Reforma tributária é uma das expressões mais utilizadas e menos explicadas no debate público brasileiro. Da situação à oposição, da extrema-direita à extrema-esquerda, não há quem não se proclame favorável à reforma tributária. É claro que cada um usa esse rótulo pensando em um conteúdo bem diferente do dos demais. No entanto, como ninguém entra em detalhes, parece que há um grande consenso nacional a favor dessa reforma. Mas como a realidade sempre se impõe à fantasia e tal consenso nunca existiu, passam governos e legislaturas e não se faz reforma tributária nenhuma.
As dificuldades são muitas. Mudar a tributação exige emendar a Constituição, o que necessita de apoio de três quintos dos membros do Congresso em dois turnos de votação. Nenhum partido ou bloco parlamentar alcança tal maioria. Ademais, temas tributários raramente obtêm unanimidade dentro de uma legenda.
Em tese, todos desejam reduzir, ou pelo menos estabilizar, a carga tributária total. Ao mesmo tempo, proclamam sua intenção de expandir políticas sociais, investir em infraestrutura e melhorar a qualidade dos serviços públicos. Tudo isso sem demitir servidores ou aumentar o endividamento e mantendo a inflação sob controle. Não é preciso ser um gênio em ciências econômicas para concluir que resolver essa equação não é tarefa simples, se é que é possível.
Para se criar uma base mínima de compreensão sobre o tema é preciso conhecer os fatos. Em 2012, a carga tributária representou 34,5% do Produto Interno Bruto. Todavia, seu impacto não foi uniforme entre as classes sociais e esferas governamentais. A maior parte dos tributos (52%) recaiu sobre o consumo e os rendimentos do trabalho, ao passo que os rendimentos do capital representaram apenas 15% do total arrecadado. Famílias com renda até dois salários mínimos pagaram 45,8% de sua renda líquida em impostos indiretos; famílias com renda superior a trinta salários mínimos pagaram 16,4%.
A concentração e a desigualdade também se observaram com respeito a quem fica com o produto dos impostos. Mais de 70% dos recursos tributários foram arrecadados pela União, sabendo-se que estados e municípios é que suportam as maiores responsabilidades na oferta de serviços públicos de saúde, educação e segurança pública.
Outro aspecto importante é a dimensão da renúncia fiscal, isto é, recursos que o poder público opta por não arrecadar em nome do incentivo a atividades econômicas setoriais ou regionais. Apenas a Zona Franca de Manaus recebeu em 2013 incentivos superiores a R$ 22 bilhões, mais de uma vez e meia o orçamento de todo o estado de Mato Grosso. Entre outros exemplos, temos a isenção de imposto de renda sobre distribuição de lucros e remessas ao exterior e a não incidência de IPVA sobre helicópteros, jatinhos e iates. Até plantações de tabaco recebem benefícios fiscais no Brasil, mesmo estando demonstrado que o tabagismo mata 200 mil brasileiros por ano, com custos bilionários para o Sistema Único de Saúde, em virtude de consultas, internações, cirurgias e medicamentos.
Ademais, é necessário melhorar a eficiência da administração tributária de modo a reduzir a sonegação fiscal que impacta muito negativamente as finanças públicas.
Discutir a reforma tributária com seriedade significa enfrentar, entre outras, as seguintes questões. Queremos, efetivamente, justiça fiscal? Qual o grau de tributação que será suportado por cada atividade econômica e grupo social: o capital ou o trabalho, os de maior ou menor renda? Qual o tamanho da fatia que receberá cada ente – União, estados e municípios? Como passar a limpo a balbúrdia dos incentivos fiscais? Como simplificar o cumprimento das obrigações tributárias de empresas e indivíduos, reduzindo custos operacionais e estimulando os bons pagadores?
O tema é relevante e urgente, mas será que dispomos de lideranças políticas maduras para bem conduzir esse debate ou iremos adiá-lo por mais quatro anos?
* Luiz Henrique Lima é Conselheiro Substituto do TCE-MT.