– Em matéria de competências, organização e composição, a Constituição Federal (CF) manda aplicar as regras do TCU aos demais Tribunais de Contas (TCs). Embora não haja vinculação ou hierarquia, de natureza processual ou administrativa, entre eles, pergunto: existe algum ente público que coordene os 33 Tribunais?
– Não. Existem propostas de emendas à CF que tratam da criação de um Conselho Nacional dos TCs, que atuaria, sobre esses órgãos, nos moldes em que o CNJ o faz no âmbito do Judiciário. Enquanto esse Conselho não vem, destaco o profícuo trabalho exercido pela Atricon (Associação dos Membros dos TCs do Brasil), que celebra 30 anos no próximo 26 de agosto.
– Mas a Atricon não atua apenas em defesa dos membros dos TCs?
– Sua missão é bem maior. Sem descuidar da natural vocação de órgão de classe, a entidade prioriza a defesa e o aprimoramento institucional dos TCs, por meio de múltiplas ações, dentre as quais destacam-se o desenvolvimento do programa Qualidade e Agilidade dos TCs (QATC), composto por Resoluções-Diretrizes e pelo Marco de Medição de Desempenho (MMD-TC); a atuação judicial, notadamente no STF, em defesa das atribuições dos TCs e dos direitos, garantias e prerrogativas dos membros; o trabalho permanente no Parlamento a favor de aperfeiçoamentos da legislação sobre o controle externo, assim como para evitar retrocessos normativos que visam enfraquecê-lo; e a participação no debate público sobre temas afeitos ao controle, às finanças e à gestão pública.
– Vejo que essa louvável atuação da Atricon é bem semelhante à de um Conselho Nacional. De que tratam as Resoluções-Diretrizes? E como vem sendo a adesão e os resultados da aplicação do MMD-TC, uma vez que não há obrigação de os TCs seguirem as orientações da Atricon?
– As Resoluções da Atricon estabelecem diretrizes em todas as áreas de atuação dos TCs, a exemplo da governança interna, composição, processo de controle externo, fiscalização, prevenção, julgamento, ouvidoria, corregedoria, transparência, educação, previdência, segurança pública, obras públicas. A adesão é total e os resultados evidenciam avanços consideráveis sob a ótica dos 500 critérios mensurados, o que também implica maior uniformidade, padronização e diminuição das assimetrias entre os Tribunais. Tem mais: o processo de aplicação do MMD-TC propicia um ambiente de competição saudável entre esses órgãos, pois todos querem estar bem na fotografia e no filme dos ciclos de avaliação. O êxito da ferramenta deve-se também à forma democrática e dialógica com que foi construída e vem sendo aplicada e aprimorada, envolvendo todo o “Sistema Tribunais de Contas”, incluindo as entidades parceiras (IRB, CNPTC, Abracom, Audicon, Ampcon, ANTC e FENASTC). É literalmente um marco que tem o poder de diminuir o hiato entre o que os TCs são (realidade) e o que a CF deseja que sejam (ideal). Para saber mais, consulte: http://qatc.atricon.org.br/.
– A defesa dos Tribunais de Contas no STF e no Congresso Nacional, nesta quadra histórica de múltiplas crises que afetam a democracia e as instituições públicas, justifica que a Atricon mantenha e reforce sua atuação vigilante?
– Sem dúvida. É fato que a CF de 1988 fortaleceu muito os TCs, que o STF consolidou, ao longo dos últimos anos, uma jurisprudência majoritária na mesma senda e que o Congresso Nacional aprovou leis, a exemplo da LRF, que ampliou o papel desses órgãos. No entanto, em momentos de crises graves, como a que vivemos, a atenção deve ser redobrada, para evitar mutações legislativas ou jurisprudenciais que, sem passar pelo crivo do contraditório e do bom debate, acabam enfraquecendo o controle, a pretexto de aprimorá-lo. Nesse contexto, o trabalho sério, realizado pela Atricon, proporciona a todos os atores – instituições, agentes públicos e sociedade civil – credibilidade e confiança, atributos essenciais dessa empreitada. Outro aspecto que merece realce: não existe democracia sem instituições de controle efetivas e responsáveis. O bom controle contribui para a efetividade e a probidade das políticas públicas, o que leva o cidadão a acreditar no pacto constitucional democrático. A entidade, nascida nos albores da redemocratização, tem, portanto, como foco institucional o compromisso com esse ideal. Como proclama o Hino da Atricon: “Democracia no Brasil é permanente”. Parabéns, Atricon!
Valdecir Pascoal – É Conselheiro do TCE-PE; foi Presidente da Atricon (2014 – 2017)