A discussão sobre a autossustentabilidade dos 295 municípios catarinenses, objeto do Seminário Federalismo e o Papel dos Municípios, foi motivada por estudo realizado pela Diretoria de Atividades Especiais (DAE) do Tribunal de Contas de Santa Catarina (TCE/SC). Autuado agora em 2019 — a relatoria do processo é do conselheiro substituto Cleber Muniz Gavi —, o estudo avaliou a viabilidade econômica e financeira das cidades catarinenses, de 2013 a 2015, para estimar o custo da manutenção da máquina pública pelo Estado — com estrutura dos executivos e legislativos, pessoal, por exemplo —, em decorrência das emancipações posteriores à Constituição Federal de 1988, apenas sob a ótica da despesa.
A área técnica apontou, entre outras constatações, a fragilidade das receitas próprias dos municípios, especialmente dos 105 que têm menos de 5 mil habitantes. Na opinião do TCE/SC, todos os contribuintes são parte interessada, uma vez que a criação ou manutenção de cidades, que sejam, comprovadamente, consideradas inviáveis economicamente, ocasiona prejuízo a toda a sociedade do Estado, pela injustificada sobrecarga no orçamento público estadual.
Ao abordar o assunto durante o debate que integrou a programação do Seminário, a diretora da DAE, Monique Portella, salientou que o foco do estudo não foi apontar os municípios inviáveis economicamente e sugerir a extinção deles, mas estimular a discussão com a sociedade. “O Tribunal de Contas iniciou o processo, dando sua contribuição com base em sua expertiseeconômico e financeira”, destacou, reiterando que o TCE/SC não tem o embasamento para apresentar sugestão quanto à extinção ou fusão de municipalidades.
Na oportunidade, a auditora fiscal de controle externo do TCE/SC citou os principais pontos do estudo. Informou que um deles tem como base as 105 cidades com menos de 5 mil habitantes — representando 35% das existentes no Estado. Segundo ela, a área técnica concluiu que esses municípios possuem uma “despesa per capita extremamente alta e uma receita própria extremamente baixa, não chegando a 2% de sua receita total em alguns casos, o que nos dá indícios de inviabilidade do ponto de vista econômico-financeiro”. “São indícios, pois não analisamos as especificidades de todos os municípios, como os aspectos demográficos, culturais, históricos e de identidade”, complementou.
Outro ponto está relacionado com o Fundo de Participação dos Municípios (FPM) que, no entendimento técnico, possui viés emancipacionista, pois os critérios de repasse privilegiam os pequenos municípios. Para exemplificar a constatação da DAE, a diretora informou que Lages recebia, inicialmente, 4% do FPM e, após a emancipação de Capão Alto, Bocaina do Sul e Painel, o mesmo espaço geográfico constituído por quatro cidades passou a receber o somatório de 5,6%. “Assim, outros municípios passaram a receber menos, já que o percentual total do Estado é fixo”, emendou.
A simulação realizada para calcular o custo emancipatório também foi mencionada. Conforme ensaio feito pela diretoria técnica, caso as emancipações após a Constituição Federal de 1988 não tivessem ocorrido, a economia para o Estado ao ano seria de R$ 1,1 bilhão. “Importante ressaltar que a regressão já considera os ganhos de escala e todo o pareamento necessário para que se tenha um número mais realista possível”, enfatizou.
Na opinião da auditora fiscal Monique, o momento é oportuno já que o assunto está em discussão no Congresso Nacional, diante de proposta para criação de novos critérios para futuras emancipações ou fusões. “Cabe a cada um de nós, enquanto partícipes da sociedade civil, contribuir com a discussão e o aprimoramento do projeto, de forma a chegarmos num critério ideal, por meio do qual possamos ter municípios mais saudáveis em todos os pontos de vista”.
Durante o Seminário, o estudo do TCE/SC foi debatido pelo conselheiro emérito da Corte catarinense e presidente do Instituto de Direito Administrativo de Santa Catarina, Salomão Ribas Junior, pelo futuro procurador-geral do Ministério Público do Estado Fernando Comin e pelo presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina, professor Augusto César Zeferino, sob a coordenação da procuradora-geral do Ministério Público de Contas, Cibelly Farias. “Este evento busca trazer à tona a discussão sobre a sustentabilidade dos municípios e a forma com que eles podem executar as políticas públicas, com base nesse instrumento [o estudo do TCE/SC] importante para toda sociedade e para outros tribunais de contas”, reforçou a procuradora Cibelly.
Em sua manifestação, o conselheiro emérito Salomão Ribas Junior, defendeu um estudo mais aprofundado. Para ele, o grande diferencial do federalismo brasileiro está relacionado à simetria do modelo da União. “Essa ideia de engessar os municípios é um absurdo”, afirmou, explicando que nem todas as cidades têm condições de sustentar essa estrutura composta por Executivos e Legislativos. Na mesma direção foram as palavras de Fernando Comin. “Temos que deixar de lado alguns estigmas construídos e a partir dessa base histórica, proporcionada por este estudo, discutir a República Federativa do Brasil”, asseverou. “Devemos aprimorar as formas de controle dos critérios de emancipação”, acrescentou o integrante do MPSC.
Dados do Programa Saúde Fiscal, desenvolvido pelo Ministério Público do Estado para encontrar formas de fortalecer o sistema de arrecadação dos municípios, citados por Comin, apontam que 56 cidades são incapazes de sustentar a estrutura dos Legislativos com recursos próprios. “Sobrevivem praticamente por conta das transferências do FPM”, disse. Ele comentou que desde a instituição do programa, em 2012, 76 municípios já tiveram incremento na arrecadação de tributos próprios.
O desenvolvimento do estudo também foi enaltecido pelo professor Augusto Zeferino, ao considerar como uma contribuição para o aprimoramento dos “aspectos da sanidade dos defeitos dos municípios”. Durante sua participação, ele fez um retrospecto da criação dos municípios, cujo salto ocorreu especialmente a partir da década de 1990. Segundo Comin, a fragilidade desses municípios enquanto entes federativos geram duas consequências primárias: a incapacidade de gerir políticas públicas que atendam à população e a suscetibilidade a práticas ilícitas da moralidade administrativa.
O Seminário Federalismo e o Papel dos Municípios foi promovido pelo Tribunal de Contas do Estado e a Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Santa Catarina (OAB/SC), com apoio da Federação Catarinense dos Municípios (Fecam). Cerca de 170 pessoas participaram, entre agentes políticos e públicos, estudantes, professores e advogados.
Saiba mais: Currículos
Monique Portella
Diretora de Atividades Especiais do TCE/SC |
Formada em Administração de Empresas pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Especialista em Gestão de Projetos e Gestão de Pessoas. Ingressou no TCE/SC em 2010, como auditoria fiscal de controle externo. Atuou como assessora da Presidência e assessora de Gabinete e, desde 2017, é diretora de Atividades Especiais (DAE). |
Salomão Ribas Junior
Conselheiro Emérito do TCE/SC |
Graduado em Direito pela Universidade Federal Fluminense, foi bancário, radialista e jornalista. Doutor pela Universidade de Salamanca, Espanha. Foi secretário de Estado da Educação, da Casa Civil, da Imprensa, da Cultura, Esporte e Turismo, e da Saúde e Promoção Social. Conselheiro emérito do Tribunal de Contas de Santa Catarina. Presidiu a Academia Catarinense de Letras e do Instituto de Direito Administrativo de Santa Catarina. |
Augusto César Zeferino
Presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina |
Ph.D. em Geografia (Planejamento Urbano e Regional) pela University of Wisconsin-Milwaukee, USA (1987). Professor titular da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Atualmente presta consultoria na área do meio ambiente para instituições públicas e privadas. |
Fernando Comin
Futuro procurador de Justiça do MPSC |
Mestre em Ciências Jurídico-Políticas pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Especialista em Ciências Jurídico-Políticas pela mesma faculdade. Futuro Procurador-Geral de Justiça do Ministério Público de Santa Catarina. |
Crédito das fotos: Douglas Santos (ACOM-TCE/SC).
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