Os desafios da participação social

Cezar Miola

Os Tribunais de Contas de todo o país realizaram uma ação conjunta neste 20 de março para promover espaços de diálogo e de interação entre a sociedade e os órgãos de controle público; foi o Ouvidoria Day. O objetivo é evidenciar os canais de comunicação e os serviços disponibilizados pelos Tribunais de Contas à população. Mais do que espaços de reclamação, as ouvidorias representam a ponte entre a sociedade e a administração pública, permitindo que a população exerça seu direito de ser escutada e influencie na tomada de decisões.

A Constituição de 1988 garantiu a participação cidadã como direito fundamental, e os Tribunais de Contas têm desempenhado um papel pedagógico nesse processo, incentivando o controle social. No entanto, os dados revelam que, apesar dos avanços, ainda há um longo caminho a percorrer.

Há quase uma década, apenas 30% dos Executivos e 21% dos Legislativos municipais declararam possuir ouvidorias no Rio Grande do Sul. Apesar de a Lei nº 13.460/2017 ter impulsionado a criação desses canais, ainda persiste a falta de estrutura e capacitação: 68% dos Executivos e 71% dos Legislativos afirmaram que os responsáveis pelas ouvidorias nunca receberam treinamento específico. E, ainda mais preocupante: 28 Executivos e 110 Legislativos destacaram nunca terem recebido qualquer manifestação da sociedade.

Como esperar uma participação efetiva da população se o cidadão não sabe onde buscar ajuda? Ou, pior, teme represálias ao se manifestar? Para fortalecer as ouvidorias, é crucial ampliar a divulgação desses canais, capacitar os servidores, garantir recursos materiais e dar às manifestações, e ao seu autor, o tratamento previsto legalmente. Além disso, é preciso estimular a cultura da participação social desde a educação básica, na escola, formando cidadãos conscientes de seus direitos e deveres. Aliás, aqui vale lembrar de Anísio Teixeira, Patrono da Escola Pública (Lei Federai 15.000, de 15-10-2024): “Só existirá democracia no Brasil no dia em que se montar no país a máquina que prepara as democracias. Essa máquina é a da escola pública”.

A participação social não pode ser vista como um princípio abstrato, mas, sim, como um mecanismo efetivo para melhorar a gestão pública e garantir que as políticas governamentais reflitam as reais necessidades da população. As ouvidorias públicas são um pilar dessa participação e precisam ser fortalecidas, garantindo que a voz do cidadão não apenas seja ouvida, mas também resulte em mudanças concretas.

Cezar Miola é conselheiro do TCE-RS e vice-presidente da Atricon