Mário Quintana é um dos maiores nomes da literatura brasileira. Recebeu o Prêmio Machado de Assis (1980) e o Jabuti (1981). Nasceu em Alegrete-RS, trabalhou como jornalista, faleceu em 1994, aos 87 anos. Escreveu sobre o Tempo, mas não teve tempo de chegar aos 100.
Ano passado, a Previdência comemorou seu centenário. Em 24 de janeiro de 2024, comemora seus 101 anos. Foi criada a partir do Decreto nº 4.682, conhecido como Lei Eloy Chaves, em homenagem ao deputado federal que idealizou a Caixa de Aposentadorias e Pensões para os trabalhadores das companhias ferroviárias.
Aquele foi o primeiro passo em prol da garantia de um sistema público de aposentadorias, pensões, benefícios e auxílios, aperfeiçoado com a CLT e expandido com a Constituição de 1988, que colocou a previdência junto com a saúde e a assistência social, formando o tripé do sistema da Seguridade Social, grande marco de proteção dos trabalhadores.
Após 1988, foram expandidos os Regimes Próprios de Previdência Social (RGPS), seja em relação ao universo de servidores abrangidos pelos regimes já existentes, seja pelo surgimento de novos regimes nos Municípios. Cerca de 60% dos regimes próprios da Previdência foram criados na década de 1990.
Além de diversos tipos de aposentadoria e do Benefício de Prestação Continuada (BPC) pago a idosos com mais de 65 anos e a pessoas com deficiência; a Previdência Social garante pensões por morte, talidomida, hanseníase e síndrome congênita do zika vírus; auxílios acidente, doença e reclusão, seguro defeso do pescador artesanal, salário-maternidade e salário-família.
A Previdência é uma gigante, sendo responsável pelo pagamento de mais de 23 milhões de aposentadorias – apenas no Regime Geral, com um desembolso anual superior a 480 bilhões de reais. Os números mostram o quanto ela é um mecanismo de distribuição de renda, aquecimento econômico e proteção contra riscos sociais. O desafio do controle externo da Previdência é proporcional a sua dimensão.
Além de julgar a legalidade das concessões iniciais de aposentadorias, reformas e pensões, ressalvadas as melhorias posteriores, compete aos Tribunais de Contas a fiscalização das contas da Previdência.
Nessa seara e considerando a relevância dos indicadores para avaliar a sustentabilidade e os riscos de liquidez e solvência do sistema de Previdência, o Tribunal de Contas da União tem realizado auditorias nas demonstrações financeiras do Fundo do Regime Geral de Previdência Social e nas projeções previdenciárias para dar segurança sobre a confiabilidade dos números.
Na ótica da conformidade de pagamentos de benefícios do RGPS e do BPC, o TCU tem realizado fiscalizações anuais e contínuas para detectar, por meio da análise intensiva de dados, pagamentos indevidos e outras distorções no atendimento aos segurados, seja no tempo de concessão dos benefícios, seja na espera das perícias do INSS.
Eis alguns títulos do noticiário que expressam resultados de auditorias desenvolvidas pelo TCU na área da Previdência:
- TCU fiscaliza 1,4 trilhão de reais da previdência
- Falta de perícia médica remota do INSS desrespeita princípios da Constituição
- Auditoria no Auxílio Brasil constata desvio do público-alvo do programa
- Auditoria do TCU avalia passivo atuarial da previdência
- TCU avalia que fundos de pensão apresentam altos riscos de integridade
- Acompanhamento constatou indícios de recebimento indevido do Auxílio Emergencial
- (Fonte: Portal do TCU)
Esses são exemplos de como, especialmente nos últimos anos, o controle externo tem auxiliado a trajetória longeva da Previdência. Longa e resistente, porque não se pode esquecer de que em sua existência já sofreu sete reformas, resistindo herculeamente a todas elas, ora avançando, ora retrocedendo, se aproximando ou se distanciando do ideal para o qual foi criada: melhorar a condição de vida dos trabalhadores, especialmente na “melhor idade”. Mário Quintana que o diga: morreu aposentado!
A data é, sem dúvida, motivo de celebração. Porém, é também uma oportunidade para nos manifestarmos contra os retrocessos e lutar contra prejuízos inaceitáveis para boa parte da população, especialmente os mais pobres e que mais dependem dos benefícios previdenciários.
O controle externo pode ajudar muito: auditando os fundos públicos previdenciários, fiscalizando a legalidade do recebimento de benefícios, avaliando a eficiência e a efetividade do atendimento dos beneficiários, bem como a eficácia da política de reajuste dos benefícios e garantindo que o passivo atuarial esteja livre de distorções.
Por tudo isso, urge valorizar o sistema previdenciário brasileiro e desejar muito Tempo à Previdência e ao controle externo – colaborador de sua continuidade, regularidade e da saúde de suas contas – porque, como dizia Mário Quintana, “quando se vê já é sexta-feira!”.
Morgana Bellazzi de Carvalho – Auditora de Contas Públicas do Tribunal de Contas do Estado da Bahia.