, que é um dos temas que os Tribunais de Contas estão discutindo, e um ótimo exemplo de avaliação. Como acontece no SUS? Não dá para a gente comparar taxa de mortalidade infantil dos municípios e cobrar que todos tenham o mesmo índice, se um município tem e outro não tem saneamento básico, por exemplo. Com condições básicas diferentes, você nunca vai produzir o mesmo resultado. Mas dá para cobrar dos municípios uma cobertura de pré-natal igual, por exemplo. Todas as mulheres grávidas do município devem passar pelo pré-natal, independente de quantas foram no período. Esse é um exemplo de indicador que dá para padronizar e cobrar. Mas os parâmetros de avaliação que dependem do contexto não podem ser padronizados. A saída é a gente pensar que tipo de produção é padronizável e pode ter indicador comum e que tipo de produção é muito contextualizada e não cabe indicador comum. Para cada área será uma tomada de decisão diferente.
Quem define isso? Os órgãos de controle externo ou os executores das políticas públicas?
Gabriela – Os dois. Mas aqui existe uma questão de fundo que é o de ter clareza sobre quais são as políticas públicas que precisam ser avaliadas por serem um direito garantido pela Constituição. Aquilo que não é direito constitucional e, portanto, não é obrigação do mandatário fazer por exigência legal, não dá para exigir que o gestor público faça. Não dá para avaliar de forma unificada as políticas específicas de cada gestor. Essas, ficam fora do pacote de parametrização. Nas políticas obrigatórias por garantias constitucionais ou exigências de lei, quem deve definir os parâmetros de avaliação, de forma conjunta, são os órgãos de controle externo, sim, mas junto com o Poder Executivo em todos os seus níveis, que é quem faz as políticas, as organizações sociais, que auxiliam na operacionalização das políticas, e a sociedade civil organizada, como usuária e beneficiária dessas políticas. Sem isso, a gente perde a capacidade de fazer essa conexão entre avaliação e o real. Esse é o desafio da governança multinível. É preciso considerar todos os envolvidos para não evitar as práticas de game: já que tenho que bater meta para passar na avaliação de quem está me fiscalizando e tem poder de me punir, faço qualquer coisa para atingir essa meta, mesmo que isso não tenha efetividade. Tem que envolver todos nessa conversa. O SUS já faz isso com as comissões intergestoras, envolvendo diferentes entes federativos e a sociedade.
Dentro da realidade política, cultural e territorial brasileira, esse caminho é possível?
Gabriela – Esse caminho é super possível. O SUS é um exemplo disso. O SUAS, que é o Sistema Único de Assistência Social, também está construindo o mesmo modelo. Eles resolvem bem essa relação entre todos os atores. Vamos copiar o que já está dando certo como sistema de avaliação.
I CITC – O I Congresso Internacional de Tribunais de Contas do Brasil, cujo tema é “Os Tribunais de Contas Contemporâneos e as Políticas Públicas”, resulta da reunião dos dois maiores eventos do controle externo brasileiro: o XXX Congresso dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon – Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil) e do V Congresso Internacional de Políticas Públicas (IRB – Instituto Rui Barbosa). Ao todo, cerca de 800 pessoas foram inscritas, entre conselheiros e servidores dos 34 tribunais de contas do país e de outras instituições. O evento está sendo realizado de 11 a 14 de novembro, em Foz do Iguaçu (PR).
Fonte: IRB
Fotos: Kiko Sierich