Corregedor-Geral do TCE-SC palestra em evento na Alemanha que reuniu autoridades do Brasil e da Europa para discutir os desafios e as soluções decorrentes da digitalização da sociedade

Integrantes de instituições públicas e privadas, nacionais e estrangeiras, participaram do Curso Internacional de Alta Formação “Digitalização e Democracia: um diálogo entre Brasil-Europa”, na Universidade Johann Wolfgang Goethe, em Frankfurt, na Alemanha. O objetivo foi intensificar a discussão dos aspectos jurídicos sobre os desafios e as soluções para a crescente digitalização da sociedade, a partir da modelação de padrões regulatórios voltados para a proteção dos direitos e para a inovação. O evento ocorreu de 9 a 12 de outubro.

A programação contou com a palestra do vice-presidente de Relações Internacionais da Associação dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon) e corregedor-geral do Tribunal de Contas de Santa Catarina (TCE-SC), conselheiro Adircélio de Moraes Ferreira Júnior — ele representou a Atricon, a pedido de presidente, conselheiro Cezar Miola, atendendo ao convite realizado pelo presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), José Alberto Simonetti, e pelo diretor-geral da Escola Superior de Advocacia Nacional (ESA), Ronnie Preuss Duarte. 

O evento reuniu ministros do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso — presidente —, Gilmar Mendes e Dias Toffoli; dos ministros do Superior Tribunal de Justiça Ricardo Villas Bôas Cueva, João Otávio de Noronha, Reynaldo Soares da Fonseca, Ricardo Dantas e Luis Felipe Salomão; e dos ministros do Tribunal de Contas da União Benjamin Zymler e da Controladoria-Geral da União Vinicius Marques de Carvalho. 

Também teve a participação de representantes do Conselho Federal da OAB e da ESA — entidade organizadora da iniciativa —; de desembargadores de tribunais de justiça brasileiros; e de membros do Senado Federal, do Conselho Nacional do Ministério Público, do Tribunal Regional Federal e da Advocacia-Geral da União. 

Os painéis contaram, ainda, com exposições de advogados e de jornalistas, e de integrantes de universidades, do Hospital Albert Einstein, do Instituto Brasileiro de Segurança Jurídica, do Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade, da Agência Nacional de Telecomunicações, da Agência Nacional de Transportes Terrestres, do Instituto de Ensino e Pesquisa, entre outros. 

Da Europa, houve apresentações dos membros do Tribunal Constitucional Alemão Stephan Harbarth — presidente — e Gertrude Lübbe-Wolff — ministra emérita —, do promotor público de Hessen Maximilian Wiedemann e de representantes de universidades de Frankfurt, Hamburgo, Giessen, Kiel, Berlim e Innsbruck e de outras instituições públicas e privadas.

Palestra

Ao falar sobre “Novas tecnologias aplicadas nos Tribunais Estaduais e Federais”, no dia 11, o vice-presidente de Relações Internacionais da Atricon e corregedor-geral do TCE/SC, conselheiro Adircélio de Moraes Ferreira Júnior, fez referência aos desafios e às oportunidades da transformação digital, nas diversas áreas, inclusive na de Governo. O assunto também foi objeto de abordagem de Rainer Hamm, professor da Universidade Johann Wolfgang Goethe, e do desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, Cláudio Luís Braga Dell’Orto. A moderação ficou a cargo da tabeliã no 15º Ofício de Notas do Rio de Janeiro, membro da União Internacional do Notariado e especialista em Blockchain Notarial, Fernanda Leitão.

Banner horizontal com uma foto. Na imagem, o conselheiro Adircélio de Moraes Ferreira Júnior está em pé, à direita. Ao fundo e no lado esquerdo, um telão com a projeção de parte da palestra. Com base em estudo da Digital Vortex, que é realizado bienalmente desde 2015, o conselheiro Adircélio destacou o impacto da disrupção tecnológica nos diversos setores e segmentos da economia e da sociedade. Para ele, um dos fatores dessa disrupção é a ascensão da inteligência artificial (IA) generativa. “Não é apenas que o ChatGPT é o primeiro produto ou serviço a atingir 100 milhões de usuários ativos em dois meses após o lançamento, por mais notável que seja. Ainda mais significativo para o próprio setor, é que a IA generativa passou a ser vista como um desafio aos modelos e aos métodos tradicionais em áreas que vão muito além da geração de conteúdo”, afirmou. 

Segundo Ferreira Júnior, nos Tribunais de Contas (TCs), a disrupção já está ocorrendo, a partir da mudança de paradigmas do controle, voltados para a governança pública. Ele ressaltou que atuação proativa, assertiva, prospectiva, preventiva, concomitante e dialógica, com foco nas causas, no resultado, no viés qualitativo, na resolução consensual dos problemas, na celeridade e na agilidade processual e na cultura de inovação, tem pautado o trabalho e a atuação das Cortes de Contas. 

Desafios

Mas o conselheiro assinalou alguns pontos que merecem a atenção dos órgãos de controle. Citou que o processo de transformação digital no mundo externo aos Tribunais de Contas poderá aumentar, diminuir ou modificar as suas competências; que o uso da tecnologia da informação deverá estar amparado em uma estratégia de transformação digital; que é preciso ter um plano efetivo de gerenciamento de mudanças; e que as novas tecnologias deverão ser integradas com sistemas existentes.

Além disso, alertou que a coleta de grandes volumes de dados pessoais demanda uma estrutura de gestão de risco e a elaboração de relatórios de impacto à proteção das informações; que a adoção de novas tecnologias pode ser complexa e necessitar de capacitação contínua; que as decisões baseadas em IA podem ser falíveis e causar injustiças; que a digitalização pode tornar os sistemas mais suscetíveis a ataques; que a IA e a automação não podem prescindir do elemento humano; e que questões sobre a legalidade e a ética do uso de certas tecnologias já são realidade.

“O uso da inteligência artificial no serviço público requer máxima atenção, principalmente sobre as questões legais, éticas, sociais, morais e de privacidade”, enfatizou, ao acrescentar que é preciso “reconhecer a importância do elemento humano, crucial para a empatia e a ética” e para “garantir o monitoramento, a sindicabilidade e a transparência dos algoritmos”.

Durante a sua palestra, relatou algumas situações em que foi utilizada a IA e que corroboram com a sua preocupação. Mencionou uma auditoria do Tribunal de Contas da União que constatou falhas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) no processo de análise de recursos previdenciários, a partir da implementação de algoritmos. Também comentou da carta assinada, em 2023, por mais de 1300 cientistas, alertando sobre o “risco da IA para a humanidade”, e de ações relacionadas ao tema dos Estados Unidos, da União Europeia, do Reino Unido, da China e do Brasil.

Oportunidades

Entre as oportunidades, realçou que a automação e a inteligência artificial podem agilizar processos, liberando recursos humanos para tarefas mais complexas; que as plataformas on-line podem melhorar a transparência e permitir a participação pública em auditorias; e que as análises de dados mais sofisticadas, como descritivas, diagnósticas, preditivas e prescritivas, ajudam na tomada de decisão baseada em dados e evidências.

Apontou ainda que a tecnologia de análise em tempo real permite uma auditoria contínua, concomitante e proativa, aumentando a prevenção e a correção tempestiva; que a utilização de chatbots e de IA pode permitir uma interação mais direta com as partes interessadas; que a análise de dados ajuda a identificar áreas de interesse público para auditorias mais focadas; que as tecnologias podem trazer inovações disruptivas e servir como um modelo para outras instituições públicas em termos de boa governança.

Como exemplos de tecnologias exponenciais contemporâneas para os TCs, destacou o big data, o business inteligence — utilizado na ferramenta Farol TCE/SC, para permitir o controle social de ações dos governos do Estado e dos 295 municípios catarinenses —, o blockchain, o superapps — aplicativos que reúnem, em um mesmo ambiente, uma variedade de serviços, facilitando o dia a dia das pessoas, como o projeto “Na ponta do lápis”, do Governo Federal, usado por alunos, pais, e gestores da escola —, o metaverso, o Omnichannel, e a internet das coisas (IoT) e o 5G em cidades inteligentes (smart cities).

Em Tribunais de Contas, explicou que a IA é utilizada para a análise de documentos legais; detecção de irregularidades; monitoramento em tempo real; classificação de casos; atividades e rotinas administrativas; análise de sentimento, por meio do acompanhamento de redes sociais e de outras plataformas on-line; otimização de processos internos; atendimento ao cidadão; elaboração de proposta de votos de conselheiros e de pareceres técnicos; e automatização de tarefas rotineiras.

Diretrizes de Governo Digital

Em sua exposição, o conselheiro Adircélio informou que, em 2022, a Atricon, o Instituto Rui Barbosa (IRB), a Associação Brasileira dos TCs dos Municípios (Abracom), o Conselho Nacional de Presidentes dos TCs (CNPTC) e a Associação Nacional dos Ministros e Conselheiros Substitutos dos TCs (Audicon) assinaram nota recomendando que os Tribunais de Contas brasileiros considerassem a edição de atos normativos internos de adesão aos comandos da Lei 14.129/2021

A medida tinha como objetivo efetivar os princípios e as diretrizes do Governo Digital e da eficiência pública, visando à promoção do desenvolvimento tecnológico e da inovação e a aplicação da inteligência de dados. No documento, as entidades representativas sublinharam os ganhos de eficiência e de eficácia na atividade-fim dos TCs, possibilitados pela utilização de modernas técnicas e da ciência de dados, auxiliando no planejamento, na identificação tempestiva, preventiva e automatizada de riscos e de indícios de irregularidades e na avaliação de achados de auditoria.

Para o conselheiro, um tribunal de contas contemporâneo tecnologicamente disponibiliza serviços digitais centrados no cidadão; tem uma estratégia de transformação digital; tem uma visão holística de pessoas, processos e tecnologia; pensa exponencialmente; estimula inovação aberta e promove inovação fechada; faz uso de tecnologias exponenciais; toma decisões baseadas em dados; e tem governança de tecnologia da informação. Trouxe como um movimento nessa direção, a criação, no TCE/SC, do Laboratório de Inovação do Controle Externo (Lince)

Programação

programação do Curso Internacional de Alta Formação “Digitalização e Democracia: um diálogo entre Brasil-Europa” contemplou, ao todo, 20 painéis. Regulação dos serviços digitais, direitos humanos e desinformação; saúde e inovação; democracia combativa e jurisdição constitucional; arbitragem; inteligência artificial; sustentabilidade; contratos eletrônicos; cibercrimes; computação em nuvem; papel da mídia; softwares de investigação; fé pública; e eleições foram alguns dos temas debatidos.

Fonte: TCE-SC