Puseram uma usina no mar

Uma matéria neste jornal, no último 26 de fevereiro, noticia o protesto de pescadores, comerciantes e de prestadores de serviço de hotelaria contra a instalação de uma fazenda marítima, com uma área total de mais de 7 mil hectares, com 50 aerogeradores e muitos cabos elétricos submarinos, no litoral do município de Amontada. Eles alegam que a construção no mar irá causar impactos na fauna e na flora local, além de afetar o turismo e a pesca artesanal, por “riscos de colisões, privação do acesso a pontos de pesca, bem como alterações nas rotas utilizadas para a prática.”

Chico Buarque no fim da década de 1970, em Bye Bye Brasil, já chamava atenção para empreendimentos que prejudicavam a pesca (“talvez fique ruim para pescar”), mas hoje o tema ocupa o centro dos debates mundiais. A famosa Agenda 2030, da ONU, encampada pelo Brasil, trata dos objetivos de desenvolvimento sustentável.

Desenvolver, criar empregos, gerar renda é, por óbvio, importantíssimo. Mas esse objetivo deve ser compatibilizado com a preservação ambiental, para que as atuais e as futuras gerações possam usufruir das belezas naturais e de um ambiente saudável e equilibrado.

Os moradores argumentam ainda que não foram ouvidos. Dialogar com os diretamente afetados por um empreendimento, público ou privado, é essencial, mais ainda em atividades de elevado impacto. Nessa interação, podem-se encontrar fórmulas que minimizem os eventuais efeitos negativos e chegar a compensações para possíveis danos.

A fórmula arrogante de empreendimentos que se instalam sem prestar contas à população, sem evidenciar os custos e benefícios sociais, é uma prática que precisa ser repelida, pois incompatível com os cânones contemporâneos, que exigem interação, transparência e engajamento.

Icaraí de Amontada e Moitas são joias preciosíssimas do litoral cearense. Devemos tratá-las com máximo cuidado. Embora parques eólicos sejam, em geral, encarados como positivos, porque geram a chamada energia limpa, é fundamental que os desdobramentos mais amplos de empreendimentos dessa natureza sejam amplamente debatidos, de forma a se encontrarem fórmulas para minimizar os custos sociais. A sustentabilidade do desenvolvimento é uma questão de primeira ordem e não pode ser ignorada neste caso.

Edilberto Pontes
Presidente do Instituto Rui Barbosa
Vice-Presidente do TCE Ceará