O Brasil é dos brasileiros

João Antonio

Aqui no Brasil, não há espaço para o individualismo competitivo e excludente que caracteriza a cultura do “salve-se quem puder” tão presente no modelo americano”.

Revisitar o passado é sempre um exercício necessário. Ao reconhecermos nossas pegadas tortuosas, podemos transformá-las em referências sólidas para que os próximos passos sigam por caminhos menos árduos, mais conscientes e com pontos de chegada bem definidos. O Brasil e a América Latina conhecem profundamente o significado do verbo subjugar: ser submetido pela força, pela ameaça ou pela astúcia. Fomos colonizados por séculos e, mesmo após as independências formais, ainda lutamos para nos libertar plenamente do jugo dos colonizadores — visível, hoje, sob outras formas de dominação.

O Iluminismo, o surgimento dos Estados Nacionais e o constitucionalismo moldaram a atual forma de organização política mundial. Esse novo arranjo institucional permitiu não apenas preservar as conquistas civilizatórias, mas também ampliá-las, colocando na ordem do dia a universalização dos direitos fundamentais. Não foi um processo isento de solavancos, conturbações ou guerras. Ainda assim, tratou-se de uma marcha progressiva — ora acelerada, ora mais lenta — mas sempre orientada pelo ideal de avanço civilizatório.

Esses avanços, no entanto, chegaram com considerável atraso à América Latina. No Brasil, por exemplo, a independência foi proclamada apenas em 7 de setembro de 1822 — e a abolição formal da escravidão só veio em 13 de maio de 1888. Digo formalmente porque, embora as correntes tenham sido rompidas, a cultura racista permanece arraigada em nossa sociedade, manifestando-se de múltiplas formas até hoje.

Se é verdade que conseguimos nos libertar do colonialismo europeu, também é preciso reconhecer que, após a Primeira Guerra Mundial — e, sobretudo, com a vitória dos Aliados na Segunda Guerra e a ascensão dos Estados Unidos como potência hegemônica — muitos países, inclusive o Brasil, passaram a orbitar a influência geopolítica norte-americana. A América Latina, em especial, foi durante décadas subordinada aos interesses militares, econômicos e ideológicos dos Estados Unidos, o que impôs novos limites à nossa soberania.

Um fato, porém, é inegável: o Brasil é detentor de imensas riquezas naturais, especialmente minerais. Ouro, manganês, bauxita, nióbio e uma variedade de outros recursos estratégicos conferem ao país um papel relevante no cenário global. Recentemente, o Brasil passou a produzir, em escala comercial, elementos de terras raras utilizados em tecnologias de ponta — reforçando ainda mais sua importância na nova geopolítica da transição energética e digital.

Querem Manter o Brasil Colonizado

Como o leitor pôde perceber, o que sempre moveu as cabeças imperialistas foram — e continuam sendo — os interesses econômicos. Hoje, o atual presidente Donald Trump, com sua retórica autoritária, tenta disfarçar seus reais objetivos com uma roupagem ideológica. Por meio da imposição de tarifas e pressões comerciais, busca forçar o Brasil a ceder à exploração de suas riquezas naturais, em benefício de interesses estrangeiros. O mais alarmante é que, internamente, há brasileiros alinhados à ideologia trumpista que, enquanto bradam “liberdade! liberdade! abre as asas sobre nós”, ignoram que, na prática, estão defendendo a recolonização do país por forças externas.

A verdade é que a democracia brasileira está de pé. Temos uma Constituição em vigor, instituições que funcionam, eleições livres, liberdade de imprensa e mecanismos de controle institucional e social cada vez mais consolidados. Não se trata, portanto, de “salvar” o Brasil de um regime autoritário — como alguns querem fazer crer — mas sim de submetê-lo, novamente, a uma lógica de dependência econômica. Assim como no passado levaram nosso ouro, hoje desejam continuar explorando nossas riquezas naturais, sem oferecer ao país contrapartidas justas. É disso que se trata. O Brasil não pode — e não deve — ficar de joelhos.

A máscara dos que bradavam “Brasil acima de tudo” derreteu. Agora está claro: aqueles que, aqui dentro, usavam com orgulho o boné com a frase “Make America Great Again” sabiam exatamente o que estavam fazendo. Em outras palavras, estão convencidos de que um Brasil submisso aos interesses econômicos e à ideologia trumpista é o melhor cenário para uma elite capitalista que se beneficia da dependência. É assim que se comportam — aqui e lá fora.

A hora exige união nacional, afirmação de nossa soberania e valorização do espírito solidário que pulsa na imensa maioria do povo brasileiro. Por aqui, não há espaço para o individualismo competitivo e excludente que caracteriza a cultura do “salve-se quem puder” tão presente no modelo americano. O Brasil seguirá trilhando seu próprio caminho — pautado na paz, na cooperação entre os povos e, sobretudo, na convicção de que nossas riquezas devem servir para melhorar a vida da nossa gente. Porque o Brasil é dos brasileiros.

João Antonio é conselheiro do TCM-SP e vice-presidente da Atricon