“Um galo sozinho não tece uma manhã.” (João Cabral de Melo Neto)
A natureza da corrupção revelada em decibéis jamais vistos pela Lava-Jato reforça uma convicção que tenho reiterado como presidente da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon): corrupção sistêmica só se combate efetivamente a partir de um controle sistêmico.
A despeito de cada instituição de controle ter o dever de buscar o aprimoramento contínuo, o combate aos desperdícios e à corrupção não será efetivo e sustentável se não houver uma atuação organizada e colaborativa entre os órgãos de controle público: controle interno, procuradoria, órgão tributário, polícia, tribunal de contas, ministério público, legislativo e judiciário. Frente aos manifestos cardumes de predadores da república, anzóis haverão de dar lugar às redes. A efetividade, neste caso, rima com atuação integrada consubstanciada por uma teia protetora do dinheiro público, produzida a partir de um consistente entrelaçar de fios e tecida com matérias-primas como controles independentes, legislação que agilize uma exemplar responsabilização dos malfeitores, liberdade de imprensa, transparência dos atos de gestão e participação os cidadãos no controle social, associada a um modelo de exercício da política que iniba a influência do poder econômico. Para tanto, nesta sonhada rede-teia, a educação constitui o fio-mor. Fazendo uma metáfora com a mitologia, é forçoso reconhecer que para ferir de morte o monstro da corrupção e sairmos imunes do labirinto da ignorância, da falta de ética e da ineficiência, a educação consiste no “fio de ouro de Ariadne”, que tem o poder de fortalecer e alargar todos os demais fios e de nos apontar o caminho da redenção cidadã.
Os Tribunais de Contas (TCs), instituições consagradas pela Constituição Federal como essenciais à república, à democracia e à boa governança pública, não é de hoje, envidam ações com vistas a honrar o seu papel na rede de controle. Para dinamizar tais iniciativas, e contribuir para tornar esse compromisso constitucional uma realidade em todos os Tribunais, a Atricon desenvolveu e coordena em todo o país uma ousada iniciativa de aprimoramento desses órgãos, o Programa Qualidade e Agilidade dos Tribunais de Contas (QATC), composto pelas Resoluções-Diretrizes da Atricon e pelo MMD-TC (Marco de Medição de Desempenho dos TCs). O MMD-TC constitui a mais moderna e adequada ferramenta de avaliação para os TCs, haja vista ser constituída por indicadores de desempenho recomendados mundialmente e por outros extraídos das Resoluções-Diretrizes, o que permite um diagnóstico de padrão internacional em sintonia com as singularidades do nosso modelo de controle. São mais de 500 critérios de boas práticas abrangendo áreas como auditoria, julgamento, composição, comunicação, planejamento, gestão e transparência. O diagnóstico realizado em 2015 alcançou a expressiva adesão de 33 dos 34 Tribunais de Contas do Brasil, em uma inequívoca demonstração do comprometimento dessas entidades e dos seus membros e servidores com as responsabilidades constitucionais que lhes competem.
Navegar em busca do contínuo aprimoramento institucional é “preciso”, nas duas conhecidas acepções da palavra. “Preciso”, significando seguro, porque os resultados da aplicação do MMD-TC já indicam o que deve ser mantido, aperfeiçoado e almejado. Mas é “preciso”, ainda, no sentido de necessidade, porquanto a sociedade clama para que os órgãos de controle prestem serviços de excelência, primando pela eficiência das políticas públicas e prevenindo e combatendo a corrupção.
Que estejamos à altura desse momento histórico, munidos da determinação e equilíbrio suficientes para continuarmos combatendo o bom combate contra os que negam os princípios da eficiência e da probidade e tecermos, a múltiplas mãos, os fios fundamentais da república a cada amanhecer!
Valdecir Pascoal é Presidente da Atricon