A cada momento em Brasília surgem propostas de emendas constitucionais visando alterar as regras de funcionamento dos Tribunais de Contas, sua competência, forma de composição etc. Há quem pregue simplesmente a extinção das Cortes de Contas; há quem diga que são inúteis e perdulárias; e há, principalmente, os que, sem ter informações sobre o assunto, abraçam juízos preconceituosos nesse ou naquele sentido. Recentemente, um destacado senador sulista afirmou que o controle externo custava muito caro ao país e citou como exemplo o orçamento do TC de seu estado natal.
Creio que o debate é importante e todas as propostas devem ser examinadas com respeito. Entretanto, para que o debate seja sério e produtivo, é necessário esclarecer e informar corretamente a opinião pública sobre as características das atividades do controle externo exercido pelos Tribunais de Contas.
Primeiramente, sublinhe-se que o controle é tão essencial para a gestão como o planejamento. Todas as grandes organizações privadas, como a Toyota, Microsoft, Bradesco e outras, possuem controladorias internas que monitoram atividades, previnem problemas e geram resultados econômicos significativos.
Na área pública, o controle é ainda mais importante, pois é inerente ao regime democrático. Somente nas ditaduras, os maiorais não precisam prestar contas. Na democracia, os dirigentes eleitos são gestores temporários de um patrimônio que não lhes pertence, mas a uma coletividade, e por isso têm o dever de geri-lo segundo os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Logo, têm que prestar contas à sociedade, por intermédio de um órgão tecnicamente qualificado para o exercício da fiscalização orçamentária, contábil, financeira, patrimonial e operacional. No Brasil, seguindo a tradição latina da Itália, França, Espanha e Portugal, esse órgão técnico tem o formato de Tribunal de Contas.
Assim, ao contrário da crítica ligeira de que os TCs são uma invenção brasileira para abrigar o ócio luxuoso de políticos decadentes, as Cortes de Contas que existem em mais de 50 países e na União Europeia são organismos essenciais na composição de um Estado Democrático. É certo que na França e na Itália a maioria dos magistrados tem origem técnica, o que ainda não ocorre aqui, apesar do avanço registrado na Constituição de 1988.
Outra crítica improcedente é associar a efetividade de um Tribunal de Contas ao número de gestores condenados por irregularidades ou ao volume de multas aplicadas. Isso porque, para o controle o mais importante é a prevenção, ou seja, evitar que seja praticado o ato de gestão ilegal, ilegítimo ou antieconômico. A prevenção se concretiza mediante múltiplas ações, desde a expedição de medidas cautelares até atividades de capacitação de gestores e servidores, e ainda a criação de ferramentas digitais para a participação da sociedade, disponibilizando em tempo real informações para os cidadãos e os Conselhos de políticas públicas acerca da execução da receita e da despesa das unidades fiscalizadas.
Sem dúvida, é importante julgar como irregulares as contas de um gestor que afrontou as normas legais e as determinações dos TCs. Também é indispensável condenar à restituição dos valores desviados os responsáveis por desperdícios, sobrepreços ou outros prejuízos ao erário. Tudo isso tem sido feito. Porém, não tenho dúvida que o maior benefício do controle externo é de difícil mensuração: é o efeito do exemplo, da orientação, da prevenção. O que é caro não é o controle, mas o descontrole.
A realidade é que quando o controle funciona, incomoda, especialmente aqueles acostumados ao passado, a um controle formal, ritualístico e burocrático, que sempre dizia amém aos poderosos. Para esses, quanto menos técnica e independente for a atuação das Cortes de Contas, melhor. Por isso os TCs têm sido tão criticados: estão vivos, evoluindo e incomodando.
* Luiz Henrique Lima é Conselheiro Substituto do TCE-MT.