O modelo de democracia ocidental, por ene razões, vive uma de suas maiores crises. Para confirmar, acaba de ser divulgado, pela revista britânica The Economist, o “Democracy Index 2019”. Ele revela um declínio preocupante na qualidade da democracia em escala mundial, incluindo o Brasil, que caiu no ranking dos 167 países avaliados, saindo de uma nota 6,96, em 2018, para 6,87, em 2019 (ver: www.eiu.com).
Pensadores como Guillermo O’Donnell deixam inconteste que o grau de accountability (transparência, prestação de contas e responsabilização) de uma nação depende da existência de instituições de controle efetivas, da qualidade da participação popular (voto livre e mecanismos de reivindicação) e da liberdade de imprensa. A relação dos Tribunais de Contas com a democracia é fecunda. Eles são filhos de uma Constituição democrática, cabendo-lhes, ademais, colaborar com o Parlamento, no exercício do controle externo, zelando pela correta aplicação dos recursos do povo. Quanto mais efetiva for a atuação desses Tribunais, mais eficientes e probas tenderão a ser as políticas públicas que objetivam melhorar os serviços prestados pelos governos aos cidadãos, em saúde, educação e segurança, por exemplo.
Neste ano de eleição, as pontes do controle com a democracia se intensificam. A lei da ficha limpa prevê que as contas julgadas irregulares pelos Tribunais podem, em casos graves, gerar a inelegibilidade de candidatos, sendo um importante filtro em prol da qualidade da democracia e das futuras gestões. Mesmo quando a lista divulgada pelos Tribunais não cause a inelegibilidade, a sua publicidade serve de baliza segura para ajudar os cidadãos a escolherem melhor os seus governantes, especialmente no atual contexto de desinformação propiciada pela enxurrada de notícias falsas.
Ayres Britto alerta que a luta democrática não é vencida por nocaute, mas sim por pontos. Sabedoria do mesmo quilate nos legou Churchill, para quem a democracia é o regime de governo menos imperfeito. Cuidar de reafirmar o compromisso com a democracia e de aprimorar a sua qualidade é dever do cidadão e também das instituições. Bobbio chamou de qualunquismo a indiferença do cidadão perante a causa democrática. Urge evitar essa postura-Pilatos, antes que a onda se transforme num tsunami do tipo “democrexit”. Como no premiado filme de Tom Tykwer, um segundo pode mudar o curso da história e, num trágico avesso da clássica alegoria, nos devolver às cavernas. Corre, Democracia, Corre, Controle, Corre!
Valdecir Pascoal – é Conselheiro e Diretor da Escola do TCE-PE