A relação das recentes manifestações em todo o Brasil e, especialmente, em Florianópolis — contra o aumento das tarifas de transporte público, a aplicação de recursos públicos na construção de estádios, a falta de investimentos em saúde e educação —, com o papel que o Tribunal de Contas de Santa Catarina vem desempenhando na fiscalização das contratações de bens e serviços e no combate à corrupção dos atos da Administração Pública. Foi assim que o presidente do TCE/SC, conselheiro Salomão Ribas Junior, iniciou seu discurso durante a sessão ordinária do Pleno desta quarta-feira (19/6), ocasião em que foram celebrados os 20 anos da Lei de Licitações — lei federal nº 8.666/93 —, completados nesta sexta-feira (21/6).
Ao fazer uma reflexão sobre a atuação da Corte de Contas frente a algumas dessas situações, Ribas Jr. destacou que a Instituição precisa avançar mais para coibir atos de corrupção e para contribuir, por exemplo, na definição dos preços das tarifas de transporte coletivo, a partir da análise de editais de concessão. Ele informou que há uma proposta no Planejamento Estratégico do TCE/SC 2013-2016 para a realização de levantamento nos 295 municípios catarinenses e no Estado sobre a situação das concessões e se foram feitas de acordo com a legislação.
Desde o advento da Lei de Licitações, o Tribunal vem adotando medidas para aprimorar a fiscalização de licitações e contratos da Administração Pública, trabalho intensificado com a criação, em 2007, da Diretoria de Controle de Licitações e Contratações (DLC). Entre as principais atividades desenvolvidas pela DLC, o presidente citou a análise de editais e de representações contra irregularidades na aplicação da Lei, a realização de auditorias para verificação da execução de obras e serviços de engenharia, e a orientação aos jurisdicionados (Quadro 1).
Ressaltou que uma das formas mais efetivas de atuação do Tribunal de Contas, quando são constatadas irregularidades que podem causar dano ao erário ou a direito dos licitantes, é a prerrogativa de suspensão cautelar dos editais, prevista na Instrução Normativa n. TC 05/2008. Com essa medida, explicou, a licitação apenas tem seguimento quando houver a correção do edital ou forem acatadas as justificativas da unidade gestora, de forma a assegurar a ampla competitividade e a vantajosidade da futura contratação.
A Lei de Licitações foi criada para moralizar os processos de contratação, trazendo procedimentos mais rígidos, norteados pelos princípios constitucionais, aliados ao da seleção da proposta mais vantajosa, do julgamento objetivo e da vinculação ao instrumento convocatório. Segundo Ribas Jr., o Governo — União, estados e municípios — destina para aquisições 15% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. “Algo entre R$ 500 e R$ 600 bilhões por ano que devem ser gastos conforme mandam os princípios gerais da Constituição e da Lei de Licitações”, ressaltou. “Muita gente acha que a Lei é um entrave, mas há aqueles que reconhecem que sem ela os casos de fraude e corrupção, envolvendo processo de compras e financiamento eleitoral, seriam infinitamente pior”, acrescentou.
Em sua manifestação, o presidente salientou que o processo de contratação de bens e serviços não deve ser apenas olhado sobre a ótica do menor preço, mas dentro da perspectiva do incentivo à prestação de serviços por micro e pequenas empresas e que levem em conta critérios da sustentabilidade. “É preciso que o administrador mude a cultura de aquisições e que o Tribunal de Contas mude a cultura do controle”, defendeu, referindo-se aos desafios a serem alcançados.
Para poder exigir dos órgãos fiscalizados que as contratações de bens e serviços públicos também adotem critérios de sustentabilidade, o TCE/SC pretende aprovar, ainda em 2013, um ato normativo para as suas licitações. “Isso nos dará autoridade para buscarmos uma fiscalização mais consequente”, afirmou. Ribas Jr. adiantou que os estudos para elaboração da nova norma terão como base o resultado de uma auditoria operacional conjunta das Diretorias de Atividades Especiais (DAE) e de Controle de Licitações e Contratações (DLC) que será realizada no Departamento de Compras e Contratos, vinculado à Diretoria de Administração e Finanças (DAF) do Tribunal.
A auditoria vai avaliar o funcionamento do sistema de licitações e os critérios de sustentabilidade utilizados nas contratações da Instituição. “Vamos verificar se já estamos cumprindo as regras da Lei de Licitações, em especial, quanto aos aspectos de sustentabilidade ou se temos a possibilidade de cumpri-los”, explicou, salientando as providências adotadas pelo TCE/SC de acordo com os conceitos de sustentabilidade, como foi o caso da construção do novo prédio, a aquisição de materiais de consumo, o estímulo à impressão em frente e verso e a substituição de material descartável por material permanente.
O conselheiro acredita que o documento vai servir de referência para os órgãos públicos do Estado e dos municípios catarinenses sujeitos à fiscalização do Tribunal. “Nossa proposta é também oferecer um instrumento útil de consulta para elaboração de editais de licitação, de termos de referência e de especificações que ajude os agentes públicos a usar o poder de compra da Administração Pública em favor do desenvolvimento sustentável e de políticas que busquem a formação e recuperação de um ambiente ecologicamente equilibrado, para as atuais e futuras gerações”, afirmou, ao lembrar do papel da Instituição no campo da orientação aos gestores públicos. “É a melhor maneira para exigirmos dos fiscalizados idêntico procedimento”, avaliou.
Outros desafios
Apesar dos avanços trazidos pela lei federal n. 8.666/93, nesses 20 anos foram necessárias inúmeras adequações de seus dispositivos e mesmo a edição de novos textos normativos, como forma de imprimir maior agilidade e eficiência aos processos de compra e contratações da Administração Pública. A título exemplificativo, o presidente Ribas Jr. mencionou a lei federal n. 10.520/2000 (Lei do Pregão) — criada para garantir a isonomia para a seleção da proposta mais vantajosa —, a lei 8.987/95 (Lei das Concessões) e a lei 11.079/2004 (Lei das Parcerias Público-Privadas).
Também se referiu à lei n. 12.462/2011, que instituiu o Regime Diferenciado de Contratações (RDC). Inicialmente restrito ao âmbito federal e às obras da Copa do Mundo de 2014 e às Olimpíadas de 2016, o RDC vem sendo ampliado para as demais esferas e outras espécies de contratação, tais como as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), do Sistema Único de Saúde (SUS) e aquelas voltadas aos sistemas públicos de ensino.
Para fazer frente a essas alterações, Ribas Jr. salientou que o Tribunal de Contas vem investindo fortemente na capacitação de seus técnicos. Inclusive, na área de Concessões de Serviços Públicos promoveu uma pós-graduação, iniciada em 2011 e com término previsto para este ano. “Tal capacitação se faz necessária em face da relevância desses serviços para a população e o grande volume de recursos públicos envolvidos na contratação”, concluiu.
Embora tenham sido editados novos textos normativos, tramitam diversas proposições no Congresso Nacional, sendo que, no dia 13 de junho, o Senado instituiu uma comissão temporária, que propõem a modernização do texto da Lei de Licitações. “Os Tribunais de Contas devem fazer um movimento em defesa da modernização da Lei”, apontou o vice-presidente do TCE/SC, conselheiro Luiz Roberto Herbst. Na mesma direção foram as palavras do corregedor-geral, conselheiro César Filomeno Fontes. “Esse diploma legal tem que ser aprimorado para que seja observada a qualidade nas aquisições e não apenas o menor preço”, ponderou Fontes.
Quadro: Atividades desenvolvidas pela DLC
1. Análise de editais – todas as licitações nas modalidades concorrência, bem como pregões, dispensas e inexigibilidades de licitação com valor equivalente à concorrência, devem ser encaminhadas pelas unidades fiscalizadas ao TCE/SC, por meio do Sistema ECO-NET, a partir do qual são selecionados para autuação, por amostragem, com base em fatores de risco e materialidade.
2. Análise de Representações fundamentadas no §1º do art. 113 da lei federal nº 8.666/93 – qualquer licitante, contratado ou pessoa física ou jurídica pode representar ao TCE/SC contra irregularidades na aplicação da Lei, sendo que esse processo é considerado de natureza urgente e, nesta condição, tem tramitação preferencial.
3. Auditoria em execução de obras e serviços de engenharia – para avaliar aspectos quantitativos e qualitativos dos serviços prestados à Administração Pública.
4. Orientação aos jurisdicionados – para colaborar na prevenção de irregularidades e promoção de melhorias nos processos de aquisição e contratação de bens e serviços. Iniciativas nessa direção são a realização de 14 etapas dos Ciclos de Estudos de Controle Público da Administração Municipal, e a aproximação com gestores e agentes públicos, tanto em reuniões agendadas na sede do TCE/SC quanto em contatos por meio eletrônico ou por telefone.