Painel trata da complexidade do financiamento de serviços públicos no contexto federativo

O painel “Responsabilidade Social e Escala Federativa dos Serviços Públicos – Capacidade de Financiamento dos Entes Federativos” reuniu dois pesquisadores com olhares diferentes sobre os desafios para garantir o adequado financiamento de serviços públicos em um modelo federativo como o brasileiro, com entes autônomos nas três esferas: União, estados e municípios. Mediado pelo conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Paraná e ex-presidente do Instituto Rui Barbosa (2018-2022), Ivan Bonilha, o painel trouxe os pontos de vista da professora da Faculdade de Serviço Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Elaine Rossetti Behring, e do professor de Direito Financeiro da Universidade de São Paulo, José Maurício Conti.**

Com o olhar peculiar de suas áreas de atuação, os dois traçaram um cenário altamente desafiador, com a concentração de recursos na União, e a demanda por políticas públicas que exigem cooperação operacional e financeira de diversos entes para serem efetivas. Nesse contexto, afirmaram, os Tribunais de Contas podem exercer um papel de extrema relevância, inclusive no estímulo ao diálogo interinstitucional.

Elaine Rossetti Behring – Professora titular da Faculdade de Serviço Social da UERJ

Com pós-doutorado em Sociologia e Ciência Política pela Universidade de Paris VIII e coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisas do Orçamento Público e da Seguridade Social (UERJ/CNPq), a professora Elaine Rossetti Behring defendeu o argumento de que o tamanho da carga tributária brasileira, que tem se mantido estável nos últimos anos, não é um problema tão grande como defendem alguns setores da sociedade. Ela apresentou uma série de dados que apontam para a extrema centralização de recursos na União, enquanto os municípios, responsáveis pela prestação de importantes serviços à população, ficam com uma fatia bem menor das receitas.

Ela também argumentou que o modelo tributário brasileiro apresenta graves distorções, concentrando a taxação nos mais pobres, especialmente trabalhadores, enquanto pessoas jurídicas, assim como lucro e patrimônio, são subtaxados. Segundo ela, a principal despesa do país hoje é com juros, encargos e amortizações da dívida, que é principalmente interna. Além disso, as principais discussões relativas ao orçamento são sempre no sentido de limitar os gastos sociais, o que provoca um subfinanciamento crônico.

“Temos hoje uma estrutura que efetivamente perpetua a desigualdade via tributação. Existe um aspecto em que os tributos incidentes sobre bens e serviços respondem por 59% da arrecadação tributária brasileira. Por outro lado, na alocação de recursos, o país vive um ajuste fiscal permanente. Os principais gastos financeiros são para remunerar os credores da dívida, que pagam menos impostos”, disse. Ela citou ainda uma série de “gambiarras” orçamentárias que são feitas no país, que jamais levam em consideração os mecanismos criados para reduzir a concentração de receitas e, de quebra, são pouco transparentes, o que dificulta o controle social.

José Maurício Conti – Professor de Direito Financeiro da Universidade de São Paulo

Professor de Direito Financeiro da Faculdade de Direito da USP e juiz de Direito aposentado do Estado de São Paulo, José Maurício Conti falou em seguida, apresentando as características do modelo federativo brasileiro que, segundo ele, tornam o financiamento de políticas públicas tão desafiador e complexo. Ele destacou que no Brasil se observa um federalismo cooperativo, que prevê interação e conexão entre todos os entes. “O atingimento de metas depende de cooperação e coordenação que devem existir em todos os Poderes, que são autônomos e independentes. E coordenação e interação entre todos nunca são simples”, afirmou.

Conti ainda lembrou que, do ponto de vista conceitual, o princípio da subsidiariedade prevê que o ente mais próximo é quem deve atender às necessidades, só passando para o nível mais alto quando realmente necessário. Para o professor, alguns fatores contribuem para tornar o financiamento de políticas públicas ainda mais desafiador. Um deles seria a falta de cultura de planejamento. Outro, as dificuldades de relacionamento intragovernamental, em que nem sempre há a necessária harmonia e diálogo entre os entes.

Ao final de sua fala, Conti também mencionou a Reforma Tributária, que ele considera uma reforma fiscal, trazendo grandes incertezas aos entes federativos. “Como fica a transparência da alocação de recursos para fundos, quando está envolvida a partilha de tributos que vão deixar de existir? A distribuição de recursos que hoje são originários do ICMS, por exemplo, é uma grande incerteza. Diante do quadro de incertezas, como é possível calcular?”, questionou.

O IX ENTC
O IX Encontro Nacional dos Tribunais de Contas (ENTC), que acontece até 14 de novembro, em Foz do Iguaçu (PR), reúne 2 mil participantes, entre conselheiros, ministros, auditores e especialistas do setor público. A programação do evento prevê 80 atividades, 84 palestrantes e discussões relevantes sobre a inovação no controle público, transparência e o fortalecimento dos órgãos de controle.
O evento é promovido pela Associação dos Membros dos Tribunais de Contas (Atricon) em conjunto com o Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR), Instituto Rui Barbosa (IRB), Conselho Nacional de Presidentes dos Tribunais de Contas (CNPTC), Associação Brasileira dos Tribunais de Contas dos Municípios (Abracom) e Associação Nacional dos Ministros e Conselheiros Substitutos dos Tribunais de Contas (Audicon).

O IX ENTC tem patrocínio da Cemig, Codemge, Itaipu, ABDI, Sanepar, BID, CNI, CFC, Abralegal, Geap Saúde e Editora Fórum. O Encontro conta com o apoio institucional dos Tribunais de Contas de Mato Grosso, Santa Catarina, Rondônia, Goiás, Rio Grande do Sul, ASUR, Ampcon, ANTC e CNPGC.
A cobertura completa, incluindo fotos e apresentações dos painelistas, estará disponível no site da Atricon e no site do IX ENTC, além de ser compartilhada no Flickr.

Serviço:
IX Encontro Nacional dos Tribunais de Contas
Data: 11 a 14 de novembro
Local: Foz do Iguaçu (PR)
Programação: https://entc2024.com.br/programacao
Cobertura: https://entc2024.com.br, https://atricon.org.br e www.flickr.com/atricon.

Texto: Heloísa Lima