Marcas do que se foi

2021 foi um paradoxo. Parafraseando a canção de Roberto “Você em minha vida”, pode-se dizer que ele foi o pior e o melhor ano da pandemia. Para 390 mil mortos pela Covid-19, seus familiares e amigos, foi anoitecer, tempestade, dor, lágrimas de adeus. Também foi um deserto para quem perdeu o emprego e outros milhões que ingressaram na pobreza. Para os sobreviventes foi um novo amanhecer cheio de luz, com sorrisos nas chegadas.

Mas, afora a fortuna de estar vivo, cumpre destacar, entre tantos desassossegos, outras marcas de 2021 que nos permitem manter acesa a chama de um futuro menos tormentoso.

A primeira foi o sucesso da VACINA. O percentual de 70% de brasileiros vacinados é garantia de maior proteção para novas variantes e alento para a economia. Devemos esse feito aos cientistas, aos profissionais e empreendedores da saúde, ao SUS e à adesão em massa dos cidadãos. Êxito que ganha nuances épicas, se considerarmos os inúmeros estorvos enfrentados: a desinformação e a postura anticiência (negacionista) de autoridades, retratada na aposta em remédios sem eficácia, na demora para compra das vacinas, na tentativa de veto à sua aplicação em crianças e ao passaporte sanitário, este último em clara deturpação do conceito de liberdade.

Outra marca foi a relativa RESILIÊNCIA DAS INSTITUIÇÕES ante as investidas autoritárias. Democracia não se faz só com eleições. Sem instituições sólidas – Judiciário, Legislativo, Controles, Imprensa e outros segmentos da sociedade – ela erode e morre. Em “Por Que as Nações Fracassam”, Acemoglu e Robinson comprovam o valor das Instituições e do Estado de Direito para o progresso. A legislação extraordinária aprovada pelo Congresso e a jurisprudência de crise construída pelo STF e pelos Tribunais de Contas, por exemplo, garantindo, na execução do orçamento da pandemia, a prevalência do direito à saúde (vida) em relação a determinadas regras fiscais, foi fundamental. Destaque, ainda, para a Justiça Eleitoral, que fulminou as fake news sobre a segurança das urnas; para as revelações tenebrosas propiciadas pela CPI da Covid; para o Consórcio da Imprensa, que trouxe credibilidade aos números da pandemia; e para a postura dos servidores da Anvisa, provando que estabilidade não é privilégio.

O Réveillon, há poucos dias, marcou o início de um novo ciclo. A palavra vem do latim “Velare” e significa “Não dormir”. O ano de 2022 exigirá ainda mais vigília em defesa da vida, da democracia e das instituições. Para os sonhos que vamos ter é preciso olhar (e agir) para todos os lados… e para cima.

Valdecir Pascoal – Conselheiro do TCE