João Antonio da Silva Filho
O mundo vive hoje uma revolução em curso e, como todo processo revolucionário, seus efeitos transformarão profundamente a sociedade, tornando impossível um retorno ao passado. A revolução da vez é a Inteligência Artificial (IA), que abrange um vasto campo de interferência e impacta costumes, ideologias e, fundamentalmente, o modo de produção de riquezas. Assim como a filosofia surgida na Grécia Antiga, a aliança do Império Romano com o cristianismo, a Revolução Industrial, a Revolução Francesa e a Revolução Russa de 1917, a IA está alterando de forma irreversível a cultura ocidental, com repercussões em todas as nações do planeta.
A Inteligência Artificial é uma das forças motrizes mais significativas da atual transformação global. Baseada em avanços tecnológicos, a IA permite que máquinas e sistemas realizem tarefas antes restritas à inteligência humana. Desde a automação de processos industriais até a análise de grandes volumes de dados, a tecnologia está remodelando inúmeros setores da economia e da sociedade. No entanto, essa revolução não ocorre sem desafios, levantando questões éticas, econômicas e sociais que exigem reflexão e regulamentação.
Dora Kaufman, em sua obra Desmitificando a Inteligência Artificial, observa que os algoritmos de IA são eficazes na identificação de padrões estatísticos, mas carecem de compreensão do mundo real. Segundo a autora, a IA opera dentro do “MathWorld” (mundo da matemática), incapaz de discernir se os padrões que encontra são realmente significativos ou meras coincidências. O verdadeiro perigo, alerta Kaufman, não é que a IA supere a inteligência humana, mas que acreditemos erroneamente em sua superioridade e deleguemos a ela decisões críticas. Assim, a IA deve ser vista como uma ferramenta complementar, e não como uma substituta da expertise humana.
Como toda revolução, a Inteligência Artificial gera profundas incertezas sobre o futuro. Perguntas inevitáveis surgem: como estará o mundo nas próximas décadas? Como se darão as relações humanas? A economia será ainda mais concentrada? A desigualdade social aumentará ou diminuirá? A soberania dos Estados nacionais será mantida ou sucumbirá ao poder das grandes corporações tecnológicas? O papel das Big Techs na manipulação econômica e social torna-se uma preocupação central, à medida que seus algoritmos influenciam decisões e comportamentos em escala global.
Diante dessas incertezas, a democratização do conhecimento sobre IA é essencial para impedir que seu controle fique restrito a interesses privados e políticos. Como Kaufman destaca, assim como um motorista precisa saber quando frear e quando acelerar, devemos aprender a controlar e regular a IA de maneira responsável. Uma inteligência artificial sem controle é como um carro desgovernado: os riscos são imensos, e os impactos podem ser devastadores para a humanidade.
Parafraseando Antonio Gramsci, vivemos um interregno: o novo está em curso, mas o velho ainda não desapareceu por completo. Impedir essa revolução é impossível, mas cabe à sociedade garantir que a força do capital não se aproprie desse processo de forma exclusiva, aprofundando ainda mais as desigualdades globais. O desafio está em encontrar um equilíbrio entre inovação e regulação, para que a IA seja um instrumento de progresso coletivo, e não um mecanismo de concentração de poder e riqueza.
João Antonio da Silva Filho – Conselheiro do Tribunal de Contas do Município de São Paulo e vice-presidente de Defesa de Direitos e Prerrogativas e Assuntos Corporativos da Atricon