A executoriedade da Lei Complementar 123/2006, a Lei da Micro e Pequena Empresa, é de amplo interesse público e social e os Tribunais de Contas têm a obrigação de contribuir para a aplicação em nível nacional dessa legislação. Para tanto, a Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon) articula, em parceria com o Sebrae e o Instituto Rui Babosa (IRB), evento simultâneo em todos os Estados no dia 13 de março de 2013, objetivando chamar a atenção de prefeitos e presidentes de Câmaras de Vereadores para a importância da LC 123/2006.
Esse tema foi abordado em ampla entrevista concedida pelo presidente da Atricon, conselheiro Antonio Joaquim, ao jornal paulista Diário Comércio, Industria & Serviços (DCI), no começo deste mês. Leia a íntegra da reportagem abaixo:
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Democracia e Poder Público exigem controle
A democracia e o Poder Público não existem sem controle, ensina o presidente da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon), conselheiro Antônio Joaquim, empenhado em uma nova missão: sensibilizar, capacitar, e depois cobrar, dos prefeitos que tomam posse agora em janeiro a aplicação da Lei Geral da Micro e Pequena Empresa nos municípios, que prevê uma série de vantagens ao segmento, como preferência nas compras governamentais.
“O dever de prestação de contas é indiscutível. Todo gestor deve ter três pontos básicos como conceito: primeiro é o dever da boa gestão, o segundo é o dever da transparência e o terceiro é o dever de prestar contas. Não tem como ser um gestor público e não prestar contas”, afirmou Antônio Joaquim, em entrevista exclusiva ao DCI. Ele apontou que menos de 20% das cerca de 5.500 prefeituras existentes no País já efetivaram a legislação dos pequenos negócios.
Confira principais trechos da entrevista:
DCI: O que motivou a Atricon a agir para efetivar a Lei Geral da Micro e Pequena Empresa ?
Antônio Joaquim: Principalmente o interesse público, o interesse da sociedade, do cidadão. É uma lei espetacular que já tem vigência há seis anos, que tem a capacidade de gerar emprego, de gerar renda em todos os rincões do Brasil. Há, porém, uma realidade muito perversa porque ao longo desses anos não está em execução nem 20% dos municípios brasileiros. Ou seja, o que é necessário é dar executoriedade a essa lei por todas as coisas boas que ela propicia. Nós nos dispusemos a mobilizar todos os tribunais do Brasil. A gente já tinha decidido que seria no dia 13 de março de 2013, às 13h.
DCI: A data parece um número um tanto cabalístico?
AJ: É esta a intenção, dar dimensão simbólica a isso. Nós vamos, primeiro, capacitar, porque há um entendimento consensual de que a lei não é executada por ignorância, por desinformação. A maioria dos gestores dos municípios tem medo de agir em desacordo com a Lei 8.666 [Lei das Licitações]. Por exemplo, a lei prevê que, em licitações cujos resultados apresentam valores até 10% de diferença, tem obrigatoriamente de dar preferência ao microempresário da cidade. É isso que temos de explicar, que tem de capacitar e orientar o gestor de que ele pode fazer diferente da 8.666 acompanhando a Lei Complementar 123/2006 [a Lei Geral da Micro e Pequena Empresa] e muitas vezes ele tem o dever de fazer. No primeiro momento, nós teremos esse encontro [do dia 13/03/2013] com os prefeitos eleitos, presidentes de câmaras municipais e vereadores. Todos serão convidados, para que a gente possa fazer essa capacitação e em um mutirão nacional com todos os estados brasileiros e com todos os tribunais. O segundo momento vai ser de avaliação da execução da Lei.
DCI: Quando se fala em tribunais de contas, há um certo receio por parte dos administradores públicos e das empresas que temem ser punidos porque deixaram de atender alguma coisa da legislação. O que a Atricom pode fazer para mudar essa imagem das instituições de contas?
AJ: É uma imagem injusta, pois a democracia e o Poder Público não existem sem controle. A fiscalização deve ser encarada com muita naturalidade, pois isso vem do processo democrático. Sem controle, não tem democracia. A prestação de contas não é ao tribunal, é feita à sociedade e ao cidadão. O tribunal é um mero receptador dessas informações disponibilizadas para a população. Partimos da seguinte premissa: o dinheiro é público. O dever de prestação de contas é indiscutível. Todo gestor deve ter três pontos básicos como conceito: primeiro é o dever da boa gestão, o segundo é o dever da transparência e o terceiro é o dever de prestar contas. Não tem como ser um gestor público e não prestar contas. É exatamente nesse estímulo de modernização, capacitação, tecnologia e informação que estamos investindo, para evitar o máximo o erro, o desvio, a corrupção, por meio de um processo gigantesco de pedagogia de informação. Agora, nós não podemos abrir mão do nosso dever institucional de fiscalizar e, se for o caso, de punir. No caso da Lei da Micro e Pequena Empresa, está claro que o problema é de ordem de pura informação mesmo.
DCI: Que tipo de capacitação será feita? Será feita junto às prefeituras?
AJ: Esse encontro com todos os prefeitos já é o início da capacitação.
DCI: É um mutirão nacional, é isso?
AJ: Todos os estados, no mesmo dia, na mesma hora, com todos os prefeitos eleitos já empossados e todos os vereadores que quiserem participar. Vai haver um painel chamado Momento Sustentável Local, onde vão acontecer palestras explicando as peculiaridades da lei e capacitando o secretário do município, ou o prefeito e vereador no sentido de tomar todas as providências para dar execução à lei, mostrando como se faz isso, dando conhecimento com clareza do conteúdo da legislação para propiciar as contas governamentais focadas nas micro e pequenas empresas dos municípios.
DCI: Sempre que há divulgação por parte da Controladoria Geral da União das prefeituras que tiveram suas contas rejeitadas, há reclamações de que as prefeituras são perseguidas pelos órgãos de fiscalização e controle. Há um excesso de rigor por parte dos tribunais? Ou é mesmo uma ineficiência das prefeituras?
AJ: O gestor não tem de reclamar do controle e da fiscalização. Ele tem de cumprir o seu dever de fazer uma boa gestão, de ser transparente e de prestar contas. Se há algum tipo de injustiça em algum julgamento, isso é uma exceção. Eu acredito que os tribunais têm sido até mesmo razoáveis nos seus julgamentos, até por entender das deficiências que existem na gestão pública. Nós temos de reconhecer que a gestão pública brasileira ainda está aquém daquele parâmetro necessário da qualidade de gestão. Ainda temos muitos problemas de conceitos antigos, de fazer as coisas sem foco e sem planejamento. A questão fundamental é a falta de planejamento, o gestor não tem essa cultura de planejar e isso é indispensável para uma gestão de qualidade. Os tribunais do Brasil, atualmente, estão caminhando para praticar uma auditoria de qualidade, isso significa uma auditoria de avaliação não só da legalidade da prática da gestão, mas dos resultados das políticas públicas, e isso é o que está melhorando a vida das pessoas. Nós estamos trabalhando nesse sentido de fazer a auditoria concomitante na hora que está ocorrendo a gestão, para que naquele momento evitar que ocorra o erro.
DCI: Por que a Atricon defende a criação de um conselho dos tribunais de contas nos moldes do que existe com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em relação ao Poder Judiciário?
AJ: Há o CNJ e o Conselho Nacional do Ministério Público. Eu considero um prejuízo inestimável para o sistema de controle externo nós não termos até hoje um conselho com as mesmas características do CNJ. Não é nem o de corrigir e penalizar os conselheiros, que também é função do Conselho Nacional, mas como órgão de planejamento estratégico de todos os tribunais de contas do Brasil, do sistema de controle externo de contas. Um órgão estatal com autoridade para definir, por exemplo, que em tantos anos todos os tribunais do Brasil façam auditorias de resultados de políticas públicas e operacionais, cumpram prazos rigorosos de julgamento e também façam isso que estamos discutindo que é a auditoria concomitante. Nós temos hoje mais de duas dezenas de tribunais no Brasil que fazem isso, mas não são todos. Atricom tem feito todos os esforços no sentido de que todos sigam esse patamar, mas a Atricom é uma associação que só tem representação nominal, não é uma instituição que tem a autoridade de dar a ordem para que a ação seja cumprida. Então, o conselho teria esse papel importantíssimo de fazer esse trabalho como entidade estatal, garantindo e exigindo o cumprimento de metas. E, no segundo plano, isso teria também a função correcional de conduta.
ABNOR GONDIM
Jornalista e Consultor