A extinção do TCE

A extinção do TCE

Luiz Henrique Lima

Esta semana tive acesso a um debate nas redes sociais em que vários participantes pregaram a extinção do Tribunal de Contas.

Essencialmente, houve três argumentos para amparar a tese.

O primeiro é que o TCE-MT teria falhado na prevenção/punição a episódios de corrupção nas últimas gestões. O segundo é que se trata de um órgão que consome elevada parcela dos recursos estaduais. O terceiro é que tem na sua composição membros de origem política, que não julgam com motivação técnica, mas em virtude de interesses partidários.

Quanto à primeira alegação, é preciso reconhecer que nenhuma instituição estatal, inclusive as Cortes de Contas, foi capaz de prevenir os desvios bilionários ocorridos na esfera federal, como na Petrobrás e nos fundos de pensão, e na estadual, como no VLT e no MT-Integrado. Todavia, cabe assinalar que as competências dos órgãos de controle externo estão delimitadas pela Constituição, não lhes sendo possível, no regramento atual, lançar mão de ferramentas valiosas em processos de investigação, tais como a quebra de sigilos fiscal e bancário. Nada obstante, foram adotadas inúmeras medidas cautelares e impostas sanções a poderosos agentes políticos.

Ademais, o “argumento” em si é uma falácia rudimentar. O Brasil tem uma reduzida taxa de resolução de homicídios e nem por isso se prega a extinção dos órgãos policiais; grande parte de nossas universidades ostenta fraco desempenho na área de pesquisa e nem por isso se advoga o seu fechamento e assim por diante.

Com respeito ao custo de manutenção do TCE, é preciso saber fazer as contas corretamente. Sem dúvida, como na maioria dos órgãos públicos, há espaço para redução de custos e melhoria de desempenho. Contudo, como aprende qualquer calouro nas faculdades de economia ou administração, todo gasto deve ser avaliado numa relação de custo-benefício envolvendo, pelo menos, as alternativas de fazê-lo ou não. Assim, os preços de um medicamento ou de um seguro veicular podem, a princípio, ser considerados caros, mas uma análise atenta deve considerar o custo e o risco do paciente não fazer uso do medicamento ou do proprietário não adquirir o seguro para o seu veículo. No caso da administração pública, há dúzias de pesquisas demonstrando que o custo do descontrole é muito superior ao do controle. Aqui mesmo em MT há inúmeros exemplos, como na fiscalização da concorrência de obras na MT-130, na qual o TCE-MT conseguiu a redução do preço final do contrato em mais de R$ 5 milhões. Aquele único processo permitiu ao estado economizar um montante superior à remuneração anual de todos os auditores lotados na unidade de engenharia do TCE. Há muitos outros casos similares.

Finalmente, com relação à composição do TCE, é certo que há críticas bem fundadas e diversas propostas de emendas à Constituição visando aumentar o número de conselheiros oriundos de carreiras técnicas, como as dos conselheiros substitutos e procuradores de contas. No Tribunal de Justiça, por exemplo, 80% dos desembargadores têm origem na magistratura e apenas 20% na advocacia e no Ministério Público. Enquanto isso, nos TCs, pela regra vigente, apenas um conselheiro substituto e um procurador de contas são alçados à titularidade entre os sete conselheiros. No caso de MT, passados mais de 30 anos da Carta de 1988, sequer essa participação mínima foi concretizada. Isso, no entanto, não deve inspirar movimentos pela extinção do órgão de controle, mas sim pelo aprimoramento e pela observância às normas constitucionais que o disciplinam.

Como já tive a oportunidade de escrever, críticas à atuação do TCE são bem-vindas e devem ser recebidas com naturalidade e humildade. O que se espera é que o importante debate sobre o aperfeiçoamento da função controle da administração pública seja pautado pela compreensão de que tal atividade é essencial ao regime democrático e ao melhor desempenho da administração pública, sob os prismas de legalidade, legitimidade e economicidade.

 

Luiz Henrique Lima é Conselheiro Substituto do TCE-MT.