O hino da independência e a importância da independência dos Tribunais de Contas

Morgana Bellazzi de Carvalho

Na proximidade da comemoração do 7 de setembro, a história interessante do hino, que registra nossa independência de Portugal, cabe ser rememorada. Quem compôs a letra foi o brasileiro Evaristo Ferreira da Veiga e Barros (1799-1837), que era jornalista (foi fundador do jornal A Aurora Fluminense), político (foi deputado por Minas Gerais) e poeta (foi patrono da Academia Brasileira de Letras e ocupou a cadeira 10, sucedido por Rui Barbosa).

A composição é anterior ao grito do Ipiranga. Evaristo da Veiga o escreveu em formato de poema em agosto de 1822 e o publicou como “Hino Constitucional Brasiliense”. O texto agradou a Corte carioca e foi musicado pelo maestro português Marcos Antônio da Fonseca Portugal (1760-1830).

Amante da música, D. Pedro I (1798-1834) gostou dos versos de Evaristo da Veiga e resolveu criar outra melodia para o poema, oficializando-o, em 1824, como o Hino da Independência. Por quase uma década, muitos acreditavam ser de sua autoria não só a melodia como também a letra do hino.

Contudo, em 1833, os direitos autorais foram reivindicados por Evaristo da Veiga que comprovou ser o autor dos versos. Os originais manuscritos se encontram na Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro.

Esse fato prestigia e reforça o conceito que se tem de independência. Afinal, se não tivesse havido naquele caso um exame independente (isento e imparcial), ainda poderíamos estar atribuindo equivocadamente a autoria da letra do hinoa D. Pedro I.

Em outra seara, na do controle externo, o substantivo feminino “independência” é extremamente relevante. Trata-se de um princípio caro, que dá título à NBASP 10 – Norma Brasileira de Auditoria do Setor Público, tradução para o português da Declaração do México sobre a Independência das Entidades Fiscalizadoras Superiores (EFS), que constitui a ISSAI 10.

Sem independência não é possível assegurar que os relatórios de auditoria e as decisões dos Tribunais de Contas são isentas e imparciais e que se baseiam apenas em aspectos técnicos e objetivos estando livres de influências externas.

Ter um órgão independente de governos e de governantes a que se atribua o controle da aplicação dos recursos públicos, da prestação de serviços públicos e da avaliação de políticas públicas, seja no aspecto da legalidade, da economicidade ou da eficiência, é fundamental.

E vale o registro de que a previsão de independência deve atingir também os membros e todo o quadro funcional dos Tribunais de Contas. Mandatos vitalícios e estabilidade nos cargos e empregos públicos são mecanismos que apoiam julgamentos e exames independentes. Afora esses, a NBASP 10, considera ideal para garantir a independência que haja:

Acesso irrestrito a informações;

Independência no desempenho de suas competências;

Prevenção ao conflito;

Adoção de medidas em casos que afetem a independência;

Direito e obrigação de informar sobre o trabalho realizado;

Liberdade de decidir o conteúdo e o momento oportuno de publicação e divulgação de seus relatórios de auditoria;

Utilização de mecanismos eficazes de monitoramento das deliberações;

Cooperação interinstitucional sem prejuízo da independência e da autonomia;

Autonomia financeira e gerencial/administrativa e disponibilidade de recursos humanos, materiais e monetários adequados.

A independência, como liberdade para cumprir as funções constitucionais de realizar o controle financeiro externo, possibilita que os Tribunais de Contas desempenhem sua principal atividade de fiscalizar o uso dos dinheiros públicos a partir de critérios técnicos e de evidências objetivas.

A sociedade se beneficia da independência dos Tribunais de Contas na medida em que a partir do exame independente realizado pode confiar que o controle financeiro externo cumpre seu papel, que a finalidade da fiscalização é atingida e que o desvio e o mal uso do dinheiro do cidadão são combatidos.

Numa democracia é indispensável que os Tribunais de Contas tenham independência para exercer suas atribuições de forma criteriosa, com firmeza e isenção. Tribunais de Contas independentes garantem o direito do cidadão de exigir contas (art. 15 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789).

E como destacou a ATRICON – Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil, em um post recente, “Em anos eleitorais, os Tribunais de Contas são ainda mais essenciais, pois fiscalizam e tornam transparente a atuação dos representantes políticos. Em tempos de desinformação, o controle externo informa os cidadãos e torna o voto um instrumento ainda mais consciente”.

Assim, lembremos do refrão do hino da independência, “Brava gente brasileira, longe vá temor servil, ou ficar a Pátria livre, ou morrer pelo Brasil”, e comemoremos a independência dos Tribunais de Contas!

Morgana Bellazzi de Carvalho – Auditora de Contas Públicas do Tribunal de Contas do Estado da Bahia (TCE-BA)