TCE-GO: Ministro Fux afirma que conciliação pode ser a solução para a justiça brasileira

Conciliação deve ser a palavra chave para o Brasil resolver adequadamente o excesso de demandas e lentidão que assoberbam e desafiam os seus tribunais. A opinião é do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, ao falar hoje (11/ago) a conselheiros e procuradores dos Tribunais de Contas do Estado de Goiás e do TCM de Goiás, além  do presidente do Instituto Goiano de Direito Administrativo, Francisco Taveira Neto e do desembargador Itamar de Lima, no Salão Nobre do Castro’s Hotel.

Convidado especial para o evento científico promovido pelo TCE-GO, o ministro sugeriu que, a despeito de tratar em seus processos dos chamados direitos indisponíveis, o Tribunal de Contas da União deveria criar câmaras de conciliação para tratar de forma célere, descomplicada e eficaz, de casos como falhas formais passíveis de serem supridas consensualmente, por exemplo. “Seria muitíssimo interessante”, disse Luiz Fux, que, mesmo sem mencionar explicitamente, deu a entender que o modelo poderia ser replicado para as demais cortes de contas do País.

O ministro do STF citou alguns casos em que pôs fim a demandas pela via consensual, inclusive com a participação do Ministério Público, para quem o assunto já não é estranho, pois já trabalha com os TACs e TAGs, Termos de Ajuste de Conduta e de Gestão. No caso de Tribunais de Contas, como o TCE de Goiás, os TAGs já são previstos em suas leis orgânicas e regimentos internos.

Luiz Fux iniciou sua fala lembrando sua afinidade com os tribunais de contas. Citou o mandado de segurança que relatou às vésperas da instalação do processo de impedimento da então presidente Dilma, quando se questionou eventual impedimento de membro do TCU, de cujo parecer derivou a sustentação jurídica para a instauração daquele procedimento. O ministro indeferiu o pedido de suspensão via liminar e sua decisão permitiu a sequência dos trâmites do impeachment.

Para ele o Tribunal de Contas não pode ser conjurado do sistema constitucional brasileiro e entende que tal competência cabe ao controle externo e não ao Legislativo, como ao final acabou decidindo a Suprema Corte.

Amianto

Ao criticar o sistema que permite múltiplos recursos no decorrer dos processos judiciais, resultando em um estoque asfixiante nas instâncias superiores, inclusive o STF, o ministro lembrou o caso do amianto, que começou a ser apreciado esta semana, em Brasília, como exemplo de assunto que merece maior atenção, enquanto que tantos outros, com pouca ou sem nenhuma relevância, assoberbam os ministros. Ressaltou os avanços que o novo Código de Processo Civil contempla no sentido de reduzir a possibilidade recursal, de estimular a conciliação, possibilitar uma caminhada conjunta do aspecto econômico das questões junto da faceta jurídica, redução das formalidades processuais e avanços no sentido da razoável duração do processo.

Ainda falando sobre o caso do amianto o ministro Fux lembrou que o uso desse mineral significa algo próximo de 1,5 bilhão de reais, com significativo impacto na composição do PIB. Para deliberar a respeito o STF colheu informações de técnicos as mais díspares, desde as que afirmam que o produto é cancerígeno quanto outras que garantem ser a espécie crisotila inofensiva ao ser humano. Os ministros terão que ponderar sobre aspectos como os reflexos do produto sobre a saúde e os impactos econômicos decorrentes da solução que vier a ser dada, uma vez que “posta uma questão diante do Judiciário, o juiz dela não pode se esquivar, como é no sistema brasileiro, derivado do direito romano”.

Diferentemente disso, nos países que adotam o sistema anglo germânico, como os Estados Unidos e Inglaterra, aduziu o ministro que lá os juízes podem deliberar que um tema não deve ser definido na instância judicial e remeter o caso à deliberação do Legislativo. No Brasil não há essa possibilidade e, em boa medida, isso é responsável pela acusação de ativismo judicial. Para o ministro boa parcela da população não sabe que o Judiciário só age quando provocado e uma vez proposta uma ação sobre ela o juiz tem de decidir. Lembrou que em função dos modelos adotados os juízes brasileiros não foram preparados para lidar com questões de natureza econômica, por exemplo, ou que envolvem conhecimentos de gestão. Daí terem de recorrer a peritos com expertise em assuntos específicos e ainda assim sentem dificuldades até para entender o linguajar, criando uma situação em que um economista não entende os termos jurídicos e os operadores do direito desconhecem termos econômicos ou da medicina.

Litigiosidade desenfreada

Pregando o desestímulo às chamadas ações frívolas, o ministro Fux falou em litigiosidade desenfreada dos brasileiros, que na proporção de dois por três, em algum momento, recorreu ao Judiciário. Isso causa a disparidade entre o que ocorre na Suprema Corte Americana, onde os ministros examinam 70 processos contra 170 mil ações, dos 11 colegas brasileiros no STF. Lembrou que, enquanto um juiz de uma vara criminal prolata 20 decisões por mês, um ministro do STF emite 900 decisões a cada mês, ainda que deste número cerca de 750 são como se fossem pré-fabricadas, de casos que se repetem.

Frisando mais uma vez o tema da conciliação, o integrante do STF diz que ela permite a solução do conflito sem que as partes se sintam perdedoras ou vencedoras, resultando no restabelecimento da boa convivência, relações harmoniosas e a sensação de justiça e de felicidade. A produção antecipada de provas, a contratualização de processos e a permissão de que as partes sejam ativas na busca da solução dos conflitos e a possibilidade do juiz promover a prévia conciliação foram pontos destacados pelo ministro Luiz Fux como os principais avanços da atual lei processual civil brasileira. Citando casos em que atuou ao longo de sua carreira nas diversas instâncias, desde a mais singela e até no Supremo, o ministro assinalou que o juiz deve sempre ouvir as partes antes de deferir uma liminar, ainda que processualmente estejam presentes as condições para uma decisão sem ouvir a parte demandada, possibilitando decisões para justas e respeitosas com os direitos das pessoas. Terminou lembrando o célebre poema épico de Gonçalves Dias, I-Juca Pirama, para concitar seus pares a nunca esmorecer diante da batalha, que aos fracos abate.