PGR considera improcedente ADI proposta pelo Partido Novo contra consensualismo

O procurador-geral da República, Paulo Gonet, emitiu parecer, nesta terça-feira (01), pela improcedência da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) proposta pelo Partido Novo contra a atuação do Tribunal de Contas da União (TCU) na realização de consensualidade. Essa é uma grande notícia para o Sistema Tribunais de Contas.

A ADI questionava a Instrução Normativa nº 91/2022 do TCU, que implementou a Secretaria de Controle Externo de Solução Consensual e Prevenção de Conflitos (SecexConsenso) e que trata da solução consensual de controvérsias relevantes e da prevenção de conflitos envolvendo órgãos e entidades da Administração Pública Federal. Neste caso, a Atricon ingressou como amicus curiae no processo.

Paulo Gonet descartou as alegações do Partido Novo de que o consensualismo viola os princípios da separação de Poderes e da legalidade e sustentou que a SecexConsenso promove maior segurança jurídica e está em conformidade com a legislação brasileira.

Além disso, no parecer, o procurador-geral da República destacou que a legislação já contém vários dispositivos que promovem o uso de soluções consensuais na Administração Pública, como a Lei 13.140/2015 (Lei de Mediação) e o Código de Processo Civil. Essas normas legitimam o papel de órgãos públicos, incluindo o TCU, em facilitar acordos que visem a resolver controvérsias administrativas.

>> Leia o parecer do procurador-geral da República.

Antes mesmo do parecer de Paulo Gonet, a Advocacia-Geral da União (AGU) também já havia se manifestado em favor do funcionamento da SecexConsenso. A AGU sustentou que o controle exercido pelo TCU é concomitante e preventivo, e não interfere na autonomia dos órgãos administrativos. Segundo o advogado-geral da União, Jorge Messias, o papel da Corte é o de mediador, e não de gestor público, garantindo a “legalidade e a economicidade” dos acordos.

Vale lembrar que um grande ato de consensualismo realizado no Brasil se deu no início de julho, quando, com a negociação intermediada pelo TCU e pelos Tribunais de Contas Estaduais da Bahia e de Mato Grosso, o governo baiano foi autorizado a comprar do governo moto-grossense, 40 composições de trens, com sete vagões cada, e equipamentos necessários à instalação do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) em Salvador. Já o governo mato-grossense deixou de ter um passivo herdado dos projetos fracassados da Copa do Mundo de 2014. O montante estimado com a transação é de R$ 1 bilhão.

O presidente da Atricon, Edilson Silva, comemorou a notícia sobre o parecer do procurador-geral da República. Segundo ele, o posicionamento aponta que a atuação do TCU não interfere na autonomia de vontade das partes na busca de acordos. “Além disso, está claro no parecer que essa atuação marcante do TCU não viola os princípios republicanos da moralidade ou da separação de Poderes”, afirmou.

Amicus Curiae

Na peça em que pediu sua habilitação como amicus curiae no processo do consensualismo, a Atricon afirmou ser “induvidoso que o entendimento que vier a ser prolatado [pelo STF] poderá ter reflexos sistêmicos, impactando na autonomia e no exercício das competências constitucionais dos demais Tribunais de Contas”.

Além disso, a associação destacou experiências de diversas Cortes de Contas com base no espírito do consensualismo. Entre elas, a criação de Mesas Técnicas nos Tribunais de Contas dos Estados de Mato Grosso, Rondônia, Sergipe e Bahia, além do Tribunal de Contas dos Municípios de São Paulo (TCM-SP). Já no Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco (TCE-PE) foi criada a Mesa de Mediação e Conciliação. O trabalho desenvolvido por esses órgãos internos tem gerado eficiência e economia aos cofres públicos.

Além da Atricon, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (MPTCU) também pediu sua habilitação na condição de amicus curiae na ADPF 1.183/DF. O MPCTCU lembrou, na peça, que “a legislação brasileira não apenas permite, mas determina que a solução consensual de conflitos seja buscada pelas partes e pelos agentes públicos envolvidos na lide, inclusive por meio de autocomposição entre pessoas jurídicas de direito público. “Dessa forma, o gestor úblico que buscou a estrutura do TCU para repactuar contratos, por conveniência e oportunidade da Administração, agiu de acordo com seu poder discricionário e com as balizas legais aplicáveis à espécie”, defendeu.

Histórico

O tema não é novidade dentro do Sistema Tribunais de Contas. Em 2022, a Atricon editou a Nota Recomendatório nº 02 em que recomenda às Cortes de Contas, “dentro de uma perspectiva de atuação marcada pela consensualidade, considerem sempre que possível e nos termos do ordenamento jurídico, a adoção e a implementação de normas voltadas à solução consensual de conflitos quando do enfrentamento de temas controvertidos relacionados à Administração Pública e ao controle externo, com o objetivo de efetivar os princípios da eficácia e da eficiência, de forma a prestigiar ações de controle preditivo e preventivo”.

O documento recomenda, ainda, que os Tribunais “considerem a possibilidade de criação e regulamentação e procedimentos processuais de audiência, com ou sem a finalidade conciliatória, de forma a buscar a abrangente participação das partes envolvidas, segurança jurídica, transparência e economia de tempo, proporcionando ainda maior adequação das decisões às especificidades das situações e a correção de inconformidades e de irregularidades de forma célere e eficaz”.

E foi exatamente isso que o TCU fez ao criar a SecexConsenso, que atuou de forma decisiva para o acordo firmado entre os governos da Bahia e de Mato Grosso.

Em debate

Em agosto deste ano, o tema central de evento promovido pelo TCE-RJ e pelo Instituto Rui Barbosa (IRB) foi o “Consensualismo nos Tribunais de Contas”. Esse encontro teve como objetivo proporcionar a troca de experiências sobre normativos, boas práticas, acompanhamentos e resultados decorrentes de ações de consensualismo adotadas pelas Cortes de Contas.

Neste encontro, o vice-presidente de Relações Jurídico-Institucionais da Atricon, conselheiro Carlos Neves, ressaltou a crescente relevância do assunto em âmbito nacional: “Esse tema já vinha em um processo de crescente debate no Brasil e, recentemente, essa pauta tomou ares nacionais”, lembrou na ocasião. “Institucionalmente, é hora de apresentarmos soluções em cada Tribunal de Contas do Brasil”, defendeu.

Entre as experiências já realizadas pelo Sistema Tribunais de Contas, ressaltou-se a redução do estoque processual, o aumento da segurança jurídica e a promoção de benefícios para a sociedade e para o interesse público. Ou seja, a ação do TCU na intermediação do acordo da compra de trens realizada pelo Governo da Bahia do Governo de Mato Grosso não é um caso isolado de consensualismo na administração pública brasileira.