Compete ao Tribunal de Contas julgar as contas do Prefeito que funciona na qualidade de ordenador de despesa
Li o artigo subscrito pelo ilustre Desembargador aposentado e advogado, Dr. Licínio Capinelli Stefani, publicado no Mídia News de 28.05.2012, em que sua excelência discorre sobre a competência do Poder Legislativo para apreciar as contas prestadas anualmente pelos Chefes do Poder Executivo, mesmo quando estes atuem na qualidade de ordenadores de despesas.
É bom destacar que o STF recentemente julgou a ADI 4578, e as ADCs n. 29 e n. 30 movidas contra da Lei Complementar n. 135/10 (Ficha Limpa). O Plenário do STF, por maioria de votos – vencidos os Min. Gimar Mendes (que proferiu as decisões monocráticas citadas – RCL 10.455 e RCL 13292), Dias Toffoli e Celso de Mello (ver informativo n. 655 do STF), declarou a constitucionalidade das alterações proferidas no corpo da Lei Complementar n. 64/90. De acordo com a alínea “g” do art. 1º: São inelegíveis: “os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes, contados a partir da data da decisão, aplicando-se o disposto no inciso II do art. 71 da Constituição Federal, a todos os ordenadores de despesas, sem exclusão de mandatários que houverem agido nesse condição;”.
Logo, na quadra atual, na nova formação, o Plenário do STF registra importante precedente no sentido de reconhecer a competência dos Tribunais de Contas – e não do Poder Legislativo – para julgar as contas do Chefe do Poder Executivo que atua na qualidade de ordenador de despesas (contas de gestão). Bem de ver que isso não retira da Câmara Municipal a competência para julgar as contas prestadas anualmente pelo Chefe do Poder Executivo, precedidas de parecer prévio do Tribunal de Contas (contas de governo).
Nesse contexto, é preciso perceber que o conteúdo das contas de gestão e das contas de governo é distinto: seria improvável pensar que as contas anuais do Presidente da República, dos Governadores de Estado e dos Prefeitos Municipais viessem acompanhadas de notas fiscais, notas de empenho, liquidação de despesas e processos licitatórios.
As contas de governo retratam a situação das finanças da unidade federativa, englobando as contas de todos os poderes, como resultado do exercício financeiro: revelam a execução do orçamento, dos planos de governo, dos programas governamentais, bem como níveis de endividamento, limites de gasto mínimo e máximo previstos para saúde, educação, pessoal.
As contas de gestão, ao seu turno, devem vir acompanhadas de documentos físicos, notas fiscais, empenhos, liquidações, ordenamentos, a fim de demonstrar que o prestador lidou com fidedignidade com o dinheiro público.
Relativamente à esfera federal e à esfera estadual, bem assim aos municípios de grande porte em que os ordenamentos de despesas não são realizados pelo Chefe do Poder Executivo, senão pelas unidades orçamentárias da Administração Direta (ministérios, secretarias) ou Indireta (autarquias, fundações e empresas estatais), a distinção não acarreta maiores dificuldades: as Contas do Chefe do Executivo submetem-se ao regime de parecer prévio e julgamento pelo Legislativo (art. 71, I c/c art. 49, IX c/c art. 75 da Constituição), e os atos dos ordenadores são julgados pelo Tribunal de Contas (art. 71, II).
Contudo, se o Chefe do Executivo assume, além da função política de executor do orçamento, também a função de ordenador de despesas, submete-se a duplo julgamento. Tal conclusão pode ser extraída do § 2º do art. 31 da Constituição c/c o art. 71, II da Constituição (aplicável aos TCE´s e TCMs por força do art. 75).
Por fim, cabe mencionar a incoerência do entendimento, ainda majoritário no âmbito do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a propósito da inelegibilidade decorrente do julgamento de contas dos Prefeitos Municipais. Entende a Corte Eleitoral que a rejeição de suas contas, geradora de inelegibilidade, é exclusivamente a da Câmara Municipal. Por outro lado, entende o TSE que as contas dos Prefeitos relativas a convênios federais, quando rejeitadas pelo TCU, geram a inelegibilidade (?).
Aguardem, pois, o julgamento das Reclamações mencionadas (RCL 10.455 e RCL 13.292) e também da RCL 10.456 pelo Plenário do STF, processos estes em que a ATRICON – Associação dos Tribunais de Contas do Brasil solicitou ingresso como amicus curiae.
Pode ser que a velha tese, a do RE 132.747, rel. Min. Marco Aurélio, não mais se sustente.