Existe uma estreita relação entre os desafios que a administração pública enfrenta com a qualidade e capacidade dos nossos dirigentes, aqueles que estão no topo do nível decisório. Ela não consegue responder aos anseios e às demandas da sociedade e, eles, por sua vez, nem sempre estão preparados para o desempenho da função pública. Credito parte dessa culpa aos nossos partidos políticos e às nossas escolas. É muito rara a busca por formação para ocupação de cargos eletivos no Parlamento ou no Executivo.
Compartilho da opinião daqueles que acham que, se necessário, as nossas escolas deveriam diminuir um pouco a carga horária em algumas disciplinas e reservar horas e horas para a formação em cidadania. Grande parte dos alunos de hoje deixa o ensino médio sem conhecer o Estado, não sabe nada sobre democracia ou república, não tem noções corretas sobre direitos, deveres, obrigações. São consumidores vorazes de bens e serviços; mas, em geral, analfabetos funcionais. Formamos indivíduos que reclamam de tudo e participam de nada.
Esse triste cenário também pode ser encontrado em nossas universidades. Tenho dito que já encontrei médicos que sabem realizar as mais delicadas operações e conseguem oferecer diagnósticos precisos de doenças, ou engenheiros que constroem prédios de invulgar qualidade, ou professores que dominam como poucos as regras da língua portuguesa, mas ficam como que alienígenas quando instados a falar sobre como funciona o Governo. Confundem os papéis, acham que tudo é a mesma coisa.
A situação não melhora no partido político. O filiado resolve ser candidato a vereador, prefeito, deputado, enfim, postula um cargo político e a agremiação partidária não lhe explica nada, não oferece nem um cursinho de fim de semana sobre o que é uma Câmara Municipal, como se elaboram as leis, qual o papel de um vereador, seu poder, seu potencial. No geral, acabamos tendo representantes que se portam como pedintes de soluções para prefeitos, ignorando que, na hora de votar as leis orçamentárias, poderiam definir o futuro da cidade.
O anacrônico é que a maioria dos ocupantes de cargos de direção superior, começando pelos prefeitos e vereadores, vem da iniciativa privada, onde se processa um nível decisório totalmente diferenciado. No privado, se faz tudo o que não contraria a lei. No público, só se faz o que determina a lei. Ainda existe a complexidade na cadeia de comando, com três Poderes, três esferas. E a autonomia do dirigente é limitada. Ele não tem a discricionariedade que se acostumou a ter em sua vida privada. Nela, ele tudo pode.
O indivíduo é treinado, desde o berço, para valorizar o interesse privado em detrimento ao do público. Quer, em consequência, reproduzir isso na função pública e se dá mal. Nos assuntos da coletividade isso não funciona assim.
Com esse grave problema de formação para ocupar cargos diretivos é natural que as melhores intenções se encaminhem para o brejo, dada à falta de cultura de planejamento. Sobra gestão intuitiva, que às vezes até acerta em razão da sensibilidade de alguns, mas fracassa pela falta de pilares de sustentação mais firmes. Os planos estratégicos, quando existem, padecem com a falta de rigor no acompanhamento. Existe ainda outro velho problema: candidatos fazendo promessas de campanhas com a cabeça no mundo da lua, enquanto que os pés deveriam estar assentados no orçamento real.
A solução para esse problema é educação para a cidadania. Temos que investir em nossas futuras gerações para que tenhamos dirigentes melhores, mais preparados, para conseguir líderes que falem a mesma língua dos liderados.
Posso estar errado na generalização, mas prefiro alguém que não sabe o nome correto das capitais dos países, precisa recorrer ao dicionário para acertar um vernáculo, não sabe todas as operações da matemática, ainda enfrenta problemas com a tabela periódica, mas sabe com consistência sobre direitos, obrigações e, acima de tudo, sobre deveres. Estes saberão buscar as respostas que faltam. Serão cidadãos.
* Antonio Joaquim é conselheiro e ouvidor-geral do Tribunal de Contas de Mato Grosso.