O Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul (TCE-RS) realizou seminário sobre a qualidade do gasto e outras ações públicas de saúde na última segunda-feira (23). Durante todo dia foram debatidos temas afetos à área em sete painéis mediados pelo auditor público externo Gonçalino Mesko da Fonseca.
As apresentações trouxeram, principalmente, exemplos e discussões sobre a importância das ações fiscalizadoras nas instituições de saúde.
A primeira exposição, feita pelos auditores federais de controle externo do Tribunal de Contas da União (TCU), Claudio Augusto Prates e Daniel Saldanha Toledo, mostrou casos já finalizados de auditorias realizadas em hospitais federais no Rio Grande do Sul. Prates falou sobre a situação ocorrida em 2001 no Grupo Hospitalar Conceição (GHC) de Porto Alegre, com problemas de fraude apontados na aquisição de órteses e próteses. Toledo trouxe exemplos mais recentes das inspeções feitas em instituições como os dos Hospitais Universitários de Santa Maria, Pelotas, Rio Grande e o Hospital de Clínicas de Porto Alegre, onde foram assinalados problemas na obtenção de medicamentos, deficiência nos indicadores de reposição e no planejamento das aquisições de materiais, entre outros apontamentos.
Ambos os palestrantes ressaltaram a importância do trabalho dos órgãos de controle na busca da eficiência dos gastos públicos no setor da saúde. “O TCU tem evoluído nos últimos anos na sua forma de trabalho para uma abordagem mais operacional das auditorias. Consideramos mais eficiente esse formato para a prevenção dos futuros desvios. O nosso enfoque tem sido muito mais na correção das atuais gestões dos órgãos que estamos auditando”, ressaltou Toledo.
Qualidade para além dos gastos
Em seguida, foi a vez do Dr. Stênio Dias Pinto Rodrigues, do Departamento Nacional de Auditoria do Sistema Único de Saúde (DENASUS), explicar a importância das fiscalizações realizadas pelo Sistema Nacional de Auditoria (SNA). Para ele, as inspeções deveriam se preocupar também com a qualidade de vida do paciente que recebe a prótese, e não só com os gastos gerados pela intervenção cirúrgica. “O superfaturamento numa prótese é um dano econômico, mas quando não temos certeza de que o cidadão recebeu o tratamento correto, ele terá um dano para toda a vida”. O palestrante contou que alguns pacientes começam a ter problemas nas próteses alguns anos depois do procedimento. “Isso faz com que seja necessário um novo tratamento, gerando outro gasto”, explica. A solução, na opinião de Stênio, seria que as auditorias também se preocupassem em averiguar a qualidade do tratamento.
Além disso, ele acredita que a auditoria é uma forma eficaz de prestar contas à população, que muitas vezes tem dúvidas e questionamentos sobre a qualidade e os investimentos em saúde em sua região ou município.
Tratamento eficiente
Seguindo o ciclo de palestras, o juiz do Tribunal Regional Federal 4ª Região (TRF4), Dr. Francisco Donizete Gomes, trouxe ao debate o comprometimento orçamentário do SUS e o baixo repasse da União na área da saúde pública. Entre os apontamentos, o magistrado defendeu a necessidade de realizar perícias baseadas em evidências como uma solução de reter gastos. Para ele, somente através da verificação e identificação do medicamento ou do processo médico necessário é que ocorre um tratamento eficiente. “É um conceito cientifico que diz que determinado medicamento é o adequado para aquele paciente”, afirmou o juiz. No caso das órteses, próteses e materiais especiais, além de medicamentos como os oncológicos, Francisco sustenta que a implementação passo-a-passo das Câmaras Técnicas agiria como uma estrutura fiscalizadora. Com relação a soluções para uma qualidade de gastos e ações que melhorem a saúde publica, o juiz explica que há uma necessidade de melhorar a gestão e, principalmente, a forma de cumprir as decisões judiciais. “É necessário aumentar a participação da União em gastos na saúde pública ou então será preciso estabelecer um limite no atendimento e isso provocaria o não atendimento de algumas pessoas”, completou.
Em busca da solução
Abrindo as conversas da tarde, o professor da Universidade Federal de Ciências Médicas de Porto Alegre (UFCSPA) Dr. Alberto Kaemmerer salientou em sua participação o problema da institucionalização da corrupção no Brasil. Segundo ele, as fraudes das órteses, próteses e medicamentos especiais não são novidades. As irregularidades só apareceram com a crise econômica e com os recursos diminuindo. Com relação ao posicionamento na solução do meio prejudicado, Kraemmerer não defende a criação de legislação. Afirma que a solução envolve três pontos, e define médicos, hospitais e as operadoras de planos de saúde como instituições que precisam se posicionar para solucionar o problema. Defende, também, que a solução não pode ser jogada na mão do Judiciário. O Poder não possui balizamento técnico e comercial. “É preciso juntar as instituições com a Justiça e pedir que apoie as soluções técnicas, gerando medidas certas para a atual situação do sistema”.
O médico ainda se posiciona quanto à compra de material na saúde. “É como se essa negociação fosse comum. São equipamentos que vão mudar a vida das pessoas para melhor ou para pior. Portanto, cabe uma decisão de comitê técnico qualificado, da alta organização do hospital, para que existam responsáveis pelas transações comerciais, para que sejam posteriormente responsabilizados”, afirma.
A necessidade da regulação
Logo após, o Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul (MPE) teve espaço de fala com a apresentação do Dr. Mauro Souza sobre, principalmente, a função do órgão ministerial e a juridicialização na área da saúde. O promotor destacou que a atenção primária precisa ser o grande regulador do Sistema Único de Saúde e que o MPE vem trabalhando na sua qualificação e ampliação, para que, dessa forma, se reduza os custos e a necessidade dos atendimentos de alta complexidade. “Alguns problemas que tivemos de regulação aqui no Estado, inclusive em próteses e órteses, estavam ligados à atenção primária em saúde. Isso porque, às vezes, o encaminhamento não é adequadamente feito e a solução dada não é resolutiva como deveria. Isso acaba estourando lá na ponta, em internações de alta complexidade, de alto custo e em UTIs”. Nesse sentido, a coordenadora de Auditoria Médica do Rio Grande do Sul (CAMERS), Dra. Geila Vieira, destacou que é “preciso discutir sobre a Atenção Básica de Saúde e não resolver maus encaminhamentos de doenças”.
Mudança de cultura
O juiz de Direito do Estado do RS, Dr. Martin Schulze, também falou sobre a judicialização da saúde. Ele explicou a importância do Comitê Estadual do Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde, que tem como objetivo promover uma mudança de cultura nos gestores da saúde, já que o Rio Grande do Sul é líder em processos judiciais relacionados a esta área. “É preciso chamar o gestor à responsabilidade, para que ele entenda que é necessário atender diretamente ao cidadão, e não através de uma demanda judicial”, afirma. O juiz complementou dizendo que todos os envolvidos na prestação de serviços de saúde, desde o atendente do posto até o secretário do município, precisam estar preparados para satisfazer imediatamente as necessidades da população. “Esta forma será mais econômica para o Estado e mais ágil para o cidadão”, finaliza.
A solução está no próprio sistema?
A defensora pública do Rio Grande do Sul, Paula Pinto, foi a última painelista do seminário. Destacou que o importante na área da saúde é saber quem é o responsável para que o ente seja acionado. Na maioria dos casos, até mesmo quando pacientes necessitam de medicamentos que não são fornecidos gratuitamente pelo Estado, a situação pode ser resolvida fora do Poder Judiciário. “A judicialização não é a melhor forma de resolver o problema na saúde pública”.
A defensora contou que, em 2009, foi criada a 10ª Vara da Fazenda Pública, especializada na área da saúde. A partir de então, foi possível verificar os processos in loco. Paula ressaltou que houve mudança de cultura, ou seja, entendeu-se que a solução está no próprio sistema e não há por que levar os caos à Justiça. “Na maioria das situações, a tendência é o Poder Judiciário ficar cada vez mais em contato com SUS”, explica.
Ela esclareceu, ainda, que, em qualquer caso, a porta de entrada é a Unidade Básica de Saúde e quem deve fazer o cadastro do paciente, inclusive para receber medicamentos que não são fornecidos pelo Estado, é a Secretaria Municipal da Saúde.
Fonte: Assessoria de Comunicação Social (Priscila Oliveira)