Anos atrás publiquei um artigo intitulado “Onde se aprende o racismo” no qual refletia sobre episódios de racismo sofridos por crianças e até bebês negros em ambientes como creches, pré-escolas, parquinhos infantis e festinhas de aniversário. Alguns desses episódios vivenciei pessoalmente, pois meu filho é negro.
A realidade que muitos insistem em não reconhecer, para justificar a sua inação, é que o racismo está profundamente entranhado na sociedade brasileira. Está presente todos os dias, em toda parte e é naturalizado num sem-número de atitudes, protocolos e “brincadeiras”.
Negar o racismo é alimentá-lo. Ignorá-lo é deixá-lo confortável. Ao contrário, devemos denunciá-lo, incomodá-lo e confrontá-lo o tempo todo.
A atitude e o discurso racistas devem ser expostos publicamente. Seus autores devem ser identificados e apontados. O racista precisa experimentar o mesmo constrangimento público a que expõe suas vítimas.
Esta semana participei da Oficina sobre os Desafios da Educação Antirracista no III Congresso Internacional dos Tribunais de Contas, realizado em Fortaleza.
Lá foi divulgada a pioneira e extraordinária experiência do TCE do Rio Grande do Sul. Há dez anos a Corte de Contas gaúcha incluiu na sua matriz de fiscalização a verificação do cumprimento do art. 26-A da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB (Lei 9.394/1996). Referido dispositivo, introduzido em 2008, torna obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos e privados.
Ao lado de outras instituições, como o Ministério e a Defensoria Públicas, sindicatos e universidades, o TCE gaúcho compõe um grupo de trabalho permanente dedicado exclusivamente à fiscalização do cumprimento da lei, que tem sido objeto de auditorias específicas. A ideia é que o atendimento à previsão legal não seja apenas formal, mas inserido no contexto de uma educação inclusiva e antirracista.
Para isso são sensibilizados os conselhos municipais de educação, as entidades de professores e diversas outras organizações sociais.
A avaliação acerca do grau de cumprimento do art. 26-A é obrigatoriamente incluída nos relatórios sobre as contas de governo municipais que informam os Pareceres Prévios emitidos pelo TCE-RS e encaminhados para o julgamento pelas Câmaras Municipais.
Para maiores detalhes, foi publicado o livro Educação Antirracista – Fiscalização e desafios, disponível gratuitamente aqui. O TCE gaúcho também disponibiliza um curso sobre educação antirracista.
Diversos outros tribunais de contas estão adotando iniciativas de combate ao racismo, a exemplo de Santa Catarina e do TCU. A contribuição dos tribunais de contas é muito bem-vinda nesta luta e engrandece o papel dos órgãos de controle externo como essenciais à democracia e à boa execução das políticas públicas.
Luiz Henrique Lima – conselheiro substituto do TCE-MT