Orçamento público e responsabilidade fiscal

Edilberto Pontes: Orçamento público e responsabilidade fiscal
Vice-presidente do Tribunal de Contas do Estado do Ceará

“Nenhuma instituição é mais relevante, para o movimento regular do mecanismo administrativo e político de um povo, do que a lei orçamentária. Mas em nenhuma também há maior facilidade aos mais graves e perigosos abusos.”

Essa magistral afirmação de Rui Barbosa, proferida há mais de 130 anos, ilumina a discussão sobre o orçamento federal para 2021. É que despesas obrigatórias, principalmente previdenciárias, foram canceladas pelo Congresso Nacional para abrir espaço para emendas parlamentares, que saltaram de R$ 22 bilhões para R$ 48,8 bilhões.

É indiscutível a legitimidade dos representantes do povo para modificar a proposta orçamentária. A palavra final sobre o orçamento, nas democracias, é do Poder Legislativo.

A própria origem do orçamento público foi o controle aos gastos do rei pelo parlamento. Mas essa participação deve respeitar limites que a própria Constituição impôs: para emendar o orçamento é necessário anular outra despesa, que não pode ser de pessoal, serviço da dívida e transferências constitucionais para os Estados, Distrito Federal e Municípios.

Tal providência, ao lado de outras, visou a garantir um nível de despesas compatível com o planejamento e com as receitas. A Constituição Federal vedou, portanto, que despesas que não têm como deixar de ser, na prática, pagas fossem anuladas pelo legislativo para dar lugar a outras despesas.

Daí decorre que a atuação do parlamento deve situar-se basicamente sobre as despesas discricionárias. Se o Executivo planeja fazer determinada obra, o parlamento pode entender que não é prioritária, cortar as dotações previstas e colocar os recursos em outra área. Dessa forma, assegura a palavra final e mantém o equilíbrio orçamentário.

É claro que o papel aceita tudo, mas a realidade da execução orçamentária vai se impor, evidenciando que as despesas são maiores que as receitas efetivamente arrecadadas.

Um grande problema, portanto, principalmente no contexto da pandemia, que deprime as receitas públicas e amplia as despesas, notadamente com saúde e assistência aos mais carentes. E ainda há vigente o teto de gastos (EC 95/2016), mostrando que fazer leis e regras é bem menos difícil do que as cumprir.