Primeira Infância é tema de discussão internacional no Panamá

A proteção infantil foi tema de abertura dos trabalhos acadêmicos do 21o Encontro Internacional de Juristas, que começou neste domingo (26), na Cidade do Panamá. Especialistas do Direito e da Medicina debatem, até a próxima quarta (29), os desafios globais na proteção de crianças e adolescentes. O presidente da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon), Edilson Silva, e o vice-presidente do Instituto Rui Barbosa (IRB), Sebastião Helvécio Ramos de Castro, representam o controle externo brasileiro no encontro.

Para o presidente da Atricon, a iniciativa enriquece a atribuição dos Tribunais de Contas brasileiros por meio da troca de experiências com outros formatos. ”É a oportunidade de trocarmos experiências, conhecimentos e reflexões sobre o que se pratica em termos de controle dos atos da Administração Pública e, em especial, das políticas públicas. Esse diálogo com a comunidade internacional, com a academia internacional, com os colegas enriquece muito as nossas ações e atividades enquanto um Tribunal que controla e auxilia a Administração na efetividade de políticas públicas”. 

Presidente de honra e diretor científico do evento internacional, o conselheiro Sebastião Helvécio coordenou os trabalhos do primeiro dia, que contou com palestras de conselheiros dos Tribunais de Contas do Brasil e da Espanha e membros do Poder Judiciário do Panamá sobre ações, cuidados e levantamentos de dados de violência contra crianças e adolescentes. A Primeira Infância é tema da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU).

Doutor em Saúde Coletiva, Helvécio destacou que os trabalhos buscam o fundamento jurídico da proteção da Primeira Infância e a interpretação dos juristas a esse tema tão valioso. Ele trouxe o pensamento do jurista uruguaio Eduardo Couture, falecido em 1956, no seu tratado ‘Os 10 Mandamentos do Advogado’.”No item 7, ele aborda a questão da paciência. Ele nos alerta que o tempo se vinga daquilo que é feito sem a sua participação. E não há dano maior quando se fala em tempo quando não se coloca na absoluta prioridade o tema da Primeira Infância”, observou.

Ainda para o conselheiro Helvécio, que também é médico pediatra, a primeira infância é no tempo mais nobre da vida humana. “É o instante da vida em que a complexidade do nosso cérebro atinge a estrutura física fundamental para o longo da vida. Na visão econômica, não existe investimento mais rentável em uma política que una justiça social e efetividade de performance do que o investimento na Primeira Infância”. 

O presidente de honra do Encontro ainda registrou que pesquisa do economista estadunidense James Heckman, prêmio Nobel, mostra que a cada dólar investido em desenvolvimento na Primeira Infância pode gerar um retorno de US$ 0,14 por ano de vida. A conselheira Cilene Salomão, do Tribunal de Contas de Roraima (TCERR), apresentou dados do estado, com bastante influência migratória, principalmente da Venezuela, e das comunidades indígenas.

Na palestra intitulada “Roraima: O Brasil Setentrional e suas Influências Multiculturais”, ela mostrou ações e estudos da Corte de Contas como articulador e produtor de informações para embasar políticas públicas efetivas no estado. “Quase a metade da área do nosso estado é de comunidades indígenas. Temos que ter uma força conjunta de todos os entes do Estado para atender com eficácia às nossas crianças e adolescentes no que eles mais precisam”, destacou.

Um acordo de cooperação com a Universidade de Roraima faz um diagnóstico inédito para implementar políticas da infância indígena com dados concretos sobre a realidade do estado. “É preciso ressaltar a concretização dos direitos fundamentais na atividade dos Tribunais de Contas. Temos 17,6 milhões de crianças brasileiras e, desse total, 9 milhões estão em situação de vulnerabilidade. A missão da proteção da primeira infância é uma missão constitucional dos TCs”, observou o conselheiro Sebastião Helvécio ao final da palestra da colega.

O próximo palestrante foi o presidente do Comitê Técnico da Primeira Infância do IRB e representante da Atricon para a área, conselheiro Edson José Ferrari. Ele apresentou dados do levantamento nacional intitulado “Infância Segura”. Realizado pelos dois órgãos, o trabalho angariou informações no país inteiro numa fiscalização nacional para mapear a rede de atendimento para crianças e adolescentes vítimas e testemunhas de violência.

O projeto Infância Segura é capitaneado pela Atricon, em parceria com os Tribunais de Contas do Piauí e de Rondônia, e coordenado pelo conselheiro Renato Rainha (TCDF). Os procedimentos de fiscalização se baseiam no exame da legislação pertinente, na análise das respostas obtidas por meio de questionário aplicado a dirigentes das unidades gestoras e entrevistas, documentos e informações requisitadas e em inspeções in loco.

Com a primeira etapa concluída em outubro de 2024, o levantamento, que tem 760 páginas, mostra que há normativos suficientes para o tema no Brasil. “O que faltam são ações e levamos um trabalho eficaz, cientificamente apurado, para trazer as principais deficiências, como a ausência de integração dos órgãos de garantia”, pontuou Ferrari. A próxima etapa do estudo, prevista para julho, consiste em uma auditoria operacional e a conclusão com um sistema unificado e seguro para informações sobre o tema feito pelo Sistema Tribunais de Contas. “Somente com o fortalecimento das estruturas, recursos adequados e capacitação contínua será possível cumprir os preceitos legais e garantir um ambiente seguro para nossas crianças”.

Também participou da discussão o juiz de Execução de Pensão Alimentícia da Província de Coclé, no Panamá, Roderick Chavem, que falou sobre a evolução do tema no país e a necessidade de promover o chamado “salto quântico”. “Os Tribunais de Contas hoje no Brasil têm métrica para esse levantamento de quanto custamos e quanto entregamos para a sociedade. Esse salto quântico é entregar mais do que custa para a sociedade”, observou o conselheiro Helvécio após a apresentação panamenha.

Finalizando a mesa sobre o tema, a presidente da Seção de Fiscalização do Tribunal de Contas da Espanha, conselheira Maria Dollores Genaro Moya destacou os desafios da proteção dos direitos das crianças na Espanha, com ações da Corte de Contas no sentido de auditar e avaliar políticas e recomendar medidas para maior eficácia e impacto sobre crianças e suas famílias.

Texto: Anna Karolina Bezerra