Os 35 anos da Constituição e o controle externo

Balzac já antevira que a beleza da maturidade ocorre quando a experiência proporciona o encontro com a essência.

A Constituição Federal faz 35 anos e se aproxima cada vez mais de seu eixo. Mas não chegou a essa beleza sem as marcas do tempo, registros da superação das dificuldades. Alcança a maturidade indiscutivelmente mais forte e plena.

Não implementou todos os programas e projetos, nem cumpriu todas as promessas, mas entrou definitivamente na vida dos cidadãos brasileiros. Dia após dia recebe apoio deles e das instituições que não exitam em lhe dar o suporte necessário para resistir às inundações e tempestades.

A Carta ganhou as ruas. Foi emendada. Acusada. Ameaçada. Resistiu às tentativas de ruptura democrática. Sobreviveu à maior ameaça surgida à sua existência como norma fundamental. Manteve o compromisso com o processo civilizatório, o que significa o triunfo da proposta do pacto social que estreou em 88 e segue a defender.

Pacto social que não prescinde de um grande companheiro reestruturado por ela: o controle externo. Ela o fortalece e é fortalecida por ele.

Sim, o controle externo foi enormemente valorizado e robustecido na Constituição de 1988, que desde o nascimento, abrangeu além da fiscalização contábil, financeira, orçamentária e patrimonial, o controle operacional. Além disso, fixou que o controle externo exercido pelo Legislativo, com o auxílio do Tribunal de Contas, deveria englobar não só aspectos de legalidade e legitimidade, mas, também, de economicidade (caput do art. 70).

Dessa forma, os Tribunais de Contas deixaram de verificar apenas a conformidade contábil e legal, e ganharam uma competência nova, desafiadora e relevante, qual seja, a de realizar o controle operacional de economicidade. Esse controle é mais amplo e envolve uma visão finalística: a realização do interesse público e a otimização e melhoria dos resultados esperados em relação não só à eficácia, mas, também à eficiência e efetividade.

Em sua emenda da primeira década, fixou que qualquer pessoa, física ou jurídica, pública ou privada deve prestar contas, desde que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais o Estado responda, ou que, em nome deste, assuma obrigações de natureza pecuniária (Parágrafo único do art. 70 incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998). 

Esse traçado veio para reforçar os ideais democráticos, de liberdade e de igualdade, desenhados desde a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, quando em seu art. 15 previa que a sociedade tem o direito de pedir contas a todo o agente público pela sua administração.

Assim, ao completar 10 anos de vida, a Menina dos olhos dos Constituintes de 88 não deixou margem para dúvida de que TODOS e TODAS que lidem com recursos públicos devem prestar contas tanto da arrecadação quanto do emprego dessas verbas.

Sobre a ordem social, a Constituição dispõe que ela tem como base o primado do trabalho e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais (caput do art. 193). Contudo, depois dos 30, mais madura, aproximou esse ideal da participação popular, acrescentando que o Estado deve exercer a função de planejamento das políticas sociais, assegurando, na forma da lei, a participação da sociedade nos processos de formulação, de monitoramento, de controle e de avaliação dessas políticas (Parágrafo único incluído pela Emenda Constitucional nº 108, de 2020).

Essa mudança aponta para a importância de empoderar o controle externo social, que ao lado do controle externo institucional, desempenhado pelos Tribunais de Contas, pode gerar frutos extraordinários!

A Mulher de trinta passou a enxergar as reais possibilidades do controle externo, parceiro de todas as horas da gestão da coisa pública, como sempre deveria ser, já que a coisa é pública não porque não seja de ninguém, mas porque é de todos, e por isso nenhum deve ficar de fora.

Aos trinta e cinco, Ela alcança sua maior finalidade: servir à sociedade. E, dando-se conta disso, mergulha na fonte da juventude – o povo – e renova-se diariamente.

Por tudo isso, desejamos vida longa à Constituição Cidadã, uma balzaquiana que soube escolher bem um companheiro republicano e democrático para caminhar junto e estar unida: o controle externo!

Morgana Bellazzi de Carvalho – Auditora de Contas Públicas do TCE-BA