Ao final do mês de junho de 2023, tendo passado os festejos juninos, deparei-me, no site do G1, com a manchete “STF forma maioria para validar regras da Lei de Responsabilidade Fiscal sobre despesa com servidores” e, ao adentrar-me no conteúdo da matéria, pude experimentar uma pequena satisfação ao constatar que o que já havia defendido, inclusive nesta coluna, era agora, de forma oficial, ratificado pelos Magistrados mais importantes da República.
Refiro-me ao julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 69, proposta pelo Partido Novo Nacional – NOVO, tendo por objeto os arts. 18, caput, e 19, caput e §§ 1º e 2º, da Lei Complementar nº 101/2000, conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF, que dispõem sobre a composição do limite de gastos com pessoal.
Nesse processo, em síntese, o Partido NOVO sustentou que certos entes da federação teriam afastado, indevidamente, as disposições expressas dos mencionados artigos da LC nº 101/2000 ao excluir despesas com inativos e pensionistas, assim como o imposto de renda retido na fonte (IRRF), dos cálculos finais da despesa total com pessoal.
O Supremo Tribunal Federal (STF), de forma unânime, na Sessão Virtual que se deu de 23/06/2023 a 30/06/2023, seguindo o voto do Relator, o Ministro Alexandre de Moraes, entendeu que deveria conhecer a ação declaratória e julgou procedente o pedido formulado para declarar a constitucionalidade do art. 18, caput, e do art. 19, caput e §§ 1º e 2º, ambos da LRF.
Assim, volto a tratar da pequena satisfação que tive, pois a matéria, assim como decidida agora, foi defendida por mim, neste impresso, na coluna publicada em 02/05/2022, intitulada “LRF: discutir critérios, sim. Escamotear, não”.
Já naquela oportunidade, defendi a tese de que não seria razoável supor que, passados 22 anos da entrada em vigor da LRF, ainda pairassem dúvidas acerca do cômputo de despesa com pessoal, em especial acerca dos gastos com aposentados e do valor de imposto de renda retido na fonte que eram excluídos, ilegalmente, dos limites de gastos da LRF por alguns entes da federação.
Também no referido artigo, defendi a tese de que fossem realizados estudos a fim de verificar se a limitação legal fixada em 60% para gastos com pessoal, praticada de forma homogênea nacionalmente, seria o método mais adequado a ser adotado perante as realidades díspares deste país e se, inclusive, tal percentual, fixado há décadas, seria condizente com a realidade dos dias atuais.
Já no julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 69, que caminhou ao encontro do meu entendimento, o Ministro-Relator fez constar no seu voto que “Uma vez atribuída competência ao ente central (governo federal) para regular a questão de modo geral e uniforme por meio de uma lei nacional, os entes subnacionais (governos estaduais) devem obediência ao regramento editado, não lhes sendo lícito escolher qual ou quais regras irão adotar, sob pena de esvaziamento da própria competência constitucional atribuída à União”.
Assim como pensa o Ministro, também me posicionei pelo dever legal de se inserir no cômputo das despesas com pessoal os gastos com aposentados e o IRPF retido em fonte, tendo afirmado, ainda, que, “mais importante do que buscar mecanismos para escamotear a apuração dos limites estabelecidos na LRF, é unir forças para adequá-la à realidade dos novos tempos, contudo sem ferir de morte esse importante instrumento legislativo que tanto contribuiu para a melhoria da gestão fiscal neste país”.
Sendo assim, acertado está o STF ao julgar a Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 69 de forma a fazer valer a limitação legal contida na LRF acerca dos gastos com aposentados e do imposto retido em fonte, que, obrigatoriamente, devem fazer parte do cômputo para a fixação do limite de despesas com pessoal.
O STF, como Corte maior e como balizador legal do sistema jurídico republicano pátrio, é o portador da última palavra na dirimição de controvérsias, revestindo-se como última instância para eliminar os conflitos e a discordância entre diversas interpretações do texto constitucional.
No tema atinente à LRF ora tratado, caminhamos, lado a lado, no nosso entendimento. Entretanto devo dizer ao leitor que, por vezes, discordo de decisões e de entendimentos oriundos da Corte Suprema, como quando considerou inconstitucional as leis estaduais que fixaram descontos às mensalidades escolares, na época da pandemia da covid-19, ou quando decidiu que os auditores do Tribunal de Contas do Estado da Bahia (TCE-BA), que por mais de 30 anos substituíam os conselheiros, não poderiam mais fazê-lo, mas, não por isso, poderei atacá-lo ou descumprir suas decisões. Vivam as decisões do Supremo.
Voltando à LRF, resta aguardar que seus limites legais, que tanto qualificaram o gasto público, possam seguir seu rumo, no prumo, aperfeiçoando-se no decorrer do tempo, sem, contudo, ter seu objeto esvaziado.
Inaldo da Paixão Santos Araújo – Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado da Bahia