Cezar Miola
Novidade alguma haverá se dissermos que convivemos com uma antiga descrença no serviço público, sem se excluir dessa desconfiança nenhuma instituição. Assim é, por exemplo, quando se trata da burocracia, modelo de administração construído ao longo de séculos para dar racionalidade, profissionalização e regramentos técnicos e impessoais às organizações. Porém, com frequência se tem a burocracia como sinônimo de estruturas emperradas, repletas de regras desnecessárias e com espaços porosos à corrupção. Cabe reconhecer que essa mesma burocracia não raro abriga a morosidade, o comodismo e disfunções, enaltecendo o formalismo estéril, em detrimento da eficiência e da efetividade. Mas o melhor é lidar com ela no fato concreto, caso a caso, baseados em evidências.
E é aqui, então, que destaco alguns dos benefícios gerados pelos 33 Tribunais de Contas (TCs) ao país, os quais fiscalizam a arrecadação e o emprego dos recursos públicos, avaliando também a eficiência das políticas adotadas em todos os entes da federação. Transparência, boa governança e defesa da legalidade, da eficiência, da eficácia e da moralidade são os focos de atenção a partir de referenciais como o Marco de Medição de Desempenho e o Programa Nacional de Transparência Pública.
Dados reunidos pela Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon) demonstram a importância desse sistema. Apenas em 2023, os valores imputados pelos TCs a serem ressarcidos aos cofres públicos chegaram a R$ 3,5 bilhões, sobretudo por despesas indevidas. Em multas, foram R$ 351 milhões. E o mais importante: se contabilizarmos os recursos que deixaram de ser despendidos ao longo do ano – devido às ações preventivas e pedagógicas dos órgãos de controle, como em orientações, recomendações e medidas cautelares –, o montante alcança a ordem dos R$ 400 bilhões. Isso, sobretudo, em editais, contratos de obras e de serviços e gastos com pessoal sem amparo na legislação.
E ainda temos os benefícios não diretamente financeiros, incluindo uma variedade de melhorias que fazem a diferença e impactam na vida da população, como o aumento no número de vagas em creches e de leitos hospitalares, a redução do tempo de espera em filas para consultas, a qualidade do transporte coletivo e a garantia dos benefícios sociais para quem realmente necessita. Noutra perspectiva de relevo: é fato que a só existência de estruturas de fiscalização atentas e operantes produz efeitos dissuasórios significativos (embora de difícil mensuração) nos campos da prevenção, do autocontrole e da prudência no agir.
Ademais, orientações, capacitações e acompanhamentos promovidos pelas Cortes de Contas, sobretudo através das suas escolas e consultorias técnicas, ajudam agentes públicos a decidir com segurança jurídica e agilidade, tal qual se fez no TCE-RS durante a calamidade das enchentes e nos seus desdobramentos. Os Tribunais de Contas são órgãos essenciais à fiscalização e ao aperfeiçoamento da gestão. E, no serviço público, como um todo, desejo que os servidores (os quais, em sua maciça maioria, são dedicados e competentes) sigam promovendo as melhores e oportunas entregas à sociedade. Ela que, pela via dos tributos, financia a atuação estatal em todas as suas dimensões.
Cezar Miola – Conselheiro-ouvidor do TCE-RS e vice-presidente de Relações Político-Institucionais da Atricon