Será realizada pelo Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo (TCE-ES) uma audiência pública para debater a utilização por parte da administração pública de modelo de negócio denominado “locação de ativos precedida de direito real de uso das áreas”.
A discussão foi aberta em Plenário, após representação protocolada pelo Ministério Público Estadual. O órgão questionou a realização de uma licitação pelo Serviço Autônomo de Água e Esgoto de São Mateus (Saae), que se utilizou do modelo inédito no Estado.
No caso concreto, o Saae contratou o consórcio Águas do Cricaré, após licitação, para a construção da infraestrutura de esgoto em terrenos da prefeitura. Em troca, a administração deverá efetuar pagamentos mensais ao consórcio. Após o fim do contrato, de 30 anos, o local, bem como toda infraestrutura, é revertido ao patrimônio municipal.
Sem precedentes em outras Cortes de Contas e no sistema jurídico nacional, o modelo de locação de ativos passou por análise da área técnica do TCE-ES e pelo Ministério Público de Contas em um processo de estudo de caso especial – ou seja, separado do processo que trata especificamente da representação. Ambos pereceres foram contrários à possibilidade.
Tendo em vista a repercussão social e jurídica da decisão da Corte, o relator, conselheiro Rodrigo Chamoun, votou pela realização da audiência pública, no que foi acompanhado à unanimidade.
“Ao dirimir o conflito sobre a viabilidade jurídica, ou não, do contrato de locação de ativos, estaremos por ensejar impacto sobre políticas públicas que objetivem o acesso da população a condições mais dignas quanto à necessária infraestrutura para a prestação de serviços essenciais aos cidadãos brasileiros. Nesse passo, entendo ser necessária a realização de audiência pública por este Tribunal”, disse o relator em seu voto.
Chamoun ainda ressaltou que a audiência irá ouvir especialistas e representantes da sociedade civil organizada sobre a preservação, ou não, do interesse público e sobre as vantagens e desvantagens na utilização do modelo. O fato é inédito na Corte, que se utilizará, como base normativa, do regimento do Supremo Tribunal Federal (STF).
Audiência
Atualmente, há carência no regimento interno do TCE-ES para a realização de audiência pública. O mesmo ocorreu com o Supremo Tribunal Federal em 2007, na ocasião do debate sobre a utilização de células-tronco para fins de pesquisa e terapia. A ausência de norma não impediu a realização da audiência, que seguiu modelo adotado pela Câmara Federal.
Dessa forma, e seguindo orientação da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil, por meio do Manual de Boas Práticas Processuais dos Tribunais de Contas, foi definida a realização da audiência pública em data a ser agendada.
Algumas diretrizes, porém, já foram elencadas pelo conselheiro Chamoun, como: a seleção dos inscritos caberá ao relator do processo, dentre aqueles que tiverem experiência e autoridade na matéria objeto do debate, devidamente comprovados; os depoimentos serão divididos em dois blocos de especialistas, sendo um bloco a favor da tese de possibilidade jurídica de a administração contratar por meio do modelo de negócio denominado “locação de ativos precedida de direito real de uso das áreas”, e outro bloco que defenda posicionamento contrário; cada especialista terá 15 minutos para sustentar oralmente sua posição.
Foi definido ainda que a data de realização da audiência será marcada no prazo de 30 dias a partir da convocação em diário Oficial.
O processo do caso concreto, TC 7639/2011, está atualmente sob a análise do Núcleo de Obras e Engenharia do TCE-ES.